Blog do Professor Márcio

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quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

Bem-vindo 2011

Hoje o dia amanheceu trazendo uma chuva pesada, que se estendeu pra lá da hora do almoço. Pouca gente nas ruas, a água escoando sobre as calçadas. Ainda assim, havia fila nas casas lotéricas, a Mega-Sena da Virada prometendo 200 milhõess aos sortudos. Existe algo mais poderoso do que a esperança? Dizem que é a última que morre. Mesmo diante da improbabilidade de acertar míseros seis números, lá está ela, nos seduzindo com a força capaz de nos levantar da cama numa manhã tempestuosa, só porque há uma remotíssima chance da gente começar o Ano Novo com uma conta bancária astronômica.

Se é que não vou mesmo ganhar a loteria, ficarei com esta linda, reflexiva e sonharoramente realista mensagem de Ano Novo do mineiro poeta Carlos Drummond de Andrade:

"Quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias, a que se deu o nome de ano, foi um indivíduo genial. Industrializou a esperança fazendo-a funcionar no limite da exaustão. Doze meses dão para qualquer ser humano se cansar e entregar os pontos. Aí entra o milagre da renovação e tudo começa outra vez com outro número e outra vontade de acreditar que daqui para adiante vai ser diferente".

Portanto, mesmo que não acredite, não deixe que a esperança morra, porque um Ano Bom pode estar lhe esperando. É o que lhe desejo: FELIZ 2011!

sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Mensagem de Final de Ano


Recebi um belo texto, enviado pelo meu amigo José Emiliano Lopes, inspirado em publicação de uma comunidade na internet. Publico-o como mensagem para os visitantes do meu blog, desejando que todos nos esforcemos para sempre praticar o ensinamento ali contido.

"Sidarta Gautama, o Buda, teve um discípulo de nome Hantaka que se tornou famoso pela prática do budismo, mas não por sua pregação. Eis sua história:

Hantaka tinha dificuldade de aprender os ensinamentos budistas. Apesar de Buda ter designado, por três anos, orientadores para treiná-lo, Hantaka quase nada aprendeu dos conceitos ensinados. Então, Buda resolveu ele mesmo orientá-lo e o chamou para uma conversa entre mestre e discípulo. Nessa ocasião, Buda lhe disse:

-Olha, Hantaka, você não prescisa aprender muitas coisas.

Os olhos de Hantaka brilharam com muito interesse, e o mestre continuou:

- Eu quero que você aprenda somente uma coisa: jamais usar palavras negativas.

Hantaka se esforçou na aplicação desse ensinamento por toda a vida e um dia tornou-se um grande mestre."

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O arco-íris pousou sobre a minha casa

Sol com chuva, casamento da viúva! Era assim que nos tempos de criança a gente corria alegre pelas ruas, esperando que o casamento acabasse num lindo arco-íris. Uma pintura de cor no céu era como um sorriso no rosto, capaz de espalhar a felicidade, pois tudo é possível imaginar quando se tem a alma sonhadora:
arco-da-aliança,
arco-da-chuva,
arco-da-velha,
arco-da-viúva...
o céu festejando a vida.

Vermelho, lá vai violeta! Foi assim que a professorinha nos ensinou guardar a sequência das cores: vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, índigo e violeta. A cartilha escolar queria nos convencer que arco-íris era apenas um fenômeno óptico e metereológico, uma difração do espectro da luz solar, nada mais que uma ilusão.

O que contava, porém, eram as histórias do pote de ouro, um pote encantado, enterrado bem ao pé do arco-íris, que fugia do lugar quando a gente ia buscá-lo. Os mais velhos nos garantiam que quem se atrevesse a cortar o arco, separar as listras ou passar por baixo dele, se mulher, ia virar homem; se homem, ia virar mulher... e isto ninguém queria. Então, a gente ficava entre o sonho do pote de ouro e o medo de se arriscar.


Mas hoje o dia seguiu quente e cansado do sol de verão, com um fim de tarde ameaçando chover lá pras bandas do leste. Como mineiro lhe garanto que “num tô me queixano sô, purque sem só-quente o fejão num bageia e o milhará num amareleia”. Mas não é que o arco-íris só tem quando chuvisca? Foi aí que eu me vi criança, pois o 'casamento da viúva' foi festejado com um lindo arco-íris, uma ponta pousada sobre o telhado da minha casa. Se você duvida, veja a foto. Eu não tive dúvida: exatamente ali ele escondeu um resplandecente pote de ouro puro... ou será um pote de melado... ou um pote de farinha... ou um pote d’água bem friinha?...

Marcadores: arco-iris; crônica; folclore.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Manifesto dos ambientalistas ao Governador de Minas

Amig@s,

Um grupo de ambientalistas mineiros enviou um manifesto dirigido ao Governador de Minas Gerais, Antonio Anastasia, indicando princípios previamente debatidos e compartilhados por pessoas com diferentes visões sobre a questão ambiental em Minas Gerais.

Um dos líderes desse movimento, Gustavo Gazzinelli, membro do "Movimento pelas Serras e Águas de Minas", distribuiu uma mensagem afirmando que o manifesto “expressa um bom começo para sairmos dessa lama que se tornou o licenciamento ambiental em Minas Gerais - totalmente subsidiário dos setores econômicos que estão fazendo a política de terra arrasada.”

Se você se preocupa com o avanço da degradação ambiental em nosso País, onde se destaca a atividade agressiva e nefasta das mineradoras, clique AQUI para ler. Mais: aproveite também para assinar o Manifesto por uma nova política ambiental em Minas Gerais.

Estamos empenhados em uma campanha aberta de adesões ao manifesto. Portanto, se você concordar com o conteúdo, assine-o e replique-o para a sua rede de contatos. Neste momento de mudanças na gestão político-administrativa do Estado é muito importante fazer soar a nossa voz em defesa do patrimônio natural de Minas Gerais.

Marcadores:ambientalismo; manifesto; minas gerais.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

A Prosperidade do Vício

"Dos tempos mais antigos à derrocada do sistema hipotecário americano, a humanidade percorre um caminho de altos e baixos na qualidade de valores que orientam a vida econômica."
Olga de Mello

Publicada em 1801, a novela "Juliette ou as Prosperidades do Vício", de Donatien Alphonse François, o Marquês de Sade, conta a história de uma jovem que despreza os valores morais vigentes e passa a viver para satisfazer seus próprios desejos, sem qualquer consideração pelos que a cercam. Por "Juliette" e outro livro, "Justine e os Infortúnios da Virtude", Sade foi encarcerado durante seus últimos 13 anos de vida em um hospício. A personagem Juliette, no entanto, não sofreu as mesmas sanções que o autor, pois, filha de um banqueiro, obteve a complacência da Justiça. A metáfora para a ganância de uma sociedade que adapta seus padrões éticos de acordo com os ganhos financeiros está em "A Prosperidade do Vício - Uma Viagem (Inquieta) pela Economia", do economista francês Daniel Cohen.

"O título de Sade, para os economistas, remete a Malthus, para quem a prosperidade é alcançada através do controle populacional. Guerras, epidemias e outros males seriam, então, benéficos para a sociedade", diz Cohen, que traça a história da economia ocidental, enquanto reflete sobre a relação do dinheiro com a satisfação.

"Depois que se ultrapassa um certo patamar, a riqueza não altera os níveis de frustração. A pressão social faz as pessoas sempre desejarem ter mais dinheiro que os vizinhos", afirmou Cohen, em entrevista ao Valor Econômico.

O dinheiro que compra a conivência com a transgressão também modificou conceitos morais, mas nem sempre visando apenas o bem-estar de pequenos grupos, observa Cohen.

"No século XVIII, na Europa, houve uma modificação do status moral da ganância, que passou a não ser mais considerada um mal, um vício, já que traria prosperidade e paz", diz o economista. Entretanto, a história mostra que paz e prosperidade nem sempre caminham juntas, lembra Cohen - tanto que justamente durante uma época de "prosperidade partilhada" eclodiu a Primeira Guerra Mundial. Se a Europa hoje se apresenta como o continente da paz e da prosperidade, diz Cohen, "é ao preço de uma formidável amnésia de seu passado recente". Para o economista, o maior risco no século XXI é a repetição, em nível planetário, da história do Ocidente, que, em quatro séculos de proeminência europeia sobre outros povos, terminou na barbárie da Segunda Guerra Mundial.

Vice-presidente da École d'Économie de Paris e professor da École Normale Supérieure, Cohen alterna observações históricas e esclarecimentos de economia em linguagem acessível a leigos. Um exemplo está nas páginas em que ilustra o perigo do consumismo desenfreado, que considera uma droga com milhões de dependentes e poder suficiente para "destruir nossa civilização".

Cohen sugere aos leitores que imaginem as consequências para a Terra se os chineses que utilizam bicicletas decidissem trocá-las por automóveis:

"O planeta não consegue absorver tantos consumidores sem uma radical reorientação das normas em que se baseiam nossos padrões de crescimento. Hoje, na nova era do vício, para obter relevância social é preciso crescer financeiramente, ou seja, enriquecer ou perecer".

O economista responsabiliza a avidez por consumo das famílias americanas por seu "formidável endividamento" e pela derrocada do sistema hipotecário, que resultou na crise financeira global.

O pessimismo de Cohen quanto ao futuro de um planeta exaurido pela ocupação predatória dos povos é compensado por sua confiança nos propósitos conservacionistas das novas gerações, ainda que faça ressalvas a formas de uso da internet, onde "florescem tanto os laços entre amantes de música quanto redes de pedófilos". Cohen ressalta que nada tem contra a rede, cuja criação considera tão importante quanto a invenção da máquina a vapor e da eletricidade, há 200 anos.

Para Cohen,
"Os novos recursos sociais que a internet proporciona são, no mínimo, ambíguos. Os jovens estão ansiosos para usufruir de seus 15 minutos de fama, enquanto prostituição e dinheiro se apresentam como valores em qualquer canto da rede. É o mesmo velho mundo, com uma nova roupagem. O que anima é que esses mesmos jovens acreditam na necessidade da proteção ambiental. Isso faz parte da cultura deles, exatamente como acontece com a internet."

Embora se mostre descrente, Cohen tem esperanças de que haja cooperação entre os povos para reduzir as agressões ao ambiente. "Em tempos de crise, alinhar-se é uma regra difícil, pois significa fazer concessões para o bem público. A cooperação é a principal questão problemática no mundo atual. (...)

Texto extraído de: A riqueza material espelhada na perda dos sentimentos morais, de Olga de Mello para Valor On Line, 7/12/2010.

DANIEL COHEN. A Prosperidade do Vício - Uma Viagem (Inquieta) pela Economia. Tradução de Wandyr Hagge. Zahar. 200 págs., R$ 34,00

Marcadores: meio ambiente; desenvolvimento; sustentabilidae;riqueza.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Problemas ambientais de Paracatu foram tema de Encontro Científico

Olá! Clique AQUI e leia o trabalho que apresentei no V Encontro da ANPPAS - Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade, que ocorreu em Florianópolis, em outubro de 2010.

Para conhecer a ANPPAS e sua importância científica clique AQUI.

Para ter uma idéia geral do conflito ambiental Paracatu x Mineradora Kinross, não deixe de ler o Manifesto de Paracatu, publicado neste blog, e no blog Alerta Paracatu.

Marcadores: meio ambiente; conflito ambiental; arsenio; ouro; paracatu; rejeito; cianureto

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Aos Queridos Professores

O dia dos professores passou, neste ano eleitoral a imprensa ficou absorvida em questões menores da disputa e quase não se falou neste profissional que mantém acesa a luz que afasta as trevas.

Mas hoje recebi uma mensagem do meu querido professor-orientador de mestrado, Dr. Cláudio Paixão Anastácio de Paula, que me repassou "Um cartão que servisse para todos os professores, alunos, ex- professores e ex-alunos."

É tão bonito que imediatamente quis compartilhá-lo com os visitantes do meu blog. Trata-se de uma palestra do Prof. Neurocientista Miguel Nicolelis, em aula inaugural do segundo semestre de 2009 na Universidade de Brasília (UnB). Em sua surpreendente Aula da Inquietação é ovacionado por um público emocionado, quando fala do sonho de um Brasil melhor, para os professores e todos os brasileiros.

SONHANDO COM O IMPOSSÍVEL
Trecho da Palestra do Professor Miguel Nicolelis

"Vocês, principalmente os que estudam em universidades públicas, representam os sonhos de realização de milhões de pessoas que jamais poderão vir para cá. São brasileiros que diariamente levantam da cama para trabalhar em empregos que muitos de nós jamais teríamos a coragem de enfrentar no nosso dia-a-dia, para que vocês possam estar aqui.

O sonho que não se converte em realidade inibe o indivíduo que perde a autoconfiança e o pior, causa a inibição coletiva do entorno que vê um sonhador derrotado. Quando um sonhador delirante é derrotado, a mediocridade triunfa e isso é terrível.

Vocês não foram postos aqui pelo resto do Brasil para fazer algo medíocre. Vocês foram postos aqui, receberam esse privilégio de toda a sociedade brasileira, para construir uma nação, e uma nação só se constrói se sonhando com o impossível, sem se esquecer do próximo.

Eu sou de uma geração que tentou fazer o que vocês têm a chance de fazer e fracassou. Nós não conseguimos construir o Brasil que nós queríamos, mas temos agora a oportunidade de testemunhar a tentativa de vôo de vocês.

Na história inteira deste país, vocês são a primeira geração que tem verdadeiramente a chance de transformar este País num exemplo para a humanidade toda.

Não existe uma expressão que eu abomine mais quando eu venho para o Brasil, quando alguém vira para mim e fala:
- Nossa, as coisas que fazem lá, no seu laboratório, é coisa de Primeiro Mundo.
Eu paro pra pensar e digo:
- Mas que Primeiro Mundo é esse? De onde vem isso?
Ou então quando ocorre alguma coisa negativa na nossa vida cotidiana e alguém fala:
- Isso só acontece no Brasil.

Eu tenho uma boa e uma má notícia para aqueles que usam essa expressão e gostam do Primeiro Mundo: O Primeiro Mundo faliu, em todos os sentidos; faliu financeiramente, faliu moralmente, faliu eticamente...

E agora vem a boa notícia: O Primeiro Mundo agora é aqui.

E foi por isso que nós fomos para Natal seis anos atrás, para tentar realizar um outro sonho impossível, criar um instituto de ponta de neurociência comprometido com a transformação da realidade social daquela região, Hoje ela tem a maior escola de educação cientifica infanto-juvenil do Brasil, para 1000 crianças da rede pública de Natal, que são hoje os primeiros brasileiros a terem uma educação púublica em tempo integral.

Elas eram esquecidas, elas faziam parte do pior distrito escolar do País, de acordo com as estatísticas do MEC. As quatro piores escolas do país estavam nessa região, e foi ali que nós selecionamos 1000 crianças da escola pública e trouxemos elas para aprender ciência de ponta. Essas crianças, de 10 a 16 anos, se transformaram em protagonistas do próprio ensino, elas não têm aula teórica, elas freqüentam os melhores laboratórios de ciência e tecnologia que existem no Brasil para crianças, construídos para crianças, e elas hoje dão banho em qualquer criança de qualquer escola privada do Estado de São Paulo, e elas se orgulham de serem descendentes dos índios potiguares, os únicos índios tupi-guarani que resistiram à colonização portuguesa.

E sabe onde vocês vão encontrar cada um desses 1000 alunos, que vão virar 5000, e que graças a um decreto que vai ser assinado pelo Ministro da Educação e pelo Presidente da República, vão se transformar em um milhão de crianças pelo Brasil afora, daqui a alguns anos? Aqui na UnB, na USP, na Unicamp, elas vão se transformar em agentes de transformação social, de baixo para cima, não de cima para baixo.

E quando elas chegarem lá, podem acreditar, o prédio ao lado (Senado) vai ser ocupado por outro tipo de gente."


ASSISTA A PALESTRA DO PROFESSOR NICOLELIS.
SE O SEU TEMPO FOR CURTO, VÁ DIRETO AO VIDEO 2.














Marcadores: nicolelis; aula; professor; aula da inquietação.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

Na terra dos factóides

A língua portuguesa é considerada uma das mais ricas do planeta. Ainda mais, nesses tempos de Internet, os brasileiros acabam incorporando palavras do “informatiquês”, como ‘imeio’, ‘mause’, ‘deletar’ etc. Todas elas têm sentido, não há uma criança que não saiba seus significados.

Porém, nesta campanha eleitoral ora finda, surgiu um vocábulo que, embora apareça nos dicionários mais atualizados, está deixando confuso o brasileiro comum. Em todas as mídias, em todos os debates, acusações recíprocas e tentativas de explicação, o que mais se ouve e vê falar é o tal de FACTÓIDE. Preste atenção nas entrevistas; quando alguém quer explicação de algo que está incomodando, lá vem a resposta do entrevistado: – Isto é um factóide!

O que é essa palavra que tem poder de resposta a tantas indagações? Zé Povão já está supondo tratar-se de um alienígena. Os cidadãos comuns, entre os quais me incluo, merecem saber, pois ficamos confusos justamente na hora em que precisamos fazer nossas escolhas.

Pus mãos à obra e fui pedir explicações. A cada um fiz a mesma pergunta: - O que é factóide?

Veja as respostas, caro leitor, e ajude-me entendê-las.

Ex-Candidato Roriz: - O dinheiro é da bezerra.
Candidata Dilma: - A Erenice é uma pessoa honesta, até que me provem o contrário!
Erenice: - Sinto-me atacada em minha honra pessoal e ultrajada pelas mentiras publicadas.
Candidato Serra: - Não conheço o Paulo Preto!
Paulo Preto: - Não se abandona um amigo ferido!
Mulher do Serra: - ...
Uma mineradora de Paracatu: - Arsênio? Onde? Vocês estão vendo?
Um “ambientalista” da mineradora: - Não estou vendo nada!
Rede Globo: - Não foi só uma bolinha de papel, olha lá a tirinha!
Paulo Maluf: - Sou o candidato mais ficha limpa do Brasil.

Entendeu? Não? Eu também não entendi. Você faz uma pergunta e a resposta vem sem pé nem cabeça.

Mas resolvi não ficar por aqui. Conheço muita gente em Paracatu e estou temeroso que alguém me pare na rua e pergunte sobre um factóide que está contaminando os ares da cidade.

Por isso, fui atrás de Tia Nega, não sei se você conhece. Primeiro, vou lhe garantir que é gente de confiança, não se comprometeu por dinheiro, vive sua pobreza na dignidade, mas tem o poder de desvendar mistérios. Ao ouvir minha pergunta sobre os factóides, Tia Nega teve um momento de concentração, um leve estremecimento, arregalou seus olhos de vidente e me respondeu com uma voz que parecia vir de outro mundo: - É coisa ruim, meu filho, coisa ruim!

Você vai me dizer que a resposta de Tia Nega foi confusa, mas lhe garanto que me esclareceu tudo. Agora entendo porque esse pessoal fica engasgado, desconversa, negaceia, olha com ódio para o interlocutor e dispara: - É um factóide!

Também pudera: é coisa ruim, meu filho, é coisa ruim.

Marcadores: factoide; cronica; política; paracatu; eleição.

domingo, 10 de outubro de 2010

Lições de um desastre

Desde 2 de outubro, estamos acompanhando o desenrolar do desastre sócio-ambiental que atingiu uma região da Hungria, quando a barragem de rejeitos de uma fábrica de alumínio rompeu-se, despejando lama tóxica na cidade de Kolontár e outras localidades. Até o momento em que escrevo este texto, oito pessoas morreram, cerca de 150 ficaram feridas, a maioria com queimaduras e danos nos olhos, e seis encontram-se desaparecidas, tragadas pela 'lama vermelha'. Afora isto, o vazamento de mais de um milhão de metros cúbicos, carregou carros nas ruas e danificou pontes e casas, forçando a remoção da população.

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A 'lama vermelha' é um resíduo tóxico da produção do alumínio, muito corrosivo e que contém chumbo. Para a produção de 1 tonelada de alumínio são produzidas quase 3 toneladas de resíduo. A queimadura química causada pela 'lama vermelha' pode demorar dias para ficar aparente e, o que pode parecer uma ferida superficial, pode causar danos a tecidos mais profundos mais tarde.


O problema dessa lama não é só o chumbo. Ela é altamente alcalina, levemente radioativa e contém arsênio, silício e metais pesados. Onde a lama seca, forma-se uma poeira que contamina o ar e, levada pelo vento, seu alcance é incalculável. Segundo um relatório da Academia de Ciência Húngara, a inalação do ar contaminado pode causar doenças pulmonares. Por precaução, no local do desastre as pessoas estão usando máscaras de proteção.

A onda tóxica atingiu as águas dos rios e provocou a morte de todos os organismos presentes no rio Marçal. Embora os esforços para deter a lama, seus efeitos chegaram até o rio Danúbio, o segundo maior da Europa.


Ainda não se sabe o que causou o vazamento, mas meteorologistas disseram que as chuvas de verão na Europa foram acima do normal, o que poderia ter enfraquecido o reservatório. O primeiro-ministro declarou que os responsáveis vão pagar caro pela catástrofe. Entretanto, a empresa (MAL) negou qualquer responsabilidade no acidente e divulgou comunicado afirmando que não houve sinal indicando o desastre iminente e que a barragem cumpria os padrões de segurança. Para auxiliar nos trabalhos de limpeza ela deu uma ajuda de 110 mil euros (cerca de 257 mil reais). Não obstante, seu presidente foi preso.



Agora, refletindo sobre o desastre ambiental na Hungria e pensando na situação de Paracatu em convívio com a mineradora Kinross, vamos assinalar o seguinte:

1) a barragem de rejeitos da Kinross é muitas vezes maior; outra já está em construção e será a maior do mundo;
2) para obter 1 tonelada de ouro são produzidas 2,5 milhões de toneladas de rejeito tóxico;
3) o rejeito tóxico da Kinross é infinitamente mais perigoso pela carga de arsênio, cianeto, enxofre e metais pesados;
4) as barragens da Kinross estão posicionadas nas cabeceiras de afluentes do Rio Paracatu, tributário do Rio São Francisco, potencializando o risco de contaminação em casos de vazamentos;
5) quando ocorre um vazamento é porque ninguém o previu, e ele pode ser provocado por condições metereológicas ou erro humano no projeto, na construção ou no gerenciamento da barragem;
6) quando ocorre um vazamento, quase sempre as empresas se eximem de responsabilidade;
7) cumprir os padrões de segurança não é suficiente, quando se põe em risco vidas humanas;
8) quando ocorre um vazamento, paga-se com vidas humanas, mas também com a vida de toda a cadeia biológica;
9) os danos ambientais são para sempre, principalmente porque a água superficial e subterrânea jamais se livrará dos resíduos tóxicos;
10) os prejuízos, os custos da limpeza e da reparação dos danos ficam por conta do Estado e da sociedade.

Pense nisso! Tem “ambientalista” comprometido com a mineradora dizendo que não há risco, que somos mal informados ou mal intencionados quando alertamos a população sobre o arsênio, o cianeto, a drenagem ácida, a destruição dos mananciais de água, os riscos das barragens, a poeira tóxica...

Adoro uma frase que o pessoal antigo de Paracatu conhece, que acho maravilhosa quando pronunciada na entonação típica dos nativos desta cidade, realçando as paroxítonas:
- QUEM NÃO OUVE CUIDAAADO, OUVE COITAAAADO...

REFERÊNCIAS:
1. http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/internacional/2010/10/05/vazamento-toxico-mata-tres-na-hungria-e-governo-decreta-estado-de-alerta.jhtm. Acesso: 5/10/2010.
2. http://www1.folha.uol.com.br/mundo/810095-sobe-para-4-mortos-por-lama-vermelha-na-hungria-premie-suspeita-de-falha-humana.shtml . Acesso: 6/10/2010.
3. http://www1.folha.uol.com.br/mundo/812355-hungria-reconhece-situacao-muito-grave-em-represa-de-lama-vermelha.shtml. Acesso: 9/10/2010.
4. http://noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,oi4725601-ei8142,00.html. Acesso: 9/10/2010.
5. http://noticias.terra.com.br/mundo/noticias/0,,OI4725694-EI8142,00-Apos+vazamento+Hungria+teme+segunda+onda+de+lama+toxica.html. Acesso: 9/10/2010.
6. http://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/presidente+de+empresa+que+causou+vazamento+e+detido+na+hungria/n1237796550109.html#0 Acesso: 12/10/2010.
Nota: em 14/10/2010 o número de mortos totalizou 9.

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quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Dorinha Alvarenga: a luta continua

Dorinha Alvarenga é engenheira, arquiteta e urbanista, mas é reconhecida como uma ativista ambiental que, como nós, encara a luta da vida para se afirmar contra os podres poderes. No caso dela, a luta da comunidade de Conceição do Mato Dentro contra uma poderosa mineradora – a MMX Minas-Rio, do magnata Eike Batista em composição com a britânica Anglo American, terceira maior mineradora do mundo. Naquelas bandas, o quadro não é diferente do que vemos em Paracatu: destruição do patrimônio histórico e natural, contaminação ambiental e liquidação do bem mais importante para a existência: a água.


Após a exaustiva campanha desenvolvida nas comunidades de base neste período eleitoral, Dorinha apresenta aqui a reflexão de uma “marineira” com mais de 25 anos de ativismo ambiental diante das indefinições do 2.o turno das eleições para Presidente da República. Vamos acompanhá-la!


Depois de totalmente absorvida em um período de campanha, debutante no PV e candidata a deputada estadual, pude viver e sentir na pele muitas questões importantes.

Antes de participar do pleito fui uma das participantes mais efetivas do MMS MINAS. Participei de várias reuniões e trabalhos feitos pela sociedade civil e o MMS MINAS foi um dos cabeças do que ocorreu em muitos lugares do Brasil.

No entanto o PV, ou melhor o JFA - José Fernando Aparecido, praticamente levou o MMS MINAS para dentro do Comitê dele, o que de certa forma desestruturou uma rede independente na prática. No entanto, a internet permitiu consolidar um grupo suprapartidário e mesmo apartidário, que foi a base da eleição da Marina, tanto em Minas como no Brasil todo.

O fato de a Marina ter ganhado em BH, era sentido por nós militantes verdadeiros da causa ambiental, seja nas vilas e favelas, nas ruas, me surpreendia ver que no reduto do PT, grande parte de líderes comunitários foi Marina. Segundo eles, Marina era pobre como eles e a Dilma era uma patricinha do Lula que nunca tinha vivido a pobreza na carne.

Esse movimento da sociedade civil livre, coeso e sem os moldes antigos da compra de voto, traz uma nova forma de fazer política e que ao meu ver é o melhor fruto das eleições de 2010. A Marina pelo pouco tempo, não pode conhecer de perto as realidade locais e muitas vezes não teve o devido apoio de seus aliados, ou, os mesmos não representavam o seu perfil.

Em Minas foi um verdadeiro circo. Os deputados eleitos do PV, sejam estaduais ou federais são da base de Aécio e Anastasia. Trabalharam por Marina de leve, porque com o aval do chefe, que queria mostrar sua força e de Minas ao Serra deixou correr solto...
No entanto, no segundo turno, pode ser que Aécio e Anastásia participem da campanha de Serra de forma efetiva e isso com certeza mostrará a força de Minas para o PSDB nacional e de São Paulo.

O PV era um partido de aluguel, a vinda da Marina acena para uma nova possibilidade, se houver de fato revisão do estatuto e a definição de um processo democrática interno, o partido poderá inaugurar uma nova fase.

Como membro recente fiquei horrorizada , com a prática interna do partido, sem apoio nenhum aos candidatos que não compunham a base Aecista, mas acredito que tal prática está no PT, onde o Lulismo toma conta do partido, e no PSDB, onde o Serrismo não é diferente. Serra parece uma mula empacada e teimosa.

A campanha em meio a mídia falsa de Dilma de plástico e Serra de cera, trouxe a diferença da Marina de verdade. Só ao final, a força da Marina veio a público, ela também quase se deixou levar pela produção do discurso da mídia.

Se de fato o PV tivesse feito por Marina o que fez o MMS, ela estaria no segundo turno.

É um momento de avaliação de tudo e todos, mas me parece que a sociedade civil é quem ganhou essas eleições!!!

É uma grande pena ter que escolher entre Dilma e Serra, pois com certeza nenhum deles chega perto da Marina!!! Enfim é aguardar e esperar o posicionamento de Marina e de seu eleitorado. Penso que ela se encontra entre a cruz e a caldeirinha e todos nós juntos!!!

Amei participar desse pleito e com certeza aprendi muito durante a campanha. A minha gratidão é enorme pelas pessoas que de forma voluntária participaram conosco.


Nota do blog: Para conhecer um pouco da atividade ambiental de Dorinha Alvarenga, siga o endereço: http://www.google.com.br/url?sa=t&source=web&cd=5&ved=0CCkQtwIwBA&url=http%3A%2F%2Fwww.youtube.com%2Fwatch%3Fv%3DAmTfXMqgrYE&ei=9t2sTLrvDMH7lwf40YyWAw&usg=AFQjCNHcHSBWwoa9VRNDPAvs0ZrMz9HbRw&sig2=vuFmHQg_Y-YFei-9RprcEQ

Eleições 2010

Recebi um texto do APOLO HERINGER LISBOA (*), em que ele faz uma abordagem do 2.o Turno da eleição presidencial brasileira. É o melhor texto que li sobre o assunto. Assim, solicitei-lhe autorização para reproduzir o texto no meu blog, ao que ele me respondeu: "OK, Márcio, mas diga que é ainda um rascunho, esforço de reflexão compartilhada." Pura modésitia, aqui vai o texto.


A oportunidade deste segundo turno é importante para a democracia. A eleição de Dilma anunciada por antecipação no primeiro turno teria passado a idéia de que fora nomeada e não eleita pelo povo. Tanto que sua primeira declaração ao final da apuração foi que iria conversar com a sociedade e discutir os seus projetos com o país. No primeiro turno, apenas a Marina foi capaz disso. Os dois candidatos mais cotados passaram o tempo em articulações de cúpula, com os supostos donos dos votos. Uma corrente independente se formou e surpreendeu as duas candidaturas apresentadas por marqueteiros de televisão. Agora teremos Dilma Rousseff e José Serra se confrontando em torno de questões substantivas, um ressuscitado, uma mais humilde, um resultado incerto, num clima mais verdadeiro.

A Marina se destacou por sua argumentação estratégica superior aos dois principais oponentes. Falava sempre dos últimos 16 anos em que PSDB e PT fizeram oposição pela oposição. Mostrou como foi importante o Plano Real e a Lei de Responsabilidade Fiscal. E o sucesso das políticas sociais de Lula onde o estímulo ao consumo popular criou uma nova classe média, a partir da estabilidade macroeconômica iniciada com Fernando Henrique. No entanto colocou que esta época é passado e propunha coisas novas. Criticou a idéia dos bons gerentes para governar o país e defendeu a necessidade de bons estrategistas. Quebrou a lógica plebiscitária que Lula tentou impor ao processo eleitoral para esvaziar as discussões políticas e tornar o pleito um plebiscito entre o sim e o não. Criticou essa história de mãe e pai do povo, como estratégia de infantilizar a população.

Mas, ficou a dúvida das concessões que fez no Ministério, notadamente nos casos da Transposição do São Francisco, divisão do Ibama, licenciamento de algumas hidrelétricas tecnicamente contra-indicadas, trangênicos. Pisou na bola ao dar razão às críticas da mídia comercial, que plantou a celeuma hipócrita de ameaças à liberdade de imprensa e à livre expressão, um argumento golpista de uma mídia facciosa. Equivocou-se ao denunciar a política externa brasileira fazendo frente ao monopólio dos EUA. Neste caso fez a defesa dos direitos humanos e da ordem do ponto de vista dos aliados bélicos dos EUA e em detrimento dos direitos iguais de todos os países. Mas a principal deficiência da Marina foi não ter correlacionado sua campanha com a estruturação de uma rede política estratégica independente do PV e do domínio personalista, que assumisse sua campanha. Não atendeu a demandas de apoio à organização de lideranças e movimentos sociais e ambientais fora da órbita partidária e que simpatizavam com uma nova opção política. A sua campanha foi pela televisão, pois ao nível local foi uma desorganização total. Com tudo isto, que pode ser corrigo, parabéns.

Dilma Rousseff e José Serra agora estão procurando apoio dos movimentos ambientalistas e sócio-ambientais, de uma diversidade de fazer inveja à Natureza. Mas devem entender que Marina não é dona desses votos, como ela mesma disse, apesar de sua liderança, e que deverão trabalhar com as realidades ambientais e políticas regionais, estabelecendo alianças novas e conhecendo as diversas visões sobre o país.

Apolo Heringer Lisboa em 04/10/2010


(*) Medico, Professor de Medicina Preventiva e Social da UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais, coordenador do Projeto Manuelzão.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Sujeira na Internet, eu deleto!

Hoje recebi e-mail de um professor, ex-colega dos tempos em que fui diretor de escola, pedindo-me o voto. Fiquei tocado com a mensagem, porque se trata de um professor lutador, de origem humilde, que dá um duro enorme para ganhar a vida dignamente, e teve a coragem de lançar-se candidato com chances quase nulas de ser eleito. Nosso sistema eleitoral existe para manter a democracia burguesa, isto é, o governo dos poderosos; raramente algum pobre-honesto consegue furar o bloqueio (ainda assim, viva a democracia!).

Mas não foi só isto que me tocou, foi também a sua abordagem política, enviando-me a sua proposta de trabalho. Enfatizo: proposta de trabalho e não promessas de campanha. Percebe a diferença? Meu querido colega tem idéias que são compartilhadas na área educacional e quer lutar para que elas sejam implementadas através de propostas exeqüíveis.

Enquanto isso, nos últimos meses da atual campanha eleitoral, recebi centenas de e-mails de uma rede podre de detratores da dignidade humana. Falam todo o mal dos adversários, inventam, aumentam, distorcem, caluniam; os adversários são execrados como uma espécie maligna e monstruosa, merecedores de um holocausto. Esses pequenos “hitlers”, “bushs” tupiniquins, assumem atitude de impávidos defensores da ética e da justiça na luta contra o império do mal. Uma coisa nojenta, que me deixou enfastiado até à alma.


Fico pensando: como pode alguém, com nível intelectual acima da média, gastar seu tempo e o tempo dos outros distribuindo impunemente mensagens difamatórias com o único fim de denegrir seus adversários políticos? Levar uma campanha eleitoral para o nível da baixaria não é solapar o processo democrático? Dá para escolher candidatos limpos enquanto se espalha sujeira?

Meu caro leitor, será que o mesmo se deu com você? Entre centenas de e-mails difamatórios e caluniosos de adversários políticos será que você teve a sorte de receber, como eu, pelo menos três mensagens eleitorais com propostas de candidatos? Algo que dignifica o processo eleitoral?

A Internet pode ser uma ferramenta fabulosa para o progresso humano, a democracia e o convívio social. Mas, para isto, precisamos estar vigilantes. Três pessoas, de partidos distintos, me enviaram propostas eleitorais e me pediram o voto. Se pudesse, daria o meu voto a cada uma delas, pela atenção e pela atitude de fazer da Internet um instrumento de cidadania e de consolidação da nossa jovem democracia.

Quanto aos outros, os difamadores, os maledicentes, comigo é assim:

SUJEIRA NA INTERNET, EU DELETO!


Nota: Autorizei a publicação deste texto em http://www.paracatu.net/

Marcadores: internet; sujeira na internet; eleições.

domingo, 26 de setembro de 2010

União Européia quer proibir cianeto na mineração; em Paracatu continuaremos a ingerí-lo. Até quando?

A resolução 2010-0145 do Parlamento Europeu, de 5 de maio de 2010, numa decisão histórica, solicitou à Comissão Européia a proibição do uso do cianeto no beneficiamento mineral, a partir de 2011, em todos os países membros. Trata-se de uma medida de PRECAUÇÃO, pois, de acordo com a argumentação legal “A possibilidade de que ocorra um acidente na mineração em grande escala com o uso de cianeto é só uma questão de tempo".


Então, meu caro leitor, onde ficam os argumentos da mineradora Kinross, amplamente reproduzidos pela imprensa local e seus arautos, de que as suas atividades são inofensivas ao meio ambiente? Até quando a contaminação ambiental será ampliada com a aprovação de governos e daqueles que se iludem com as migalhas que caem da mesa?

Reproduzo, a seguir, algumas das considerações que justificaram a decisão do Parlamento Europeu.

- O cianeto é uma substância química altamente tóxica utilizada na exploração mineira do ouro, tratando-se de um dos principais poluentes, passível de provocar um impacto catastrófico e irreversível no ambiente e na saúde humana;

- O cianeto, além de fazer parte da lista de substâncias perigosas, constitui uma substância de periculosidade relevante;

- Nos últimos 25 anos, registraram-se em todo o mundo mais de trinta acidentes graves devido a derrames de cianeto; ainda, não existe qualquer garantia efetiva de que um acidente desse tipo não volte a acontecer, especialmente tendo em conta o aumento de condições meteorológicas extremas, nomeadamente as precipitações fortes e frequentes;

- O impacto provocado por acidentes devido a derrames de cianeto, em particular a contaminação de grandes bacias hidrográficas e de redes de abastecimento de águas subterrâneas, acentua a necessidade de uma abordagem da UE para fazer face à grave ameaça que a mineração com utilização de cianeto representa para o ambiente;

- Continuam a faltar regras de prevenção e garantias financeiras adequadas, sendo apenas uma questão de tempo ou de negligência humana para que se verifique um outro acidente;

- A mineração com utilização de cianeto exige pouca mão-de-obra, mas pode, por outro lado, provocar enormes danos ecológicos transfronteiriços, cujos custos, geralmente, não são cobertos pelas empresas responsáveis que operam as instalações, as quais acabam por desaparecer ou abrir falência, mas sim pelo Estado, ou seja, pelos contribuintes;

- Falta de seguro a longo prazo que cubra os eventuais custos incorridos em caso de um futuro acidente ou mau funcionamento;

- É necessário extrair uma tonelada de minério de baixo grau para produzir duas gramas de ouro (*), deixando uma quantidade enorme de rejeitos nas instalações, enquanto que 25% a 50% do ouro acaba por permanecer nos depósitos de resíduos; além disso, os grandes projetos de mineração com utilização de cianeto implicam a utilização de vários milhões de quilos de cianeto de sódio por ano, cujo transporte e armazenamento podem causar efeitos catastróficos na eventualidade de uma ruptura;
(*) Nota: na mina de ouro da Kinross, em Paracatu, são necessárias 5 toneladas de minério para produzir 2 gramas de ouro, isto é, 5 vezes mais.

- Existem alternativas à utilização de cianeto na exploração mineira, passíveis de substituir as tecnologias com uso de cianeto;

- Os projetos de mineração com utilização de cianeto estão a suscitar vigorosos protestos em toda a Europa, por parte não apenas de cidadãos particulares, das populações locais e das ONGs, mas também dos organismos públicos, dos governos e dos responsáveis políticos.

Entretanto, a Comissão Européia considerou não justificada a interdição geral ao uso do cianeto no beneficiamento mineral devido à falta de melhores (no sentido de causarem um menor impacto no ambiente) alternativas tecnológicas, e que uma interdição geral implicaria o encerramento de atuais minas que operam em condições consideradas seguras, o que seria negativo para o nível de emprego. Portanto, na Europa assim como no Brasil, a criação ou manutenção dos postos de trabalho estão acima das considerações ambientais, como o princípio da precaução, a saúde dos trabalhadores e a ameaça à vida.

Nota do blog: Diante das considerações do Parlamento Europeu, caro leitor, qual a sua conclusão sobre o uso do cianeto pela Kinross junto à ZONA URBANA de Paracatu? O que você acha quando pessoas que se dizem "ambientalistas" e se confessam "parceiros" das mineradoras declaram que o conflito ambiental gerado pela Kinross é fruto da má informação ou da má intenção dos ativistas ambientais?

Fonte das informações veiculadas neste artigo:
1) http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+TA+P7-TA-2010-0145+0+DOC+XML+V0//PT . Acesso em 26/9/2010.
2) http://www.europarl.europa.eu/sides/getAllAnswers.do?reference=P-2010-3589&language=PT. Acesso em: 26/9/2010.

Marcadores: cianeto ; união européia; paracatu; mineração; ouro; contaminação ambiental; parlamento europeu .

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Biblioteca Mundial da UNESCO

QUE PRESENTE DA UNESCO PARA A HUMANIDADE INTEIRA ! Especialmente para OS JOVENS !Já está disponível na Internet, através do sítio www.wdl.org. (Acesse o link ao final dese texto.)


A BIBLIOTECA MUNDIAL DA UNESCO reúne mapas, textos, fotos, gravações e filmes de todos os tempos e explica em sete idiomas as jóias e relíquias culturais de todas as bibliotecas do planeta. Entre os documentos mais antigos há alguns códices pré-colombianos, graças à contribuição do México, e os primeiros mapas da América, desenhados por Diego Gutiérrez para o rei de Espanha em 1562.

Os tesouros incluem o Hyakumanto darani , um documento em japonês publicado no ano 764 e considerado o primeiro texto impresso da história; um relato dos azetecas que constitui a primeira menção do Menino Jesus no Novo Mundo; trabalhos de cientistas árabes desvelando o mistério da álgebra; ossos utilizados como oráculos e esteiras chinesas; a Bíblia de Gutenberg; antigas fotos latino-americanas da Biblioteca Nacional do Brasil e a célebre Bíblia do Diabo, do século XIII, da Biblioteca Nacional da Suécia.

Cada jóia da cultura universal aparece acompanhada de uma breve explicação do seu conteúdo e seu significado. Os documentos foram escaneados e incorporados no seu idioma original, mas as explicações aparecem em sete línguas, entre elas PORTUGUÊS.

A biblioteca começa com 1200 documentos, mas foi pensada para receber um número ilimitado de textos, gravados, mapas, fotografias e ilustrações.

Embora seja apresentado oficialmente hoje na sede da UNESCO , em Paris, a Biblioteca Digital Mundial já está disponível na Internet. O acesso é gratuito e os usuários podem ingressar directamente pela Web, sem necessidade de se registarem.

Quando a gente faz clique sobre o endereço www.wdl.org, tem a sensação de tocar com as mãos a história universal do conhecimento. Permite ao internauta orientar a sua busca por épocas, zonas geográficas, tipo de documento e instituição. O sistema propõe as explicações em sete idiomas (árabe, chinês, inglês, francês, russo, espanhol e português). Os documentos, por sua parte, foram escaneados na sua língua original. Desse modo, é possível, por exemplo, estudar em detalhe o Evangelho de São Mateus traduzido em aleutiano pelo missionário russo Ioann Veniamiov, em 1840. Com um simples clique, podem-se passar as páginas de um livro, aproximar ou afastar os textos e movê-los em todos os sentidos. A excelente definição das imagens permite uma leitura cômoda e minuciosa.

Duas regiões do mundo estão particularmente bem representadas: América Latina e Médio Oriente. Isso se deve à ativa participação da Biblioteca Nacional do Brasil, a biblioteca Alexandrina do Egipto e a Universidade Rei Abdulá da Arábia Saudita.

A estrutura da BDM foi decalcada do projeto de digitalização da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, que começou em 1991 e atualmente contém 11 milhões de documentos "on line".

A BDM é, sobretudo, destinada a investigadores, professores e alunos. Mas a importância que reveste esse sítio vai muito além do estímulo ao estudo das novas gerações que vivem num mundo audiovisual. Este projeto tampouco é um simples compêndio de história "on line": é a possibilidade de acessar registros antes inacessíveis, sem limite de tempo e sem custo.

Não deixe de acessar e indicar: http://wdl.org

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Essa tal de sustentabilidade

Depois de um mês fora de casa, aqui estou de volta à terrinha, por uns breves momentos acertando os ponteiros. Você já reparou que por mais que sua ausência se prolongue, na volta as coisas parecem estar no mesmo lugar? É como novela, você pode perder alguns capítulos sem perder a história, a trama continua enrolada nos mesmos nós.

Paracatu continua como estava, sol causticante em pleno “inverno”, a rua dos supermercados tomada de pessoas e carros; vento soprando a poeira lá de cima; essa secura no ar; cerveja com churrasquinho de maçã-de-peito na porta dos botecos, a feira do sábado deixando lixo espalhado por toda banda; anúncios de festas no final de semana e uma boa quantidade de gente fazendo o que mais gosta: fuxico... e porque estamos em ano eleitoral, fuxicos eleitorais.

Percorro a Olegário Maciel, em vários pontos vejo mocinhas segurando cartazes de candidatos sorridentes, bandeiras dos futuros “representantes do povo”. Uma delas se aproxima, cara bonitinha, e me entrega um volante. A foto do simpatissíssimo candidato (por que será que todo candidato é simpático?) e, no verso, as suas propostas. Ah, como tenho saudade dos tempos em que os partidos tinham propostas diferentes! Agora, misturaram-se alhos e bugalhos, ninguém sabe de que lado eles estão ou se o lugar deles é em cima do muro pra “zoiá” onde tem mais vantagens.

Mas o volante que eu ganhei tinha uma coisa interessante: o tal candidato quer que Paracatu tenha “desenvolvimento sustentável”. Cá pra nós, essa tal de sustentabilidade virou um jargão, coisa que tem servido mais a bandidos do que a mocinhos.

Temos mineradoras sustentáveis despejando arsênio e chumbo no ambiente, agricultura sustentável eliminando o cerrado e despejando agrotóxicos no solo e nas águas, governos sustentáveis passando por cima da lei para favorecer empreendimentos agressivos ao ambiente e até candidatos sustentáveis se beneficiando de convênios com empresas poluidoras; e nós, cidadãos comuns, jogando lixo na praça. Tranqüilo... a gente tem que sustentar o emprego dos garis.

Pois é, existem palavras bonitas, que as pessoas gostam e passam a adotar como princípio, como meta, principalmente porque não se sabe exatamente o que elas significam; no imaginário elas podem nos remeter ao mundo ideal que todos desejamos. Talvez uma vida saudável, equilibrada, uma promessa de que o mundo de nossos filhos e netos será melhor do que o nosso, não é? Que não reste para eles apenas o buraco que estamos cavando...

Ah, essa tal de sustentabilidade!

Nota: Autorizei a publicação deste texto em: http://www.paracatu.net/#colunas&cid=335 e no jornal "O Movimento", ed. 381, de 1 a 15/9/2010.

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Governança: um comentário de Serrano Neves

O SERRANO NEVES, companheiro de lutas ambientais, fez um comentário sobre o texto postado neste blog: "Governança Global: mudar para que tudo continue como está". Como se trata de um comentário sério e lúcido, desses que valorizam uma discussão, pedi a ele autorização para publicá-lo, o que foi logo aceito.

Então, siga abaixo o comentário do Serrano.

Boa noite, Márcio!


Ia responder como comentário no blog mas a página de comentários não exibiu o código de controle.

O texto é ótimo e o último parágrafo, conclusivo, é perfeito.

Quando fundei o ISN o lema era "governos fora" e a primeira providência foi gerar um projeto de educação socioambiental para promover a aprendizagem coletiva, mas não consegui vencer a inércia social cujo catalisador tem 500 anos de história: paternalismo e assistencialismo mantidos à custa do capital.

Assim começou o Brasil com a coroa portuguesa e os filhos do governo aperfeiçoaram a herança genética pois já não mais pedem: o governo os procura e dá.

Quase metade da população é de filhos do governo, de um modo ou de outro, e se distribui em espaços estratégicos como as grandes periferias e as cidades do interior, e é essa distribuição espacial que torna essa massa um potencial de transformação. Se essa massa agisse não precisaríamos nos preocupar com o resto, pois seriam "sufocados" por uma simples ação de não mais fazer do lixo fonte de renda.

Mas, o que poderá vencer a força de uma cesta básica? ou de uma bolsa escola?

O modelo econômico comprou a cidadania e desvalorizou a dignidade.

Cheguei mesmo a montar dois modelos de "engenharia econômica" para estreitar as relações do capital com a sociedade através da função social da propriedade e dos ativos socioambientais.

Rssss, não achei um economista com disposição para ler até o final!

O modelo econômico atual eu batizei de "bola de neve": tem que rolar e crescer, se parar derrete.

A Constituição (o livro menos lido do Brasil) oferece o mecanismo: poder exercido diretamente pelo povo e função social da propriedade para construção de uma sociedade livre, justa e solidária.

Enfim, precisamos continuar tentando.

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Governança Global: mudar para que tudo continue como está

A atual crise ecológica atinge de modo generalizado toda a população da Terra, a despeito das fronteiras e das acentuadas diferenças entre países ricos e pobres. É, portanto, de natureza coletiva e, como tal, configura-se como uma contradição do atual modelo de desenvolvimento capitalista pois atinge também as elites privilegiadas, uma força destrutiva diante da qual elas estão impotentes.

Esta crise não pode ser resolvida mediante uma simples mudança de tecnologia, mudanças nas leis ou ajustes econômicos, que apenas a atenuam. É o próprio sistema capitalista a origem e o motor da crise, baseado na exploração dos recursos naturais e humanos com o fim exclusivo de gerar lucro. Sem uma profunda reconfiguração social, incluindo a superação do estado de miséria material e espiritual que prevalece no mundo, a crise tende a agravar-se.

No Brasil, em geral, os debates sobre a crise ecológica circulam muito mais no campo das diferenças do que no campo das identidades e as ações são estanques e pontuais, pois não se consegue consenso, por exemplo, a respeito de um projeto público de combate à miséria. Embora a Constituição Brasileira de 1988 tenha fomentado algumas mudanças estruturais importantes, tais como a instalação de conselhos de gestores de políticas públicas, estes tomaram como base um raríssimo perfil de conselheiro: o cidadão. O ser humano não passa de indivíduo a cidadão por decreto legal, mas pela experiência democrática e, para que a democracia sobreviva, é preciso contar com um número cada vez maior de cidadãos ativos. Desta maneira, o fato de existirem conselhos nem sempre garante qualidade, eficácia e eficiência às políticas públicas.

Desde a Revolução Industrial, os Estados têm desempenhado o papel de agentes do desenvolvimento industrial e também o de promotores do estilo de vida individualista e consumista. Muito embora persista a idéia de que os Estados representam o interesse público, sejam as nações ricas ou pobres, eles são na verdade o instrumento de poder que mantém o “status quo” e busca riqueza material acima de tudo, violando regras e restrições ambientais.

Quando cooperam entre si, os Estados têm como objetivo obterem maior acesso aos recursos naturais ou removerem obstáculos comuns ao desenvolvimento industrial. Suas políticas refletem a preocupação de manter ou estimular o desenvolvimento industrial diante das limitações ecológicas.

Um exemplo claro da afirmação acima é o empreendimento mineral da RPM/Kinross em Paracatu - MG, para o qual o órgão ambiental do Estado concede licenças ambientais sem a devida consideração aos riscos envolvidos. Além disso, num escárnio ao direito da população paracatuense à saúde e à segurança ambiental, o Estado concedeu à mineradora o auto-monitoramento ambiental de suas atividades. Consequentemente, ali não são implementadas ações condizentes com os princípios legais da Prevenção e da Precaução que deveriam reger o processo de licenciamento, o que poderá provocar uma catástrofe ambiental na região.

O Estado cuida dos interesses do Estado, em primeiro lugar: crescimento econômico para gerar impostos e postos de trabalho (que geram mais impostos e arrefece as tensões sociais). O apelo ao crescimento econômico exacerbado não contribui para que as empresas invistam em um planejamento que contemple as questões ambientais e o respeito à diversidade cultural. Desta maneira, os Estados converteram-se em um grande problema para a sustentabilidade ecológica do planeta, pois, além de uma conduta ofensiva ao ambiente, eles se transformaram em empecilhos quando se procura uma saída para a crise ecológica global.

Há três décadas que os organismos internacionais, como, por exemplo, a Conferência das Nações Unidas sobre Ecologia e Desenvolvimento (UNCED), vêm fazendo um esforço considerável para associar, ao lado das organizações representativas dos Estados, as organizações não-governamentais (ONGs) nas negociações que envolvem as questões ambientais. Isto se processa dentro de um conceito que hoje é conhecido como governança global, onde a presença de diferentes atores possibilitaria estimular o contraditório.

O resultado dessa associação foi o enorme crescimento de uma grande gama de entidades ambientalistas financiadas pelo Estado e de organizações do próprio Estado onde funcionários públicos encarnam as questões ambientais, tudo isto formando uma verdadeira "ecoburocracia".

Entretanto, essa associação não muda o quadro das discussões e das negociações, porque a atuação das ONGs não combate, mas apenas reforça o Estado e seus sistemas. São ONGs chapa-branca, ONGs de um indivíduo (INGs - Indivíduos Não-Governamentais?) que, por viverem sob proteção financeira do Estado, defendem as posições do Estado ou pressionam seus delegados, consolidando o modelo implícito fusão-difusão com o Estado como ator central. A governança global, portanto, não tenta romper com os paradigmas do Estado, mas os reforça.

Aqui no Brasil, os Comitês de Bacia, por exemplo, que discutem decisões importantes para o meio ambiente, abrigam essas ONGs e INGs, cujos votos garantem a aprovação de projetos destruidores do meio ambiente, mas que interessam ao Estado e às grandes empresas. Além disso, é frequente ver essas ONGs caça-níqueis, verdadeiros gigolôs ambientais, celebrar convênios com empresas poluidoras a troco de lhes dar "legitimidade" para continuarem suas agressões à natureza e à saúde humana.

Em qualquer dos mundos, as relações de poder são mais fortes que as representações sociais e não será a criação de um neologismo – governança global – que poderá mudar a correlação de forças. Nas mesas de discussões têm-se, então, os Estados incapazes de resolver a crise ecológica, porque seus objetivos são o crescimento econômico a qualquer custo e o modelo individualista-consumista, as ONGs que os reforçam e os organismos internacionais que os legitimam como possíveis solucionadores do problema.

Os resultados conquistados até agora em várias rodadas de negociações para resolver a crise ecológica global não passam de acordos de metas para uma melhor eficiência dos processos industriais. Mas todos sabem que a melhoria do desenvolvimento industrial não é a solução para a crise ecológica, apenas uma medida paliativa que não dará sustentabilidade ao planeta.

Através de uma governança global busca-se praticar coletivamente a gestão internacional dos recursos ambientais. Porém, mantendo-se na condição de atores centrais, os Estados, como agentes do desenvolvimento industrial, convertem-se em organismos que reagem para defender um modo de vida insustentável. Surgem os protocolos e suas metas ambientais conformadas à condição de manutenção dos padrões de desenvolvimento industrial e de consumo.

Sair da governança dos governos para a governança social requer a aprendizagem coletiva para afastar-se do atual processo nocivo de crescimento econômico e desenvolvimento industrial, do qual todos somos parte, e alijar o Estado do papel central das discussões. Enquanto isto não ocorrer, a governança global pode ser assim resumida: mudar para que tudo continue como está.


CONSULTAS

ECO-GREEN. El papel Del Estado em La crisis ecológica global de nuestros dias. In Ecología Política. Cuadernos de debate internacional 3. Barcelona: Icaria Editorial, 1991, p. 23-26.
LIMA JÚNIOR, Olavo Brasil de. Instituições Políticas Democráticas: o segredo da legitimidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1992.
RESENDE, Carolina Costa. O papel do conselheiro no processo de governança social. Revista de Governança Social, Ano I, Ed. 2, Belo Horizonte, junho-2008, p. 40-47.

Nota: A charge acima foi obtida em: www.panoramablogmario.blogger.com.br/ong_nani.jpg

Marcadores: governança; crise ecológica; crise ambiental; prevenção; precaução; sustentabilidade.

sábado, 14 de agosto de 2010

Minha querida Mantiqueira



Desde que eu era criança, a Serra da Mantiqueira me fascina. Nasci na Zona da Mata de Minas Gerais (Vilas Boas, Guiricema), porção norte da Mantiqueira, na base de uma montanha conhecida como Mutuca. Minha vida, sonhos e emoções ainda hoje são dominados por aqueles picos agrestes, a silhueta verde cinza das elevações recortada sobre o céu azul, despenhadeiros que lembravam a morte dos incautos, cachoeiras, sumidouros e socavões. Na escola humilde onde estudei até a quarta série a gente tinha que decorar os topônimos dos maiores acidentes geográficos: Serra Geral, Pedra da Mina, Pico das Agulhas Negras, Serra do Itatiaia, Serra de Ouro Preto etc.

Meus avós paternos e alguns tios moravam na Mutuca, onde cultivavam pequeno cafezal e produziam para consumo próprio arroz, feijão, milho, legumes, porcos, galinhas e rapadura. Era assim, naquela época tinha-se que produzir o sustento; o café e o fumo eram as moedas de troca. A minha família raramente ia até lá, pois era difícil subir a serra com a criançada. Porém, à medida que eu crescia, passei a subir a serra com mais frequência, acompanhado por um dos irmãos ou mesmo sozinho. A escalada era forte, mas as minhas pernas pareciam de cabrito montês. No meio da escalada, a gente parava para um fôlego e admirar a paisagem maravilhosa do terreno lá em baixo, a pequena vila do Córrego Preto e a vista que se perdia no horizonte. Lá no sítio, o que eu mais apreciava era chupar as sementinhas maduras do café, comer rapadura e tomar água geladinha e cristalina que corria de uma bica.

Tenho boas lembranças desses passeios, embora eu os fizesse sempre com temor, pois se falava de alguns lugares mal-assombrados naquelas bandas. E havia precipícios de onde um ou outro se jogara para a morte. Por isso, sempre que o medo me arrepiava, eu me benzia mil vezes com o sinal-da-cruz e estugava os passos para deixar o capeta para trás.

O que eu não gostava era dormir lá no sítio. O sol se escondia muito cedo, atrás de um paredão, e logo o ar se esfriava. Antes que a noite caísse, os mosquitos borrachudos vinham vorazes atrás de sangue, sucedidos ao anoitecer pelos pernilongos e pulgas. As cobertas eram escassas e curtas, de maneira que a gente ficava “pedalando” a noite inteira, sentindo o frio gelar os ossos. Assim, se eu pudesse escolher, minha passagem era curta e, ante os protestos dos parentes, descia a serra, mais rápido que o sol poente.

Marcadores: Mantiqueira; Vilas Boas; Guiricema; Mutuca.Minas Gerais.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Invictus

Já tinha assistido vários filmes sobre a África do Sul, Mandela e apartheid; além disso, no período da Copa do Mundo de futebol, as televisões veicularam muitos documentários e reportagens que me deixaram até um pouco "saturado" desses assuntos. Quando o filme Invictus chegou às locadoras, não tive entusiasmo em assisti-lo: pareceu-me apelativo misturar esporte com "Mandela", talvez o maior símbolo ainda vivo da dignidade humana.

Ontem, por falta de opção melhor, acabei assistindo Invictus... e me surpreendi. Adorei o filme! Não sou "expert" em cinema: o filme me agrada ou não. Talvez mais me tenha agradado porque o diretor (Clint Eastwood) utilizou-se de um poema belíssimo para dar força à trama.
O poema "Invictuous", que deu nome ao filme, foi escrito em 1875 pelo britânico William Ernest Henley. Durante os 27 anos em que Mandela esteve preso, este poema tornou-se um companheiro inseparável, que lhe dava força para manter a esperança e a sanidade.

Não vou discutir o filme (estrelado por Morgan Freeman e Matt Damon - foto), apenas o recomendo. Mas quero apresentar o poema.



Invícto
Autor: William E Henley

Sob o manto da noite que me cobre,
Negro como um buraco de um extremo a outro,
Agradeço a todos os deuses
Por minha alma inconquistável.

Nas garras ferozes das circunstâncias
Não me lamentei nem cai no choro.
Sob os golpes que o acaso atira
Minha cabeça sangra, mas não se curva.

Para além deste lugar de ira e lágrimas
Somente o Horror das trevas se divisa,
Ainda assim, a ameaça dos anos
Me encontra, e encontrará, sempre destemido.

Não importa quão estreita seja a senda,
Quão repleta de punições seja a sentença,
Eu sou o mestre do meu destino;
Sou o capitão da minha alma.


A seguir, leia o poema na língua original:

Invictouos

Out of the night that covers me,
Black as the Pit from pole to pole,
I thank whatever gods may be
For my unconquerable soul.

In the fell clutch of circumstance
I have not winced nor cried aloud.
Under the bludgeonings of chance
My head is bloody, but unbowed.

Beyond this place of wrath and tears
Looms but the Horror of the shade,
And yet the menace of the years
Finds, and shall find, me unafraid.

It matters not how strait the gate,
How charged with punishments the scroll,
I am the master of my fate;
I am the captain of my soul.

domingo, 4 de julho de 2010

Harmonia


Há uma superstição de que o mês de agosto é aziago. A voz popular diz: “Agosto, mês do desgosto”. Mas a minha vida não anda ajustada a esse calendário de frustrações, pois tive um mês de junho nada feliz, a começar por uma dengue que assolou a cidade e me atingiu jogando-me num buraco. Daí, as coisas se sucedem de graça: depois que um problema se instala outros brotam do nada, como por geração espontânea. É como a Hidra de Lerna, aquele monstro mitológico de nove cabeças: a cada cabeça cortada surge pelo menos mais uma no lugar.

Foi com esse sentimento de desgosto que apareci no meu escritório, neste início de julho, uma manhã fria, seca e empoeirada que parecia arrastar consigo meus problemas.

A novidade é que tenho uma vizinha que se mudou há pouco tempo, vinda de Patos de Minas, senhora de uns 60 anos, casada com um mestre-de-obras. A gente se cumprimenta, mas ainda não paramos para conversar. O pouco que sei dela deduzi dos sons que vêm do outro lado do muro: todas as manhãs ela acompanha missa pela televisão, seguindo a celebração com as cantorias da Igreja; noutros momentos do dia, ela canta com voz vibrante cantos religiosos e em algumas noites ouço vozes de um grupo de novena. É apenas isto que sei dela, uma pessoa religiosa dedicada a louvar a Deus.

Nunca prestei muita atenção a esses sons que saltam para o lado de cá, apenas registrava-os mentalmente. Hoje, porém, aconteceu diferente. Enquanto dava conta de meus afazeres, a cantoria do lado de lá me provocou outro tipo de vibração. Sem que me apercebesse, em um plano não mental ela foi crescendo em mim, envolvendo-me o espírito com um sentimento prazeroso, de segurança e confiança, eliminando as baixas vibrações que eu acumulara e deixando-me em estado de leveza e paz. Como por um encanto, os problemas se esfumaram e senti a plenitude de estar vivo, satisfeito e capaz de superar todas as coisas que me magoaram.

Não sigo a religião da minha vizinha; então, como isto se sucedeu?

Tudo está interligado e assim eu e ela e todos nós fazemos parte de um todo; nossas influências são mútuas e nossos seres captam vibrações de toda ordem. Uma pessoa desequilibrada, com pensamentos de animosidade, rancor, ódio, inveja e cobiça produz sensações de violência, conflitos, agressividade e desrespeito. Geralmente, nos envolvemos com pessoas assim, captamos seus fluidos deletérios; é muito fácil prestar atenção nelas, porque são ostensivas e agressivas.

Por outro lado, uma pessoa em equilíbrio, como aquela que liga seus pensamentos a Deus, difunde ao seu redor vibrações de harmonia, alegria, felicidade, prosperidade, paz e amor. São assim capazes de produzir sensações elevadas e consoladoras.

Antes de retomar o trabalho, cerro os olhos e faço uma prece silenciosa, agradecendo a Deus por minha boa vizinha do outro lado do muro, seus cantos de louvor que irradiam a paz que me consola.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Por que o Brasil não quer punir torturadores?

Vou reproduzir aqui um artigo lúcido e coerente do bloguista Sakamoto, doutor em Ciência Política, simplesmente porque concordo integralmente com os argumentos expostos.

"Pesquisa do Datafolha divulgada hoje no jornal Folha de S. Paulo mostra que 45% da população é contrária à punição de agentes que torturaram presos políticos durante a ditadura militar contra 40% a favor. Outros 4% são indiferentes e 11% não souberam opinar.

Tenho no fundo a esperança de que o assunto deu margem a múltiplas interpretações por parte dos entrevistados. Em outras palavras, espero que o pessoal tenha respondido sem saber exatamente o que foram as torturas durante a ditadura e para que serviram. Caso contrário, mais do que um Brasil sem memória e sem Justiça, temos diante de nós um país conivente com o pau-de-arara como ferramenta de obtenção de informações.

Não estou esquecendo que existe uma Lei da Anistia, que está em vigor, e que o Supremo Tribunal Federal (infelizmente) decidiu por mantê-la. A discussão aqui não é legal, ou seja, não é um debate sobre a mudança da lei e sim sobre a percepção coletiva sobre esses crimes. Posso ser a favor da punição, mas entender que existe uma legislação que a proíbe.

O impacto desse apoio se faz sentir no dia-a-dia dos distritos policiais, nas salas de interrogatórios, nas periferias das grandes cidades, nos grotões da zona rural, com o Estado aterrorizando parte da população (normalmente mais pobre) com a anuência da outra parte (quase sempre mais rica). A ponto de ser banalizada em filmes como Tropa de Elite, em que parte de nós torceu para os mocinhos que usavam o mesmo tipo de método dos bandidos no afã de arrancar a “verdade”.

A justificativa é a mesma usada nos anos de chumbo brasileiros ou nas prisões no Iraque e em Guantánamo, em Cuba: estamos em guerra. Ninguém explicou, contudo que essa guerra é contra os valores que nos fazem humanos e que, a cada batalha, vamos deixando um pouco para trás.

Não é de estranhar, portanto, que boa parte da sociedade que agora apóia esse esquecimento também tenha se calado diante do processo de defenestração pública de propostas do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), levado a cabo por setores descontentes em universalizar direitos.

Esse é o problema de sermos o país do “deixa disso” ou mesmo do “esquece, não vamos criar caso, o que passou, passou” e ainda do “você vai comprar briga por isso? Ninguém gosta de briguentos”. Enquanto não acertarmos as contas com o nosso passado, não teremos capacidade de entender qual foi a herança deixada por ele – na qual estamos afundados até o pescoço e nos define. Foram-se as garrafas, ficaram-se os rótulos. A ditadura se foi, sua influência permanece. Não somos um país que respeita os direitos humanos e não há perspectivas para que isso passe a acontecer pois, acima de tudo, falta apoio da própria população.

A verdade é que não queremos olhar para o retrovisor não por ele mostrar o que está lá atrás, mas por nos revelar qual a nossa cara hoje. E muitos de nós não suportarão isso.
"

Extraído de: Blog do Sakamoto - http://blogdosakamoto.uol.com.br/2010/06/07/por-que-o-brasil-nao-quer-punir-torturadores/ . Acesso: 07/06/2010

domingo, 30 de maio de 2010

Visita Técnica ao Inferno

Imagine, caro leitor, que você fosse professor de Engenharia Ambiental e que, para enriquecer a formação curricular de seus alunos, dirigisse uma visita técnica ao INFERNO. É isto mesmo, ao inferno, para conhecer as condições ambientais daquele lugar tão mal falado. Como pessoa da ciência, você é neutro, não é? Não importa para quê serve o inferno, para quem serve o inferno, mas como funciona o inferno, concorda? É assim que procedem muitas pessoas que se dizem cientistas, elas se fixam nos processos e não nos sistemas que geram os processos. Cientistas alienados ou pseudo-cientistas são sempre indispensáveis para manter o inferno funcionando.

Então, vamos lá! Chegando ao inferno você e a turma ficam extasiados com o seu perfeito sistema operacional, nada daquela zorra total que o pessoal daqui anda falando: departamento de recursos humanos, planejamento das operações, segurança do trabalho (afinal, quem trabalha lá tem que se cuidar!), sistema de controle de qualidade, treinamento de pessoal, enfim, um empreendimento eficiente e competitivo.

De tão entusiasmado com sua “descoberta”, você quer contar a todo mundo sobre as virtudes do inferno, uma organização que nem parece coisa de brasileiro. Lá vai um artigo de jornal: mil elogios, quem dera transformar nosso País num inferno daqueles!

Stop! Nossas digressões vão parar por aqui. O artigo, caro leitor, já foi publicado no jornal “O Lábaro”, edição 31, maio de 2010, página 21, sob o título: “Engenharia Ambiental visita mineradora de amianto crisotila”. Leia-o, é impagável!

Para quem não sabe, crisotila é amianto, também chamado de “fibra assassina”. A Agência Internacional de Pesquisa sobre Câncer, da Organização Mundial de Saúde, classifica o amianto ou asbesto no grupo 1 dos 75 agentes reconhecidamente cancerígenos para os seres humanos. A ação cancerígena do amianto está muito bem documentada cientificamente na literatura médica internacional há pelo menos um século. Por isto, ele já foi banido em 52 países ao redor do mundo. No Brasil por força de “lobby”, ele ainda é produzido, mas vários municípios e estados brasileiros já possuem legislação restritiva ao uso do amianto e em quatro deles já há uma proibição formal de sua exploração, utilização e comercialização, como é o caso de São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Pernambuco. Há um processo de banimento a ser votado no Congresso Nacional, talvez ainda neste ano.

Entretanto, a matéria assinada por uma professora descreve a visita com foco apenas nas condições operacionais da mina de amianto da SAMA, em Goiás, sem levantar uma única questão ambiental. Os visitantes não tiveram contato, é óbvio, com as inúmeras vítimas que ainda sobrevivem (a maioria já se foi!) da malfadada mina. O que me deixou pasmo, ao ler a citada matéria, foi a seguinte pérola: “A SAMA (...) é um exemplo que serve como padrão de desenvolvimento sustentável para mineradoras do Brasil e do exterior.” Padrão dos infernos! As câmaras de gás de Auschwitz-Birkenau ainda são referência mundial de extermínio, sua eficiência talvez jamais seja suplantada. Mas elas jamais poderão servir de padrão de Engenharia Ambiental, você não acha, caro leitor?

A verdade é que estamos “no mato sem cachorro”. Nossos cursos de engenharia ambiental não discutem o que é desenvolvimento e muito menos o significado de sustentável. Seu objetivo é formar para o "mercado", esta coisa vil e podre que não se importa com a saúde do trabalhador, com a saúde da população, e vai continuar lançando os seus amiantos, arsênios, chumbos, cianetos e toda sorte de pestilência, de modo eficiente, com a mais moderna tecnologia de produção. O importante é o lucro a qualquer custo, e para isto o sistema de exploração necessita de pessoas alienadas e eficientes para promover o inferno sustentável. Pessoas que não questionem: pra que o inferno, se ele só interessa ao diabo?


Este texto foi publicado no jornal "O Lábaro", ed. 32, junho de 2010.
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quinta-feira, 6 de maio de 2010

Mineração em Paracatu: anos dourados ou triste sina?

O surgimento de Paracatu deve-se, inegavelmente, à exploração do ouro e talvez isto seja, mais que um proveito, uma triste sina. Naqueles tempos, o povoado teve um rápido crescimento e, depois, uma longa estagnação, da qual foi arrancada pela agricultura nos anos 1980.

Crescimento econômico não se confunde com desenvolvimento. Para que este ocorra é necessário um projeto social que prepare um futuro melhor para a massa da população. Entretanto, os governos e suas agências, as empresas assim como a maioria das pessoas, supõem que o desenvolvimento econômico resulta da posse de coisas como usinas, barragens, prédios, tratores e outras, criando falsas e fúteis expectativas.

É evidente que os resultados econômicos não se traduzem automaticamente em benefícios para a maioria. Por isto, é preciso refletir sobre a natureza do desenvolvimento e estabelecer políticas estruturadas por valores que não sejam apenas os dos donos do capital.

Os Relatórios do desenvolvimento humano do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) identificam quatro capacidades para se avaliar o progresso do bem-estar humano: vida longa e saudável, conhecimento, acesso aos recursos necessários para um padrão de vida digno e participação na vida da comunidade. Eles enfatizam que o desenvolvimento depende da maneira como os recursos gerados são utilizados – se para produzir veneno ou para produzir alimentos, se para ostentar vaidades ou para fornecer água potável, por exemplo.

Para aferir o desenvolvimento humano, cerca de 200 indicadores foram consubstanciados num índice – Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) – obtido da média de renda, escolaridade e longevidade.

A tabela seguinte apresenta o PIB per capita, o Índice de Analfabetismo e o IDH de Paracatu, comparados aos de Unaí e do Brasil.

(*) Produto Interno Bruto dos Municípios 2002-2005. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (19 de dezembro de 2007).
(**) Ranking decrescente do IDH-M dos municípios do Brasil. Atlas do Desenvolvimento Humano. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) (2000).

Se acreditássemos nos arautos das mineradoras, os resultados apresentados seriam chocantes: então, a vizinha Unaí, que não tem indústria mineral, tem PIB per capita 30% superior e IDH 6,8% superior? Comparados ao Brasil, o PIB per capita de Paracatu é a metade, a taxa de analfabetismo é 20% superior e o IDH 7% inferior?!

Onde fica o argumento dos benefícios econômicos e sociais trazidos pelas mineradoras?

A presença de duas grandes indústrias minerais, sem dúvida, faz crescer a economia, mas até onde? Se os frutos do crescimento são utilizados para reforçar uma matriz institucional exploradora, ao invés de servir para transformá-la, seus benefícios não chegam sequer a melhorar o acesso das populações mais vulneráveis aos direitos fundamentais do homem.

E nos aspectos ambientais? A indústria mineral utiliza o jargão do “desenvolvimento sustentável”. Já provamos que ela não trouxe desenvolvimento, mas o que seria então “desenvolvimento sustentável”? Sustentabilidade não é um conceito científico, mas um conceito ético: fazer ou não opções que favoreçam as gerações futuras, abrindo mão de benefícios imediatos.

Gell-Mann, prêmio Nobel de Física de 1969, ao discutir o significado do adjetivo sustentável, conclui que há uma “desejabilidade” junto com a sustentabilidade.
De maneira geral, as pessoas sabem o que é e o que não é desejável. A ausência de vida na Terra pode ser sustentável; o ar envenenado por cianeto, arsênio e outras substâncias tóxicas pode ser sustentável no planeta durante milhões de anos; o solo contaminado por agrotóxicos, arsênio, chumbo e outros metais pesados pode ser sustentável até que haja desaparecido a vida na Terra. Mas ninguém deseja ar envenenado, solo contaminado, vida destruída, água inutilizável e tantos outros produtos do crescimento econômico a qualquer custo. A sustentabilidade ambiental é baseada no imperativo ético de solidariedade com a geração atual e com as gerações futuras.

Assim, quando falamos em desenvolvimento sustentável estamos nos referindo a um desenvolvimento socialmente includente, ambientalmente sustentável e economicamente sustentado através do tempo. Isto jamais seria compatível com as ações de mineradoras que destroem as reservas de água potável, contaminam ar, água e solo com substâncias letais, utilizam o seu enorme poder para se imporem às populações atingidas, sonegam informações sobre poluição ambiental e mascaram suas políticas predatórias com engodos e falsidades.

Como seria bom se pudesse tecer louvores sobre a mineração em Paracatu! O povoamento da cidade iniciou-se com o garimpo, que deixou seu rastro de pobreza contaminada pelo mercúrio, e, hoje, pouco está se importando com o invisível arsênio e o seu terrível e eterno legado. A febre do ouro nos lembra que muitos preferem ter uma vida curta, mas que (quem sabe?) por um breve momento possa ser excitante.

Artigo publicado no jornal "O Lábaro", Ano 03, Edição 30, abril/2010.
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