Blog do Professor Márcio

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sábado, 4 de abril de 2009

IMPACTO AMBIENTAL EM PARACATU

A profundidade do impacto ambiental causado pela Rio Paracatu Mineração foi até agora desconsiderada pelas autoridades e por grande parte da população. O projeto de expansão encontra-se em andamento e, pela rapidez de seu avanço, estaremos nos defrontando com situações irreversíveis, como nascentes e vegetação destruídas, assoreamento de córregos, além de ameaças de barragens gigantescas e da poluição que compromete a saúde das pessoas. Isto está acontecendo sem que medidas destinadas a compensar impactos ambientais negativos, principalmente os custos sociais que não podem ser evitados e o uso de recursos ambientais não renováveis, sejam tomadas pelos responsáveis pela execução do projeto.

A cobrança dessas medidas não é ato de ofensa à empresa ou a seus empregados, mas o exercício legítimo do direito dos cidadãos, assim como é dever da empresa cumprir as exigências das leis do País.

Gostaria de expor aqui uma opinião técnica, do ponto de vista geológico- geoquímico. Uma questão crítica diz respeito ao cianeto. A política de comunicação social da mineradora é informar à população que o cianeto utilizado na mina para recuperar o ouro é inativado na barragem de rejeitos pela fotólise, isto é, a degradação pelos raios ultravioleta do sol. Entretanto, a mineradora não divulga que a maior parte do cianeto utilizado fica reservada em tanques específicos, que depois são cobertos por terra. Deste modo, o veneno é deixado ali, dormente, em vez de ser eficientemente inativado.

Algo semelhante ocorre com o excesso de arsênio precipitado na hidrometalurgia, e que fica armazenado em tanque específico. Consideramos esse procedimento inadequado, porque transfere o problema e o risco de envenenamento para as gerações futuras.

A atividade de mineração, quando comparada a outras fontes de degradação do ambiente, como a agricultura e a pecuária, afeta de modo direto uma área relativamente pequena. Contudo, os elementos solubilizados dos rejeitos, quando atingem os cursos d'água, impactam negativamente áreas localizadas a centenas de quilômetros da mineração. Elevados teores de metais pesados podem ser encontrados na cadeia alimentar e no homem nos arredores das áreas de mineração, pela entrada desses elementos em solos agrícolas, córregos, rios e ribeirões e nos alimentos produzidos nestas áreas. Isso coloca em risco toda a população localizada no entorno do empreendimento minerador.

O tratamento do minério da Mina Morro do Ouro, que contém minerais sulfetados, como arsenopirita (sulfeto de ferro e arsênio), expõe à atmosfera os sulfetos confinados que, ao entrarem em contato com a água e o ar, sofrem oxidação facilitada por bactérias. Os produtos da oxidação dos sulfetos, além de serem altamente solúveis, apresentam reação fortemente ácida, de modo que são facilmente dissolvidos na fase líquida, acidificando as águas de drenagem.

Em razão dos baixos valores de pH, elementos tóxicos, incluindo alumínio, manganês, cobre, arsênio, chumbo, mercúrio e cádmio, presentes no meio, são solubilizados e mobilizados nas águas de drenagem, podendo ser absorvidos em níveis tóxicos pelas plantas e incorporados na cadeia alimentar. A flora e a fauna assimilam compostos de arsênio com facilidade, pois este elemento substitui o nitrogênio e o fósforo em algumas vias metabólicas.

A drenagem ácida da Mina Morro do Ouro constitui sério problema ambiental, capaz de comprometer a qualidade dos recursos hídricos, cujas águas se tornam inadequadas para irrigação, consumo humano e animal. Ela é tanto mais séria, quanto maior é a profundidade da mina.

Também ocorre dificuldade de revegetação das áreas de rejeito e de estéril advindos da mineração. Os depósitos de rejeitos são um "morro triturado e virado ao contrário", transformado em uma planície estéril e venenosa. A geração de acidez e a conseqüente solubilização de metais, nessa planície e nas áreas de lavra e nas cavas de onde os rejeitos vieram, podem ser prevenidas pelo controle do ingresso de oxigênio no substrato sulfetado. Portanto, uma medida eficiente seria inundar os depósitos de rejeito e o lavrado e, deste modo, prevenir o acesso de oxigênio. Esta solução pode funcionar parcialmente na área da cava, mas não nas áreas do entorno e, muito menos, nas barragens de rejeito, em função da diminuição da estabilidade e segurança dessas barragens.

A medida mais viável é a revegetação, que pode retornar boa parte da água de percolação para a atmosfera, por meio da transpiração, além de dar mais estabilidade à superfície, para prevenir o arraste de partículas contaminadas pelo vento e pela água. Entretanto, os rejeitos apresentam sérias restrições ao desenvolvimento das plantas, considerando, principalmente, os teores baixos de fósforo, potássio e matéria orgânica, bem como a elevada acidez e salinidade e o alto teor de arsênio. Nessas condições, a mortalidade das plantas é próxima a 100%. Basta observar, na paisagem atual da mina, que não ocorre colonização vegetal espontânea.

Qual o custo da revegetação, nestas condições? Onde estão os resultados dos projetos de reflorestamento? Onde está o plano de reflorestamento? Quais são e onde estão os resultados dos testes e pesquisas? O que fazer do lixo químico? As respostas a estas perguntas e às preocupações que têm sido expostas pelos vários segmentos da comunidade paracatuense, que se sentem mal informados ou até mesmo manipulados, não foram ainda apresentadas pela empresa mineradora.

Pelo que acima expusemos, o projeto de expansão da mina apresentado pela RPM não demonstra capacidade de tratar adequadamente estes problemas. O risco de envenenamento ambiental é potencialmente grande e os processos são complexos, mas ainda não mereceram a devida atenção por parte da empresa e dos órgãos ambientais.

Márcio José dos Santos
Geólogo e Mestre em Administração

Texto publicado no jornal “O LÁBARO”, de Paracatu - MG (Out/2007)

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