Blog do Professor Márcio

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domingo, 20 de março de 2016

Apenas fazendo perguntas

Existe alguma esperança? Será que realmente somos nada mais do que uma espécie de seres sencientes correndo soltos, explodindo bombas para provar a nossa invencibilidade, matando aqueles que julgamos criminosos para demonstrar a nossa justiça, enquanto centenas de crianças são condenadas a morrer de fome a cada hora enquanto nós defendemos uma economia global que beneficia um décimo da população do planeta?

Perdemos tanto nossa mente coletiva a ponto de pensar que a maneira de parar a violência armada é cada um de nós levar uma arma? Ou de acharmos que a destruição ambiental é necessária para que a humanidade possa sobreviver e progredir?

Perdemos tanto nossa vontade coletiva a ponto de acharmos que não existe como  parar as guerras que provocam crises de refugiados e criam milhões de desabrigados? Ou de acharmos que não se pode deter a destruição ambiental?

Perdemos tanto nossa moral coletiva a ponto de realmente preferirmos lançar divisões, grosserias, insultos e intimidações verbais que têm se tornado a marca das lideranças políticas?

quinta-feira, 10 de março de 2016

Mais quatro garimpeiros mortos em Paracatu

O tratamento dado aos garimpeiros pelos meios de comunicação de Paracatu é um esforço para legitimar a brutalidade e a violência com que são tratados. O boletim eletrônico Paracatu.net, ao noticiar o conflito ocorrido na área de descarte de rejeito da mineradora Kinross no dia 11/fev/2016, assim se expressou: “O que se percebe é que o grupo de garimpeiros é uma quadrilha bem articulada e possui informações privilegiadas sobre as ações e localização de militares. Será necessário esforço coletivo para desarticulá-la.”

Ao tratar do assunto de duas mortes relacionadas ao garimpo na barragem de rejeito nos meses de novembro de 2015 e janeiro deste ano, o jornal O Movimento atribuiu-as a conflitos entre garimpeiros, sem que fosse feita nenhuma investigação. No dia 26 de novembro passado, Marcone Dias Ferreira foi assassinado dentro de uma oficina de motos, no bairro Amoreiras II, alvejado por um homem de capacete, que entrou, descarregou sua arma contra a vítima e fugiu com um comparsa que o aguardava do lado de fora. A versão da polícia é que o crime está relacionado com o garimpo na área da Kinross.

A versão do último assassinato parece risível: “Evandro Aparecido Oliveira estava minerando, juntamente com seu filho de 14 anos, quando foram surpreendidos por homens armados, supostamente garimpeiros, que já chegaram atirando.” (grifo nosso) Continua o jornal informando que, 2 horas mais tarde, um dos supostos autores do homicídio, Ailton Rodrigues, deu entrada no Hospital Municipal, alvejado por oito tiros, quando passava na Rua Sete, do bairro Bela Vista. Essa história estava tão estranha que até o autor da matéria jornalística duvidou: “O estranho deste caso é que, horas depois, a polícia foi chamada ao Hospital Municipal porque um homem armado teria tentado entrar para matar Ailton Rodrigues que sobreviveu aos oito disparos...”.

Pois bem, as versões reproduzidas pela imprensa foram passadas pela PM e pela mineradora. Estão atirando para matar e as “Notas de Esclarecimento” da mineradora sempre repetem a mesma versão: “A Kinross informa que um grupo de pessoas invadiu sua propriedade nas proximidades da barragem de contenção de efluentes industriais. Os invasores fizeram disparos de arma de fogo, utilizaram pedras...” 

Os fatos ocorridos na noite de 15 fevereiro de 2016 deram o que falar em Paracatu, talvez porque pela primeira vez desde 1987, quando foi dado início à lavra na Mina Morro do Ouro, dois garimpeiros foram mortos por gás, um gás que a imprensa falada e escrita não quer citar o nome.

Lá pelas 23 horas, um grupo de garimpeiros havia penetrado um tubulão que descarrega o rejeito do minério na barragem do Eustáquio. Nisso, foram surpreendidos por uma descarga de cianeto na tubulação; quem pode, saiu às pressas e muitos ficaram desmaiados nas proximidades. Entretanto, o garimpeiro que havia entrado na frente, e que seria o último a sair, ficou agonizando dentro do tubulão. Um dos seus colegas resolveu salvá-lo e voltou ao tubulão. Lá ficaram os dois, agonizando até à morte. Foi chamada a PM, mas a quantidade de gás era tanta que todos os que se aproximavam sentiam os efeitos do gás venenoso. Também foi chamado o Corpo de Bombeiros de Unaí, mas o gás somente se dissipou pela manhã seguinte, quando então os corpos foram resgatados.


Integrante do Corpo de Bombeiros de Unaí usa máscara contra gás e cilindro de oxigênio para resgatar os corpos dos garimpeiros dentro da tubulação de efluentes da Mina Morro do Ouro.

Dois garimpeiros jovens, nascidos e criados em Paracatu foram mortos por gás venenoso. Vamos registrar aqui o nome do gás, o nome que todos falam "à boca pequena": cianeto (na verdade, gás cianídrico). 

O cianeto é utilizado no processo de beneficiamento do minério e, após a cianetação, sua solução é recolhida em tanques específicos, para ser reutilizada. De acordo com a informação frequentemente veiculada pela mineradora, uma pequena quantidade não recuperada segue junto com os efluentes e, na barragem de rejeito, é inativada pela ação dos raios solares. Ainda de acordo com a comunicação social da empresa, essa pequena quantidade não afetaria os seres vivos. (Nota: mineradoras ambientalmente responsáveis inativam o cianeto por um processo chamado DETOX, antes de lançá-lo no meio ambiente.)


Ora, os fatos da noite de 15 de fevereiro mostram que não foi uma pequena quantidade, mas uma grande quantidade de gás que foi exalada no conduto de rejeito, matando dois garimpeiros e afetando um grande número de pessoas. Só existem duas condições para explicar o acontecimento: (1) acidente; (2) lançamento intencional. A nota de esclarecimento da mineradora não falou em acidente. Vamos aqui lembrar que existe uma convenção internacional que proíbe o uso de gás venenoso até mesmo em combates de guerra. Sua utilização como arma é considerada crime de guerra.


Conversamos com algumas pessoas que lá estiveram, vivenciando a cena e todos deram a mesma versão. Conversamos com as pessoas para saber quem eram esses jovens: bandidos? quadrilheiros? Ouvi que eram pessoas pobres, trabalhadoras e de bem; por isto, faço questão de exibir aqui seus nomes, que agora estarão escritos na história desta cidade, a contragosto do poder dominante.


Corpos resgatados de Ezequiel (coberto) e de Rafael.


Ezequel Ferreira Souto, nascido em 26/04/1993 no quilombo (bairro) São Domingos, solteiro, filho de Cláudia Ferreira Souto, de uma família de 6 filhos. Estudou até o 1º Colegial na escola Cacilda Caetano de Souza. Trabalhou como servente de pedreiro, pedreiro e pintor de paredes. Estava desempregado há um ano, sendo o garimpo uma possibilidade de renda.

Rafael Coimbra Oliveira, nascido em Paracatu em 16/10/1991, filho de Maria Romilda José Coimbra. Era casado com Eliane Oliveira e deixou um filhinho de apenas 1 ano e meio. Trabalhou dois anos na loja de pneus Grancar, onde o gerente faz referencias elogiosas sobre ele e seu trabalho; recentemente trabalhava na loja Roda Nova. Rafael foi o rapaz que tentou socorrer o Ezequiel, um gesto heroico, prova de seu bom caráter.

Impactos da mineração no país

Estudo confirma impactos da mineração no país


7 DE JANEIRO DE 2015
Durante os últimos três anos, pesquisadores do Centro de Tecnologia Mineral (Cetem) do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação estudaram 105 territórios em 22 estados brasileiros que sofreram impactos da mineração e confirmaram que a extração de minerais é uma atividade “extremamente impactante nas regiões onde está instalada. Ela gera um conjunto de consequências ambientais e socioeconômicas”, diz o pesquisador do Cetem Francisco Rego Chaves Fernandes.
Doutor em engenharia mineral, Francisco Fernandes explica que uma das questões ambientais mais complicadas nos territórios de mineração diz respeito à água, pois “o reuso dela ainda é um sonho e as práticas de sustentabilidade estão muito atrasadas”. Ele lembrou que o Brasil depende hoje de um modelo exportador que gera riqueza e reservas importantes para o país, mas, ao mesmo tempo, os territórios acabam sendo fragmentados com isso. “Há um conflito muito grande porque o país tem muitas áreas sensíveis, como as indígenas, as de populações tradicionais, como os quilombolas, e as de preservação ambiental, o que resulta em muitas queixas”.
Fernandes destacou o papel importante desempenhado pelo Ministério Público Federal (MPF), que tem exigido que as mineradoras se comportem o mais possível dentro de boas práticas sustentáveis. “Mas esse é um caminho muito longo. A impressão que dá é que somos muito permissivos com isso”. Segundo ele, em muitos países, além de uma licença ambiental, exige-se que a atividade mineradora negocie previamente uma licença social com a população do território onde pretende se instalar.
Há no Brasil, conforme Fernandes, “uma licença ambiental pouco fiscalizada e bastante frouxa e nenhuma licença social, e a mineração parece ter predominância sobre tudo e sobre todos”. O resultado apresenta, de um lado, montanhas de dólares e de outro, cidades inchadas como Carajás, no Pará, principal empreendimento minerador brasileiro, que em dez anos viu a sua população crescer 300%. Em contrapartida, os serviços de infraestrutura, entre os quais se destaca o saneamento básico, são precários, afirma o pesquisador.
Um abuso detectado em territórios indígenas são os garimpeiros que entram para pegar ouro e diamantes e os assoreamentos provocados nos rios por materiais para uso imediato da construção civil. A produção é de baixíssimo teor de ouro, porque 1 tonelada de terra tem apenas 1 grama de ouro. “Isso é feito com água, com produtos químicos”, segundo Fernandes.
De acordo com o estudo, estão em funcionamento no país 3 mil minas e 9 mil mineradoras, além de uma centena de garimpos legais e clandestinos. O setor mineral emprega cerca de 200 mil trabalhadores e responde por 4% do Produto Interno Bruto (PIB), que é a soma de todos os bens e serviços produzidos no país. Os investimentos programados pelo setor somam US$ 75 bilhões entre 2012 e 2016.
Pelo estudo, os estados com maiores problemas são Minas Gerais e Pará, “que são os maiores produtores de substâncias minerais metálicas, como ouro, zinco, chumbo, minério de ferro e bauxita, que é o minério do alumínio, cujos problemas são mais complicados”.
Fernandes acredita que o estudo poderá servir de subsídio ao Congresso Nacional para a votação do marco mineral brasileiro: “É importante quando se mostram os impactos socioeconômicos da mineração”. O livro levanta questões como empobrecimento, aumento da prostituição e, em alguns casos, trabalho infantil em regiões como Marabá, no Pará, onde crianças e jovens na faixa de 12 a 14 anos são colocados para trabalhar com carvão vegetal para produção de ferro-gusa. Sem falar nos impactos ambientais, com destaque para poluição da água, assoreamento dos rios, desmatamento, erosão, mudança da paisagem do solo e danos à flora e à fauna.
Segundo o pesquisador, o estudo pode subsidiar também o MP, associações e movimentos sociais que tratam dessas questões, e caminhar para casos de sucesso, que seriam acordos entre mineradoras e comunidades afetadas para que a atividade fosse sustentável ou controlável.
Nesse sentido, ele destacou o acordo firmado entre a empresa Alcoa e a população ribeirinha do município paraense de Juruti, após intenso conflito. A mineradora investiu US$ 1 bilhão no empreendimento e a contrapartida para os moradores somou US$ 40 milhões, sob a forma de escolas, hospital e ações de empreendedorismo, que criaram uma economia local que gera renda e emprego na própria região.
Procurado para comentar o estudo, o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), representante das empresas e instituições que atuam no setor, encontrava-se em recesso.
Fonte: Agência Brasil, Alana Gandra Edição: Jorge Wamburg
Artigo publicado pela Rede Mobilizadores. Acesso: http://www.mobilizadores.org.br/noticias/estudo-confirma-impactos-da-mineracao-pais/