Blog do Professor Márcio

Seja bem vindo. Gosto de compartilhar ideias e sua visita é uma contribuição para isto. Volte sempre!

sábado, 30 de julho de 2011

Por que a população não sai às ruas contra a corrupção?

O jornal O Globo publicou uma reportagem no domingo (16/7) para questionar por que os brasileiros não saem às ruas para protestar contra a corrupção. Para fazer a matéria, os repórteres Jaqueline Falcão e Marcus Vinicius Gomes entrevistaram os organizadores das manifestações de defesa dos direitos dos homossexuais e da legalização da maconha. E a Coordenação Nacional do MST.

A repórter Jaqueline Falcão enviou as perguntas por correio eletrônico, que foram respondidas pela integrante da coordenação do MST, Marina dos Santos, e enviadas na quinta-feira em torno das 18h, dentro do prazo. A repórter até então interessada não entrou mais em contato. A reportagem saiu só no domingo. E, é claro, O Globo não aproveitou as respostas que não lhe convinham.

Por que será que a chamada "grande imprensa" só publica o que convém à elite podre do País?

Abaixo, leia as respostas da integrante da Coordenação Nacional do MST, Marina dos Santos, que não saíram em O Globo.

- Por que o Brasil não sai às ruas contra a corrupção?
Arrisco uma tentativa de responder essa pergunta ampliando e diversificando o questionamento: por que o Brasil não sai às ruas para as questões políticas que definem os rumos do nosso país? O povo não saiu às ruas para protestar contra as privatizações – privataria – e a corrupção existente no governo FHC. Os casos foram numerosos – tanto é que substituiu-se o Procurador Geral da Republica pela figura do “Engavetador Geral da República”.

Não saiu às ruas quando o governo Lula liberou o plantio de sementes transgênicas, criou facilidades para o comércio de agrotóxicos e deu continuidade a uma política econômica que assegura lucros milionários ao sistema financeiro.
Os que querem que o povo vá as ruas para protestar contra o atual governo federal – ignorando a corrupção que viceja nos ninhos do tucanato – também querem ver o povo nas ruas, praças e campo fazendo política? Estão dispostos a chamar o povo para ir às ruas para exigir Reforma Agrária e Urbana, democratização dos meios de comunicação e a estatização do sistema financeiro?

O povo não é bobo. Não irá às ruas para atender ao chamado de alguns setores das elites porque sabe que a corrupção está entranhada na burguesia brasileira. Basta pedir a apuração e punição dos corruptores do setor privado junto ao estatal para que as vozes que se dizem combater a corrupção diminua, sensivelmente, em quantidade e intensidade.

- Por que não vemos indignação contra a corrupção?
Há indignação sim. Mas essa indignação está, praticamente restrita à esfera individual, pessoal, de cada brasileiro. O poderio dos aparatos ideológicos do sistema e as políticas governamentais de cooptação, perseguição e repressão aos movimentos sociais, intensificadas nos governos neoliberais, fragilizaram os setores organizados da sociedade que tinham a capacidade de aglutinar a canalizar para as mobilizações populares as insatisfações que residem na esfera individual.
Esse cenário mudará. E povo voltará a fazer política nas ruas e, inclusive, para combater todas as práticas de corrupção, seja de que governo for. Quando isso ocorrer, alguns que querem ver o povo nas ruas agora assustados usarão seus azedos blogs para exigir que o povo seja tirado das ruas.

- As multidões vão às ruas pela marcha da maconha, MST, Parada Gay…e por que não contra a corrupção?
Porque é preciso ter credibilidade junto ao povo para se fazer um chamamento popular. Ter o monopólio da mídia não é suficiente para determinar a vontade e ação do povo. Se fosse assim, os tucanos não perderiam uma eleição, o presidente Hugo Chávez não conseguiria mobilizar a multidão dos pobres em seu país e o governo Lula não terminaria seus dois mandatos com índices superiores a 80% de aprovação popular.

Os conluios de grupos partidários-políticos com a mídia, marcantes na legislação passada de estados importantes – como o de Minas Gerais, São Paulo e Rio Grande do Sul – mostraram-se eficazes para sufocar as denúncias de corrupção naqueles governos. Mas foram ineficazes na tentativa de que o povo não tomasse conhecimento da existência da corrupção. Logo, a credibilidade de ambos, mídia e políticos, ficou abalada.

- A sensação é de impunidade?
Sim, há uma sensação de impunidade. Alguns bancos já foram condenados devolver milhões de reais porque cobraram ilegalmente taxas dos seus usuários. Isso não é uma espécie de roubo? Além da devolução do dinheiro, os responsáveis não deveriam responder criminalmente? Já pensou se a moda pegar: o assaltante é preso já na saída do banco, e tudo resolve coma devolução do dinheiro roubado…

O presidente da CBF, Ricardo Teixeira, em recente entrevista à Revista Piauí, disse abertamente: “em 2014, posso fazer a maldade que for. A maldade mais elástica, mais impensável, mais maquiavélica. Não dar credencial, proibir acesso, mudar horário de jogo. E sabe o que vai acontecer? Nada. Sabe por quê? Por que eu saio em 2015. E aí, acabou.(…) Só vou ficar preocupado, meu amor, quando sair no Jornal Nacional.”
Nada sintetiza melhor o sentimento de impunidade que sentem as elites brasileiras. Não temem e sentem um profundo desrespeito pelas instituições públicas. Temem apenas o poder de outro grupo privado com o qual mantêm estreitos vínculos, necessários para manter o controle sobre o futebol brasileiro.

São fatos como estes, dos bancos e do presidente da CBF – por coincidência, um dos bancos condenados a devolver o dinheiro dos usuários também financia a CBF – que acabam naturalizando a impunidade junto a população.

Texto da página do MST: http://www.mst.org.br/

domingo, 17 de julho de 2011

A cruel honestidade do Presidente do IBAMA

Roberto Malvezzi, Gogó
Agente Pastoral da Comissão Pastoral da Terra

Finalmente alguém no poder é honesto em suas declarações. Quando Curt Trennepohl, presidente do IBAMA, disse a jornalista australiana que seu trabalho "não é cuidar do meio ambiente, mas minimizar os impactos” e que o Brasil vai fazer "com os índios o que os australianos fizeram com os aborígenes” (F.S.P, 15/07/11), foi de uma honestidade rara e cruel. A declaração é um horror, uma proclamação de genocídio.

Porém, é o que está diante de nossos olhos todos os dias. A tarefa do IBAMA é tentar por remendo novo em pano velho; isto é, amenizar os estragos feitos pelas grandes obras, seja de iniciativa particular ou oficial. A prevenção e a precaução não fazem parte do roteiro governamental.

A CPT, juntamente com o CIMI, sabe que anda muito só ultimamente nas suas lutas pelo campo. As populações mais vitimadas pelo modelo atual, e pelo governo atual, são exatamente os indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais. Os Movimentos da Via Campesina se defendem melhor, até por sua proximidade com o governo. Porém, na hora da luta concreta, as comunidades tradicionais estão enfrentando uma solidão cósmica.

Porém, a honestidade do presidente do Ibama não anula a dimensão cruel, anti-humana, que permeia a política desenvolvimentista atual. Antes, a prerrogativa do sacrifício humano pertencia às religiões. Os que têm descendência bíblica acabaram com essa crueldade quando o Deus bíblico não permitiu que Abraão sacrificasse Isaac. Ele não precisava do sacrifício humano, embora judeus e cristãos depois tenham sacrificado multidões ao longo dos séculos. Mas, Astecas, Incas e outras tradições religiosas sacrificaram pessoas enquanto seus impérios duraram.

Hoje, a prerrogativa do sacrifício humano pertence ao capital. Ele decide quem deve morrer. E quem morre são indígenas, quilombolas, comunidades tradicionais e o meio ambiente.

Se quisermos manter um pingo de dignidade humana, devemos nos afastar não só da direita, mas também das esquerdas que aceitam o sacrifício humano em nome do desenvolvimento, da revolução, ou de qualquer outra causa onde a vida humana seja o combustível.

Na luta contra as mudanças no Código Florestal, Belo Monte, Transposição; enfim, contra o modelo predador imposto, podemos identificar perfeitamente quem é quem no Brasil de hoje.

Fonte: Adital
http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=58393

quinta-feira, 14 de julho de 2011

É preciso defender a vida!

É preciso que aprendamos a nos proteger. Não de um mal difuso, forças ocultas, poderes dispersos. Precisamos nos proteger das ações humanas; das consequências públicas de ações que simplesmente deconsideram seus efeitos sobre aqueles que estão à sua volta.

É o caso da mineração predatória. Uma atividade que faz de nós invisíveis sociais e que se nega a reconhecer nossa dignidade. A exploração dos recursos naturais e do trabalho humano assumiu em nosso tempo uma dimensão trágica e ameaçadora: ameaça a vida das atuais e futuras gerações. Esses recursos não podem mais ser pensados apenas associados ao funcionamento da indústria de mineração. É preciso que se leve a sério a questão política e social que envolve a atividade de exploração sem limites em que estamos sendo enredados. Para isso, é preciso que promovamos uma mudança do modelo de desenvolvimento, uma mudança profunda dos paradigmas que orientam nossas ações cotidianas, uma revisão de valores como justiça, liberdade e equilíbrio. Todos os valores devem ser voltados para a valorização da dignidade humana.

A hegemonia de valores como a competitividade, desenvolvimento econômico e crescimento a todo custo nos levou à silenciosa tragédia que ameaça tomar conta de toda Minas Gerais.

É preciso que as pessoas se defendam dos "decretos expropriatórios" que permitem ao governo-minerador declarar a disponibilidade de toda uma paisagem cultural e de comunidades inteiras para fins de "investimento" e "geração de empregos", inclusive dentro dos perímetros urbanos. O critério do governo-minerador, na verdade, é apenas um: deixar explorar jazidas economicamente viáveis economicamente, onde quer que elas estejam. Não contam as pessoas, não contam as cidades, não contam o patrimônio paisagístico e cultural, não conta a memória. O governo-minerador decide se nosso quintal pode ser transformado em depósito de rejeito de mineração. A nós cabe o lixo ("rejeito"), que é economicamente inviável, os desumanos custos da exploração de matéria-prima para engordar ainda mais o insaciável dragão da mineração.

"Protocolos" com as mineradoras são assinados diretamente nos palácios de governo. Do mapa de Minas são varridas as pessoas, seus lares e sua história. Confiram os mapas do DNPM. Você não está lá, sua casa não está lá, sua cidade não está lá. Aquela trilha, aquela caverna, aquela cachoeira ou córrego onde você passou sua infância, onde você descansa com sua família, pra onde você foge quando precisa reencontrar sua humanidade e seu passado, nada disso está no mapa. Nada disso existe. Somente jazidas.

O legalismo garante a exploração: "tudo está sendo feito rigorosamente nos termos da lei", afirmam mineradoras e governo. A apropriação de tudo que é bem comum - da água, da terra, das montanhas, da vida e saúde humanas - simplemente acontece, e se "legitima" como que por encanto. Se desejam realizar uma pesquisa mineral no Pico do Itacolomi, o fazem. Se querem o ouro de Paracatu, o tiram. Se querem uma Casa de Pedra maior em Congonhas, que venha abaixo o Santuário de Bom Jesus de Matosinhos. E assim o Caraça, as águas do Gandarela. Serra Azul, Serra da Moeda, Serra da Piedade, todas as serras.

Em todo lugar uma mina: afinal, "minas, são muitas". Tantas que já não há mais lugar para gente. A famosa frase de Guimarães Rosa assume, hoje, ares de trágica premonição.

O poder minerador se tornou maior que as instâncias políticas responsáveis pela defesa dos direitos das pessoas. Um Estado dentro do Estado. É em nome de lucro e crescimento que falam e agem. Em nome dessa crença, desta religião, se autorizam a intervir até na geografia de Minas Gerais. Favelização, sobrecarga das estruturas urbanas, degradação ambiental, desertificação, esgotamento de nossos recursos hídricos.

A questão é também de ordem ética: a mineração age hoje desvinculada de quaisquer valores sociais e humanísticos de uma nova era de responsabilidade, de consciência quanto às consequências coletivas de nossas ações. Claro que não é o que os discursos das mineradoras dizem. Vejam a publicidade. Só os ingênuos acreditam.

É preciso agir. Boa parte daqueles que elegemos para defender nossos direitos estão nos traindo. Não nos enxergam do alto dos ombros dos gigantes nos quais estão montados (ou será o contrário?). Por isso, informe-se! Comprometa-se! Venha defender a qualidade de vida para você, para os seus e para as futuras gerações. Diga não à mineração em área urbana. Posicione-se a favor de uma definição participativa e democrática de marcos regulatórios para a mineração. Juntos, não temos como ser ignorados.

Texto reproduzido a partir do blog Mariana Viva.
http://marianaviva.blogspot.com/

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Minha alma é cerrado

Aconselham-me a tomar produtivos aqueles campos inúteis. Disseram-me que o cerrado deveria ser queimado, para no seu lugar fazer crescer uma mata de pinus eliotis. Explicaram-me que este pinus cresce muito rápido e que, em poucos anos, as árvores poderiam ser cortadas e transformadas em bom lucro. Andei por uma mata de pinus eliotis. Senti medo. Escura. O silêncio é total. nenhum pio de pássaro. Eles não vão lá. Acho que também têm medo. O chão é coberto por uma compacta camada de folhas secas, tão compacta que ali não cresce nem tiririca. E fiquei pensando nas tortas e rugosas árvores do cerrado, e na vida que nelas mora. Pensei no destino das guabirobeiras, das flores silvestres, das abelhas... E conclui que minha alma é cerrado, mas não é uma mata de pinus eliotis.

Aconselharam-me, também a queimar os campos para neles plantar feijão. "Feijão dá bom dinheiro", argumentaram. Mas, antes de fazer isso, tive de ter uma conversa com as florzinhas quase invisíveis, os pequenos insetos, os passarinhos, as aranhas e suas teias. E não tive coragem. Minha alma é um campo, tal como saiu do ventre da mãe natureza, mas não é uma plantação rendosa. Fazer o que me aconselhavam era transformar uma grande e divina sinfonia na monotonia de um samba de uma nota só ... "não só de pão viverá o homem", dizem os textos sagrados. Precisamos de beleza, precisamos de mistério, precisamos do místico sentimento de harmonia com a natureza de onde nascemos e para qual voltaremos.

Enquanto depender de mim, os campos ficarão lá. Enquanto depender de mim, os cerrados ficarão lá. Porque tenho medo de que, se eles forem destruídos, a minha alma também o será. Ficarei como as florestas de pinus, úteis e mortas. Ficarei como as plantações rendosas, úteis e vazias de mistérios. E me perguntei se não é isto que o progresso e a educação estão fazendo com as nossas almas: transformando a beleza selvagem que mora em nós na monótona utilidade das monoculturas. Não é de admirar que, de mãos dadas com a riqueza, vá caminhando também a incurável tristeza.

RUBEM ALVES

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Viva no espaço do seu Deus

É nos momentos difíceis que você se esquece de Deus, ou até mesmo se volta contra Ele. Então, entrega-se à fadiga, ao desânimo e à desesperança. É quando a vida fica mais difícil que você frequentemente se esquece de Quem É, e dos meios que Deus lhe deu para criar a vida que desejaria. Justamente na hora do teste difícil, quando tem a chance de provar Quem É, afasta-se da fonte de todo poder.

Porém, quando tudo parece sem solução seria, mais do que nunca, hora de ir para o espaço do seu Deus. Isso lhe proporcionaria grande paz de espírito – de onde poderiam surgir grandes idéias, que poderiam ser soluções para os seus maiores problemas. Mais ainda, é somente no espaço do seu Deus que você se realiza, e esse é o único objetivo da sua alma.

Ao abrigar-se no espaço do seu Deus, você verá com extrema lucidez que tudo o que experimenta agora é transitório, mas que você não o é, você é eterno. Ao definir as condições e circunstâncias como temporais e transitórias, você poderá usá-las como meios temporais e transitórios na criação da sua experiência atual.

Então, diante da sua experiência atual – perda, conflito, doença... – é hora de se perguntar: Quem você pensa que é? E Deus, Quem Ele é? Seu problema é difícil demais para Deus resolver? É grande demais para Ele?

Mas você fica em dúvida, sem saber qual é o desejo de Deus em relação a você. Você pensa que a solução do seu problema depende do desejo de Deus; a verdade, porém, é que depende do seu. Ora, Deus lhe deseja nada mais nada menos aquilo que você deseja. Ele não julga os seus pedidos, para decidir se devem ou não ser atendidos. A lei divina é de Causa e Efeito, não de Veremos. Você pode ter tudo que escolher, e Deus lhe dará mesmo antes de pedir.

No entanto, para o bem ou para o mal, você sempre tem aquilo que cria, e a todo momento está criando. Deus não impede e nem julga aquilo que você cria, simplesmente lhe dá o poder de criar mais. Está aí o seu livre arbítrio. Se você não gostar do que acabou de criar, escolha novamente; o compromisso de Deus é lhe dar essa oportunidade.

Não se lamente se nem sempre teve o que quis, porque você constantemente teve o que escolheu. Sua vida é o resultado de seus pensamentos em relação a ela, e das escolhas que faz a cada instante. Por isso, nunca se julgue vítima da situação ou dos outros. Em relação à sua experiência atual, se está infeliz com ela, reflita sobre os seus pensamentos criativos, suas fantasias, suas palavras e atitudes; então, compreenderá o seu poder, o poder que Deus lhe deu de criar continuamente. Entenderá que a sua vida resulta das suas intenções em relação a ela.

Tudo que Deus concebeu é perfeito, criado à Sua imagem e semelhança. Você é perfeito, porque Quem o criou não criaria algo imperfeito.

Portanto, se até agora escolheu o pensamento menos importante, a idéia mais insignificante, o pior conceito sobre si mesmo, observe o que tem escolhido e escolha novamente. Escolha o pensamento mais elevado, a idéia mais magnífica e o melhor conceito sobre Quem Você É e Quem Você Quer Ser. Escolha e permaneça no espaço do seu Deus e todos os eventos se tornarão bênçãos.

Texto extraído e modificado do livro Conversando com Deus, de Neale Donald Walsch, vol. I, Agir, 2008.

domingo, 3 de abril de 2011

A vida é uma criação, não uma descoberta

Você não vive cada dia para descobrir o que ela lhe trará, mas sim para criá-lo. Cria a sua realidade a cada minuto, provavelmente sem saber.
Eis porque é assim, e como funciona.

1. Deus o criou à Sua imagem e semelhança.

2. Deus é o criador.

3. Você é três-em-um. Pode dar a esses três aspectos do ser o nome que quiser: Pai, Filho e Espírito Santo; mente corpo e espírito; superconsciente, consciente e subconsciente.

4. A criação é um processo que se origina dessas três partes suas. Em outras palavras, você cria em três níveis. Os instrumentos de criação são: pensamento, palavra e ato.

5. Toda criação começa com um pensamento (“Origina-se do Pai”). Toda criação então passa para a palavra (“Peças e serás atendido”). Toda criação é realizada com um ato (“E o verbo se fez carne e habitou entre nós”).

6. Aquilo que você pensa, mas nunca expressa em palavras, cria em um nível. Aquilo que você pensa e expressa em palavras cria em outro nível. Aquilo que você pensa, fala e faz torna-se evidente em sua realidade.

7. Pensar, falar e fazer algo em que você realmente não acredita é impossível. Por isso, o processo de criação deve incluir crença ou conhecimento. Isso é fé absoluta. È saber com certeza (“Pela tua fé serás curado”). Portanto, a parte ativa da criação sempre inclui o conhecimento. È uma clareza total, uma certeza absoluta, uma aceitação da realidade de algo.

8. Esse ponto de conhecimento é de intensa e incrível gratidão. É uma gratidão antecipada. E talvez seja a mais importante para a criação: ser grato antecipadamente por ela. Tê-la como certeza não só é justificado, como também incentivado. É o sinal claro da mestria. Todos os mestres sabem antecipadamente que o ato foi realizado.

9. Aprecie e louve tudo que você cria e já criou. Rejeitar qualquer parte da criação é rejeitar uma parte de si mesmo. Seja o que for que estiver agora se apresentando como parte de sua criação, deve ser reconhecido e louvado. Sinta gratidão pelo que criou. Não o condene (“Maldito seja!”), porque isso seria condenar a si próprio.

10. Se houver algum aspecto da criação de que você não gosta, louve-o e simplesmente mude-o. Escolha novamente. Faça surgir uma nova realidade. Tenha um novo pensamento. Diga uma nova palavra. Faça uma escolha nova. Faça-a magnificamente e o restante do mundo o seguirá. Peça isso. Diga: “Eu sou a Vida e o Caminho, sigam-me.”

É dessa forma que se manifesta a vontade do Deus “na Terra como no Céu”.

Extraído de: WALSCH, Neale Donald. Conversando com Deus, livro 1. Rio de Janeiro: Agir, 2008, p. 111-112.

domingo, 27 de março de 2011

Agronegócios com Agrotóxicos: produzir a qualquer custo?

Olá, caros amigos do cerrado, onde se produz soja e outros grãos em abundância, para engordar porco na China e alimentar vacas leiteiras na Europa: é bom dar uma espiada nos links abaixo!

Primeiro, temos uma entrevista com a pesquisadora Danielly Palma, que descobriu veneno no leite materno em 62 mães, na cidade de Lucas do Rio Verde - MT. Trata-se de um achado assustador do impacto dos agrotóxicos na saúde humana. Para ler a entrevista de Danielly, CLIQUE AQUI.

Outra entrevista importante é de Raquel Rigotto, professora e pesquisadora do Departamento de Saúde Comunitária da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará. Coordenadora do Núcleo Tramas – Trabalho, Meio Ambiente e Saúde, Raquel contesta o modelo de desenvolvimento agrícola adotado pelo Brasil e prevê que para as populações locais restará a “herança maldita” do agronegócio: doenças e terra degradada. Para ler a entrevista CLIQUE AQUI.

Angra 2: Usina de confusões

Governo demite toda a diretoria da CNEN após descobrir que reatores atômicos operam sem licenças e que Angra 2 não tem autorização definitiva para operar.
Por: Claudio Dantas Sequeira

Há exatamente uma semana chegou à mesa do ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio Mercadante, um relatório explosivo contra membros da cúpula do programa nuclear brasileiro.

Com base nas denúncias do documento assinado pelas associações de servidores dos principais órgãos ligados ao programa (a CNEN e o IPEN), Mercadante pediu uma imediata investigação interna. Em poucos dias convenceu-se de que a situação era, de fato, grave e decidiu agir.

A primeira medida será a demissão do presidente da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), Odair Dias Gonçalves, e de toda a direção do órgão. Gonçalves é responsabilizado, dentre outras coisas, pelo atraso no licenciamento da usina de Caitité que paralisou a extração de urânio e obrigou o Brasil a comprar 220 toneladas do minério no Exterior, ao custo de R$ 40 milhões.

Para Mercadante, trata-se de um constrangimento, já que o País detém uma das maiores reservas de urânio do mundo. Caetité, no entanto, é apenas a ponta de um enrolado novelo que se tornou o programa nuclear. Mercadante ficou chocado ao saber que quatro reatores nucleares utilizados para pesquisa funcionam sem licença em três campi universitários.

Acima, Imagem de Angra 2

O processo de certificação desses reatores foi engavetado pelo presidente da CNEN e por seu diretor de Radioproteção e Segurança Nuclear, Laércio Vinhas. "Dá muito trabalho e os reatores estão muito bem", teria dito Odair Gonçalves, segundo relato de funcionários. Gonçalves nega. "Nosso pessoal está sobrecarregado", justifica.

Mas a gota d'água, para Mercadante, foi saber que Angra 2 opera há mais de uma década sem a "autorização de operação permanente". Além das questões técnicas, há críticas sobre o suposto excesso de viagens internacionais de Gonçalves e de nomeações de amigos para cargos de chefia. Seria o caso da física Maria Cristina Lourenço, que chefia a área internacional da CNEN e acompanhou Gonçalves em 11 das 14 viagens que ele fez em 2010. Odair Dias Gonçalves está à frente da CNEN desde 2003.

Nesse período, entrou em choque com autoridades do setor e com o corpo de fiscais nucleares. Nem o Itamaraty o tolera e pouco fez em defesa de sua candidatura para cargos na Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Foram três tentativas frustradas em 2010. "É um caso raro de unanimidade às avessas", afirma um assessor de Mercadante.

No final do ano passado, Gonçalves filiou-se ao PT. Mas nega interesse na carreira política.

Obtido em: http://www.istoe.com.br/reportagens/130253_USINA+DE+CONFUSOES

Palavras-chave: energia nuclear; Angra 2; CNEN; Eletronuclear.

sábado, 19 de março de 2011

Paracatu versus Kinross diante da lei

Na audiência pública realizada em Paracatu em 17/03/2011, convocada pela Assembléia Legislativa de MG, entreguei à mesa diretora uma manifestação em que questionei a legalidade do empreendimento da Kinross, que opera a mina de ouro à céu aberto junto à zona urbana desta cidade. Passo aos leitores do blog o texto dessa manifestação.


"Quando a RPM implantou seu empreendimento em Paracatu ela foi recebida de braços abertos, com raras contestações, nenhuma delas baseada em perigos ambientais. Isto aconteceu porque a empresa, nos seus processos de licenciamento e na sua comunicação social, escondeu os perigos do empreendimento.

Os órgãos licenciadores não questionaram o projeto, o que seria um dever. Pior ainda, à empresa foi concedido o auto-monitoramento, que nunca foi acompanhado por quem tinha a obrigação de fiscalizar. Prova disso é que os relatórios da Rio Tinto, divulgados abertamente em 2004, apontavam índices elevados de cianeto e arsênio na poeira fugitiva da mina do Morro do Ouro, e esse fato foi ignorado pelos órgãos licenciadores.

As relações da empresa com a sociedade paracatuense começaram a se desgastar a partir de 2007, com a denúncia de ativistas ambientais de Paracatu da gigantesca mobilização de arsênio e metais pesados no minério beneficiado, com o agravante de a empresa negar este fato.

Sempre que se fala no arsênio a empresa se cala. Ela negou, em Audiência Pública, a presença do arsênio na poeira da mina; omitiu o risco do arsênio nos processos de licenciamento e não fez avaliação de risco da mobilização do arsênio na lavra e no beneficiamento do minério.

A empresa sempre afirma que cumpre a lei, e também fazem coro a esta afirmação o Ministério Público e até mesmo alguns ativistas ambientais. Quem se disponha a fazer uma leitura completa dos processos de licenciamento ambiental da Rio Paracatu Mineração, desde quando pertencia à Rio Tinto Brasil, vai constatar a omissão do arsênio como fator de risco e a omissão de qualquer referência ao gerenciamento ambiental desse perigoso elemento. Este fato, quando examinado à luz das exigências legais, que impõem ao empreendedor informar todos os elementos de risco ambiental, demonstra que a empresa deixou de cumprir a lei desde antes de iniciar suas operações. E se ela obteve a chancela do órgão fiscalizador, que aceitou o Estudo de Impacto Ambiental sem se deter na sua análise, só nos prova a fragilidade dos processos de licenciamento, e não o cumprimento da lei.

A omissão, no licenciamento, da mobilização do arsênio, inclusive com a geração de óxidos de arsênio, produto altamente tóxico, foi intencional. Se apontado o problema e realizada uma avaliação de risco, o empreendimento da Kinross poderia ser considerado inviável ambientalmente, pelo perigo de contaminação da região de Paracatu e da Bacia do Rio São Francisco.

Toda atividade humana gera risco em algum grau. Não existe vida sem risco. A questão, quando um empreendimento gera risco de alto grau para uma sociedade é saber se o risco é aceitável. Saber se o risco é aceitável não na visão do empreendedor, mas na visão das pessoas atingidas pelo empreendimento. Para isto, é necessário que as pessoas tenham consciência do risco, que os debates sejam abertos e as informações transparentes; então, a sociedade poderá dizer se aceita ou não esse risco. Para este fim foi criado o instrumento da Audiência Pública.

Que seja bem claro que não estamos falando, no caso da Kinross, de incertezas sobre a existência de riscos, mas de riscos reais, que podem levar à morte prematura e à degeneração da qualidade de vida. Um risco ambientalmente e moralmente inaceitável, imposto à população, que sequer tinha conhecimento dele.

No meu entender, as ações que deveriam ser efetivadas para garantir a vida e a qualidade de vida da população seriam (1) a revisão dos processos de licenciamento do empreendimento da Kinross, porque são viciados de origem, e (2) a realização de avaliação de risco ambiental por instituição pública competente, para que sejam definidas ações posteriores baseadas na precaução e na prevenção."

Palavras-chave: Paracatu; Kinross; arsênio; ouro; meio ambiente; licenciamento.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Paracatu: audiência pública para discutir o impacto ambiental da Kinross

Na quinta-feira (17 de março de 2011), a Comissão de Assuntos Municipais e Regionalização da Assembléia Legislativa de MG esteve em Paracatu para realizar audiência pública sobre o impacto ambiental da mineração de ouro a céu aberto. A seguir, tecerei algumas observações sobre esse evento.

A primeira observação é sobre o modelo de audiência pública que teima em repetir o modelo social excludente. A audiência, marcada para as 13 horas, iniciou-se às 13:20, uma boa pontualidade para quem conhece os hábitos da cidade. Foi aberta e presidida pelo deputado estadual Almir Paraca, um político de raiz paracatuense. A mesa não cabia de tantas autoridades do executivo, legislativo, judiciário, mineradora Kinross, clero e dois representantes do ativismo ambiental; além desses, um plenário com outras tantas autoridades. O público era bem diversificado, muitas pessoas idosas, grupos oriundos dos bairros periféricos à mina, profissionais liberais, comerciários e um bom número de funcionários uniformizados da Kinross.

As autoridades da mesa discursaram durante umas 3 horas, e houve boas falas, é preciso que se diga. Só após os pronunciamentos das autoridades da mesa o presidente da audiência abriu a palavra às autoridades do plenário, que falariam intercaladamente com o tal “público”, ao qual foi concedido um tempo de 3 minutos por orador inscrito. Naquele momento, a metade do público já se cansara e fora embora. Com a metade das cadeiras vazias, 3 minutos bastam para você falar como aquele saudoso candidato: - Meu nome é Enéias!

Vamos raciocinar, caro leitor: uma “audiência” é um instrumento para ouvir; se é pública, é para ouvir o público. Poderíamos presumir, então, que as autoridades lá estariam para ouvir o público? Se o seu raciocínio é este, tal não é o das elites, que mais não querem senão perpetuar a relação de poder que exclui a população dos processos de consulta e de tomada de decisão.

Aponto a contradição de alguns oradores da mesa, mas não vou citar nomes. Um deles associou o crescimento econômico de Paracatu às mineradoras, principalmente à Kinross, discorreu longamente sobre a necessidade de a população se preparar para o fechamento da mina e coisas como desenvolvimento sustentável (tem um grupo que jura ser possível conciliar sustentabiliade com agressão ambiental!). Portanto, o mesmo discurso que a Kinross vem repetindo há muitos anos, ignorando o papel sócio-econômico dos trabalhadores e de centenas de empreendedores rurais e urbanos que sustentam, promovem e distribuem riqueza no município. Porém, contradizendo tudo isso, a seguir o orador mostrou a insignificância do valor dos impostos pagos pelas mineradoras, fixados em 0,67% do lucro líquido. Uma ninharia de 6,5 milhões de reais nos cofres da municipalidade diante de quase 1 bilhão de reais de ouro produzido por ano, um ativo financeiro que é exportado sem cobrança de taxa de exportação. Elas por elas, temos aí a insustentabilidade do discurso quando não se tem um posicionamento firme diante de um conflito.

(Caro leitor: o imposto das mineradoras corresponde apenas a 4,6% da receita municipal; portanto, o impacto econômico da perda dessa receita seria mínimo, mas o impacto ambiental positivo do fechamento desses empreendimentos geradores de riscos de alto grau seria enorme.)

Outra coisa que me incomodou foi a afirmação, repetida várias vezes por outro orador da mesa, de que a Kinross cumpre a lei ambiental e que a sua gestão ambiental interna, isto é, dentro dos limites da área destinada à lavra, beneficiamento e depósito de rejeitos, é exemplar. Essa questão da legalidade dá mais o que falar; portanto, vou tratá-la no texto "Paracatu versus Kinross diante da lei". No restante, o discurso desse orador foi ótimo, esclarecedor. Para contestá-lo naquilo que discordo, só vou dizer que são os trabalhadores da Kinross que mais sofrem os efeitos da poluição química do ambiente. Eles estão de corpo e alma no foco de onde se irradia o cianeto, a drenagem ácida de metais pesados e o arsênio. Ou será que deveremos nos esconder dessas pestilências indo para dentro da área da mina?

Ao encerrar, destacarei os pronunciamentos das pessoas do público, nos escassos 3 minutos a que tinham direito. Não desmerecendo os demais, assinalo os nomes de Geraldo Júnior, Ranulfo e Dr. Romualdo. Parabéns, vocês foram brilhantes em defender os interesses da população de Paracatu!

Palavras-chave: impacto ambiental; meio ambiente; mineração; paracatu; Kinross; arsênio; audiência pública; ouro.

Ministério Público e Kinross assinam compromisso

O Ministério Público de MG convocou a população de Paracatu para uma Audiência Pública no dia 3 de março, onde apresentou um termo de compromisso firmado com a mineradora Kinross, relativo aos impactos ambientais decorrentes da expansão da mina Morro do Ouro. No entender do MPMG, esse termo "representa um novo paradigma de atuação do Ministério Público em relação aos empreendimentos minerários, pois foram
acordadas obrigações inéditas, que representam um grande avanço na solução consensual de algumas questões ambientais.

Tive oportunidade de falar naquela audiência, expondo meu desacordo com os termos ajustados, como o leitor poderá ver a seguir.

Em primeiro lugar, discordo da maneira como esse acordo foi conduzido, sem a participação da sociedade paracatuense e especificamente das populações mais atingidas; não foi um processo aberto, mas centralizador e autoritário, que expressa a relação de poder que existe na sociedade brasileira.

Em segundo lugar, também discordo do conteúdo do acordo, pelos motivos que a seguir vou expor.

1. Medidas ambientais

1.1. No acordo, a empresa reafirma o compromisso legal de não realizar qualquer atividade de extração mineral, sem o devido processo de licenciamento ambiental, e atualizará continuamente o MPMG quanto à situação das reservas legais de todos os imóveis de sua propriedade.
1.2. A empresa também confirma sua obrigação de somente adquirir insumos minerais e vegetais de fornecedores licenciados, como já vinha fazendo, sendo que os materiais devem ser acompanhados de certificado de origem e da documentação necessária para comprovar que foram extraídos e comercializados em conformidade com a legislação ambiental.

Os tópicos acima nada acrescentam à realidade, pois, como eles mesmos afirmam, referem-se a determinações legais que não precisam de acordo para serem cumpridas, e ademais afirma que a empresa já as cumpre. Ou então, se o Ajuste de Conduta é necessário, é porque a empresa não as cumpre. Por outro lado, a lei é Magna, não depende de acordos para que se cumpra.

2. Medidas mitigadoras

2.1. A Kinross irá custear projeto de rede otimizada de monitoramento da qualidade do ar, inclusive das partículas inaláveis finas e grossas, com a disponibilização dos dados ao órgão ambiental, de forma on-line e em tempo real.

O acordo apresenta rede de monitoramento como 'medida mitigadora', quando o conceito de mitigação é outro. Monitoramento jamais pode ser classificado como medida mitigadora.

Medidas mitigadoras seriam diminuir a poeira fugitiva da mina, as detonações, o consumo de água; seria substituir a tecnologia com uso de cianeto por outra menos agressiva ao ambiente; seria não soterrar com lama tóxica o Córrego Machadinho; seria não lançar arsênio na barragem de rejeitos; medida mitigadora seria estocar, em local seguro e bem distante da zona urbana, o arsênio recuperado no beneficiamento; seria melhorar o gerenciamento dos lagos de drenagem ácida, pois eles são pessimamente gerenciados; seria também agir com transparência acerca dos riscos ao invés de escondê-los, envolvendo a comunidade no enfrentamento do risco etc. Isto seria mitigar!

Monitoramento é apenas uma ferramenta de controle de gestão; neste caso, o que vale monitorar se não há uma gestão integrada de risco? E, mesmo que houvesse, o que valeria monitorar apenas um parâmetro – a poeira fugitiva da mina? E os outros parâmetros, talvez ainda mais importantes, e que deveriam ser do conhecimento da comunidade paracatuense: os efluentes da usina de tratamento, a água e os sedimentos à jusante da barragem, a água dos poços do entorno, a infiltração da drenagem ácida na área da lavra, a saúde dos trabalhadores da mina e das pessoas do entorno da mina tendo em vista a possibilidade de contaminação...?

Por que o acordo MPMG/Kinross não se refere explicitamente ao problema do estoque de arsênio? A população continuará sem saber em que quantidade ele foi até agora gerado, que quantidade foi para a barragem, que quantidade foi estocada na mina, em que locais e como é estocado, quais as medidas de segurança em caso de acidente e, principalmente, qual o destino do arsênio no fechamento da mina. É isto que apavora a cidade!

Existem três formas de se posicionar frente a um problema: reconhecer o problema; negar o problema e desqualificar o problema. A Kinross já negou o problema do arsênio; não podendo continuar a negá-lo, passou a desqualificá-lo como risco. Essa desqualificação está bem à mostra neste TAC: um probleminha na poeira da mina, basta monitorá-la... Quando é que vamos reconhecer o problema do arsênio e tratá-lo como risco de alta periculosidade? Quando é que teremos uma gestão integrada de risco?


2.2. Além disso, foi ratificada a obrigação legal, prevista no licenciamento ambiental da empresa, de elaboração de um detalhado Projeto de Recuperação de Área Degradada (Prad), de um Plano de Fechamento da Mina (Pafen) e de desativação das barragens, integrados com um projeto de reabilitação das áreas mineradas e impactadas. A reabilitação ambiental deverá ser executada ao longo da vida do empreendimento, de forma a garantir à área impactada uma condição estável, produtiva e autossustentável, com foco no uso futuro.

Passaram-se 23 anos desde que se iniciou o empreendimento da Kinross. Teremos mais 27 anos de atividade, aproximadamente, até que se esgotem as reservas. Portanto, numa história que começou em 1987, estamos quase na metade da vida total do empreendimento. A história desses 23 anos estabelece o prognóstico que teremos para o restante dos anos. A reabilitação ambiental não foi executada ao longo da vida do empreendimento conforme a obrigação legal ratificada pela empresa. Ela está ratificando fazer uma coisa que nunca fez. Precisamos de respostas honestas para as seguintes questões:
- O que aconteceu com os impactos ambientais ao longo desses anos? A área impactada ficou em condição estável?
- Como se pode falar em condição estável da área impactada se bilhões de toneladas de minério ainda serão retiradas e processadas?
- O empreendimento da Kinross pode garantir que a área impactada seja produtiva e autossustentável, com foco no futuro?
Isto soa aos nossos ouvidos como a repetição da falácia do “desenvolvimento sustentável”, que não passa de um jargão para disfarçar uma política agressiva ao ambiente.


2.3. Para assegurar a recuperação da área, a Kinross apresentará uma garantia financeira, por meio de aportes anuais (em depósito, aplicação bancária ou carta de crédito), no valor de 01 (um) milhão de reais cada, durante todo o período de exploração mineral.

A primeira observação é que a empresa deveria ter feito os aportes financeiros para a recuperação da área ao longo de todo o empreendimento. Observe-se que o empreendimento previa uma vida útil da mina de 15 anos, implicando-se que a mina já estaria desativada. O Plano de Expansão ampliou a vida útil da mina em 30 anos.

Pergunta-se:
- De 1987 até hoje, qual foi o aporte financeiro da empresa para garantir a recuperação da área degradada, uma vez que esse aporte não é feito ao final, mas ao longo da vida da mina?
Obrigando-se a empresa a fazer um aporte financeiro de 1 milhão de reais por ano, teremos, daqui a 27 anos, 27 milhões de reais. Então:
- A promotoria considera este valor adequado para a recuperação da área degradada, tendo em conta que o volume de minério a ser extraído será muitas vezes superior ao que foi retirado até agora? Que uma enorme cava, muitas vezes superior à que vemos agora ainda será aprofundada?
- Levou em conta que recuperação da degradação ambiental não implica em recuperar apenas a área lavrada e os depósitos de rejeito, onde temos destruição de vegetação, destruição e contaminação de nascentes de água, soterramento de vales, mas principalmente os recursos sócio-ambientais do entorno da mina?


2.4. O acordo também solidifica a adoção de várias medidas já tomadas pela Kinross para garantir a integridade da barragem de rejeitos, inclusive com a apresentação de um Plano de Ações Emergenciais (PAE), mapas de inundação, ações preventivas, protocolos a serem seguidos em caso de acidente, obras de emergência, sistemas de comunicação, acesso aos locais, estoques de materiais e suprimentos, definição de grupos de trabalho e de responsabilidades.

A primeira barragem da RPM/Kinross foi elevada muito acima do projeto original, apresentado no primeiro processo de licenciamento, potencializando assim os riscos daquela obra. Portanto, o acordo não solidifica medidas já tomadas pela Kinross para garantir a integridade das barragens. Então, é importante saber:
1. Existem garantias de que a elevação da nova barragem de rejeitos, a qual represará um volume muito maior de material tóxico, obedecerá a projeto seguro e aprovado por órgãos competentes, ou poderá a empresa refazê-lo, aumentando a cota da barragem para atender seus estritos interesses?
2. Foi contratado seguro das duas barragens que inclua a vida e os recursos sociais e econômicos da população à jusante? Em caso positivo, qual o valor atribuído no seguro aos danos econômicos e à vida das pessoas em caso de acidente? Qual é a valoração que se dá à vida dessas pessoas?


3. Medidas compensatórias

3.1. A empresa vai custear integralmente a realização de estudo epidemiológico/ambiental, para avaliar os índices de arsênio na área de influência direta do empreendimento, a ser conduzido por instituição autonôma.

Este é um ponto positivo, conquista do TMMG. Porém, o estudo epidemiológico, embora seja fundamental e tenha que ser bancado pelo ‘criador do risco’ e não pelos cofres públicos, não pode ser classificado como medida compensatória. Custeado pelo criador do risco, ele é uma medida justa, mas é uma avaliação e um monitoramento e não compensa as populações atingidas pelos impactos, especialmente aquelas dos bairros pobres da periferia, que, ao final, pagarão a conta com suas vidas.

3.2. Além disso, a título de compensação ambiental, a Kinross investirá R$ 12 milhões em projetos de relevância ambiental na Bacia do Rio São Francisco e/ou na implantação e manutenção de Unidade de Conservação de Proteção Integral no Município de Paracatu.

Vemos aqui que o MPMG e a Kinross estabeleceram 12 milhões de reais como valor para compensar os danos sócio-ambientais que serão causados a Paracatu, deixando de lado os que já foram causados. Como se chegou a esse número mágico sem permitir à população, aqueles que sofreram os danos, se posicionassem nas negociações?

Quais os critérios de valoração utilizados para se chegar a 12 milhões de reais? Foram considerados os danos ambientais, como a destruição de nascentes, o impedimento do acesso à água para o abastecimento da cidade? A contaminação da água, do solo e do ar? A poluição sonora? A morte dos garimpeiros pelos seguranças da mineradora? A pressão sobre as pessoas, a destruição de valores culturais, a eliminação de comunidades, o esfacelamento das relações sociais? Foi considerada a destruição de valores estéticos, com a transformação do morro em buraco, uma enorme cratera na cara da cidade?

Podemos falar de riscos cuja materialidade encontra-se no mundo físico, químico ou biológico, que afetam os sistemas de suporte à vida, mas também podemos falar de riscos no mundo social, cultural e das relações.

Sim, como dizem os versos da letra musical ‘Comida’: “A gente não quer / Só dinheiro / A gente quer dinheiro / E felicidade. / A gente não quer / Só dinheiro / A gente quer inteiro / E não pela metade...
Entretanto, este acordo, ao estabelecer um valor tão distante das expectativas da sociedade, vem confirmar o ditado: “Pobre é barato”.

Por que a população desta cidade se sentiria compensada com um valor tão irrisório, ainda mais destinado a pesquisa ambiental na Bacia do São Francisco, que se estende além da Bahia e Pernambuco e vai até ao Atlântico? Por que, se a bomba explode ali no Morro do Ouro, nos bairros Alto da Colina e Amoreiras II, se a bomba explode sobre os humildes, na cara de Paracatu?

Este acordo – Termo de Ajuste de Conduta -, tal como foi negociado, sem a participação das comunidades atingidas, não colabora para que se faça justiça ambiental em Paracatu. Pelo contrário, serve de instrumento para a continuidade da exploração das riquezas da terra, produzindo injustiças ambientais e gerando riscos moralmente inaceitáveis. Prevalece o modelo ganhador/perdedor, onde o perdedor é a população de Paracatu.


Marcadores: paracatu; mineração; ministério publico; kinross; arsenio; ouro;

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Mineração e decadência

A mineração de ouro deixa um rastro de miséria e degradação ambiental. No primeiro ciclo do ouro brasileiro, inúmeros povoados e cidades se formaram e depois entraram em profunda decadência. Isto está no registro da história de Paracatu: quando escasseou o ouro, ficaram os pobres, alguns ricos que se apossaram das terras e uma leva de escravos velhos e doentes, abandonados à própria sorte. Outros ciclos ocorreram, com a introdução de máquinas e do mercúrio, aprofundando a miséria e a degradação ambiental.

Porém, caro leitor, estamos enfrentando o ciclo derradeiro, o mais terrível de todos, por conta da introdução de tecnologias de beneficiamento do minério com o uso de reagentes químicos nocivos, os quais liberam o arsênio e metais tóxicos contidos nas rochas, contaminando o ambiente para sempre e provocando danos irreversíveis à saúde humana. A destruição da paisagem, contaminação das águas, destruição de nascentes, o “inchaço” da cidade que trouxe um aumento absurdo das mazelas sociais (roubos, assaltos, agressões, prostituição de menores, a explosão de nascimentos de crianças sem pais...), e a poeira branca venenosa constituem, no seu conjunto, o efeito doloroso da expansão da mina sobre a cidade de Paracatu.

Ainda assim, por que a grande maioria da população não percebe os riscos e as agressões ambientais? Será que a demora se deve à legislação deficiente, que coloca o peso da prova dos prejuízos sobre os usuários ou nos órgãos reguladores governamentais, e não sobre os produtores? Certamente não se deve às incertezas científicas, porque é vasta a literatura científica sobre os perigos e os efeitos do cianureto, do arsênio e dos metais pesados para a saúde.

Acredito que há duas respostas para a não-percepção do risco. Primeiro, é que a grande maioria da população, pobre e sem acesso a informação, ignora o que acontece. Uma parte da minoria consciente dos problemas espera obter vantagens ou se locupleta na situação; raros são os que afrontam o problema. Segundo, isto é uma relação de poder, em que a mineradora e seus partidários têm a capacidade de impor uma decisão sobre os outros, para se apoderar dos recursos da terra, instalar empreendimento que contamina o meio ambiente, destruir e contaminar as fontes de água e ocupar espaços ambientais para despejar resíduos tóxicos; ainda mais, detêm poder junto aos poderes do Estado, nos níveis municipal, estadual e federal, para impor sua vontade sob cobertura legal.

Para as futuras gerações, porém, será muito tarde para decidir. Quando se trata de meio ambiente, as decisões do futuro são tomadas no presente.

Hoje uma imagem me assustou, porque antevi a semelhança de um enorme buraco que a mineradora Kinross está escavando junto à cidade de Paracatu, na área onde ainda corre o filete de água do Córrego Rico, ao lado do Arena Show.

A imagem que me chocou é da Serra do Gongo Soco, onde já existiu a mais famosa mina de ouro do Brasil - a Mina do Gongo Soco, cujo proprietário ganhou de Dom Pedro I o título de Barão de Catas Altas. Eu a conheci nos anos 80, quando fazia pesquisa mineral pela Mineração Morro Velho, pertencente à Anglo Gold, transnacional. Naquela época a serra era coberta por uma densa mata. Veja, caro leitor, no que a Serra do Gongo Soco se transformou:



Alguém vai me dizer que estou exagerando nesta antevisão apocalíptica, comparando a imagem acima com a área de lavra da mineradora Kinross. Mas para mim, que andei pela serra que a Vale do Rio Doce depois transformou em buraco, minha antevisão não é mera fantasia.

Para fundamentar esta afirmação tirei, hoje, uma foto da área de lavra da mineradora Kinross,com vista da estrada que segue para o povoado São Domingos. Veja a foto abaixo, faça uma comparação tendo em conta que o buraco da Kinross ainda vai se aprofundar e pasme com a semelhança, caro leitor!



Vou concluir com um poema, porque se diz que a poesia alivia os ares. Será?. Acho que não, nem sempre, mas ela dá o que pensar, se dá!


grama por grama
oitava por oitava
quilate por quilate

foi o que as Geraes
pagaram por suas riquezas
aos vorazes colonizadores.

hoje, muitos séculos depois,
Minas continua pagando
com a mesma moeda.

serra por serra
morro por morro
vale por vale.

do Morro do Gongo Soco surge
um enorme buraco de poeira.
do Pico do Itabirito aparece
um espantalho despido.
do Pico do Cauê,
o poeta itabirano
disse que restou
apenas tristeza e pó.


Aviso aos navegantes: o poema é de Mauro Lúcio de Paula, blogueiro Visite o Blog.

Este texto foi também publicado em: paracatu.net.

Marcadores: mineração; ouro; arsenio; cianureto; meio ambiente; degradação ambiental; mineração; conflito ambiental; paracatu; licenciamento; poluição ambiental; barragem de rejeito; risco ambiental

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Levanta, Luta e Vence

* Nicolai Cursino

“O que fazemos nesta vida, ecoa na eternidade” - Gladiador

“Eles podem tirar nossas vidas, mas não podem tirar nossa liberdade” - Coração Valente

“Haverá um dia onde a raça dos homens cairá e será destruída pela força das trevas, mas esse dia, não é hoje. Hoje é o dia em que nós lutamos, e vencemos”
Senhor do Anéis – O Retorno do Rei


A humanidade sempre recebeu mensagens de crescimento ao longo de sua história. Muitos mestres viveram e vivem entre nós oferecendo sua vida como exemplo àqueles que buscam um caminho maior. Jesus Cristo, Buda, Krishna, Krishnamurti, Yogananda, Chico Xavier, Martin Luter King, Gandhi, Mandela, Zumbi dos Palmares, Sócrates, e muitos, muitos outros, conhecidos e anônimos.

As mensagens estão em todos os lugares, como sempre estiveram. Na fala do filme que vai passar naquele canal que você quase nunca assiste. Em um verso da próxima canção que vai tocar no seu rádio. Em uma propaganda pintada no muro no caminho do seu trabalho, na camiseta do seu amigo, naquele livro parado na sua estante há muito tempo, esperando para ser lido.

Você está ouvindo? Está vendo? Pode sentir?

Ou está dormindo, como quando dirige para casa sem ao menos se dar conta do caminho? Ou na TV, no mesmo canal, no mesmo horário todos os dias, só por força do hábito?

É da natureza da vida, a luz e o crescimento. É da natureza da vida a realização, a felicidade e a prosperidade. É da natureza da vida que ela seja grande. E é da natureza da vida que nós, os seus filhos, tenhamos isso conosco. Assim como um filho se parece com seu pai e sua mãe.

Os grandes sucessos do cinema são histórias de superação, luta, perseverança e iluminação. A luta eterna da luz contra as trevas. Presente desde os desenhos da nossa infância. Todos nós sabemos disso.

E por que isso?

Porque essa é a nossa natureza. Nossa natureza é se superar. Nossa natureza é lutar. Nossa natureza é continuar, apesar de tudo. Nossa verdadeira natureza é se iluminar.

Não importa o que você aprendeu a pensar com seus pais ou em sua escola, que provavelmente só te ensinou a ser menos, a comparar seu boletim, a ser lógico, a decorar datas e nomes de minúsculos elementos das células. Não importa o que diz a sua religião, que as outras estão erradas, que há só um único caminho e que você deve seguir as regras ou será punido. Realmente não importa.

Nada disso pode mudar a sua natureza. Você pode se esquecer disso, negar, reprimir, mas você não pode mudar isso.

Sua natureza é lutar, crescer e inspirar.

Você está ouvindo isso? Está de olhos abertos? Pode sentir?

Talvez haja um dia onde você desista de cumprir o papel que te dá prazer no mundo. Que você desista da carreira que sonha, do lugar que quer morar, da viagem que quer fazer ou do negócio que quer construir.

Pode ser que um dia você seja derrotado. E desista mesmo.

Mas, esse dia, não é hoje.

Hoje você se levanta, luta e vence!

*Nicolai Cursino é consultor, treinador e palestrante em desenvolvimento humano e liderança, com foco no crescimento sustentável das pessoas e das empresas. Sua atuação abrange América Latina, Estados Unidos e Europa. É sócio-diretor da Iluminatta Brasil Desenvolvimento Humano. Visite o site.

Fonte: Jornal Carreira & Sucesso - 415ª Edição


Marcadores: coragem; luta; religião

domingo, 9 de janeiro de 2011

O voo da águia

A águia é a ave que possui a maior longevidade da espécie. Chega a viver 70 anos. Mas para chegar a essa idade, aos 40 anos ela tem que tomar uma séria e difícil decisão.


Aos 40 anos ela está com: as unhas compridas e flexíveis, não consegue mais agarrar as suas presas das quais se alimenta. O bico alongado e pontiagudo se curva. Apontando contra o peito estão as asas, envelhecidas e pesadas em função da grossura das penas, e voar já é tão difícil!

Então, a águia só tem duas alternativas: morrer... ou enfrentar um dolorido processo de renovação que irá durar 150 dias. Esse processo consiste em voar para o alto de uma montanha e se recolher em um ninho próximo a um paredão onde ela não necessite voar. Então, após encontrar esse lugar, a águia começa a bater com o bico em uma parede até conseguir arrancá-lo. Após arrancá-lo, espera nascer um novo bico, com o qual vai depois arrancar suas unhas. Quando as novas unhas começam a nascer, ela passa a arrancar as velhas penas E só após cinco meses sai para o famoso vôo de renovação e para viver então mais 30 anos.

Em nossa vida, muitas vezes, temos de nos resguardar por algum tempo e começar um processo de renovação.

Para que continuemos a voar um vôo de vitória, devemos nos desprender de lembranças, culpas, rancores, ansiedades, velhas maneiras de ver e tudo que nos apega às aflições. Somente livres do peso do passado, poderemos aproveitar o resultado valioso que uma renovação sempre traz.

Nota: Autor desconhecido

Marcadores: coragem; superação; religião;renovação; voar; águia.

sábado, 8 de janeiro de 2011

A FÓRMULA DE BASKHARA - HISTÓRIA DA MATEMÁTICA

Biólogos pensam que são químicos,
Químicos pensam que são físicos,
Físicos pensam que são deuses,
Deus pensa que é um matemático.
(Anônimo)


1. INTRODUÇÃO

O objetivo do presente trabalho é responder, através da História da Matemática, se a Fórmula de Bhaskara é ou não de Bhaskara.

A História da Matemática é um tema empolgante da História da Ciência e da História da Humanidade. Não existe quem, nos dias de hoje, não fique perplexo diante de pirâmides colossais e cálculos engenhosos realizados na Antiguidade, em cujas bases está a Matemática, a mesma ciência que hoje nos permite os avanços espetaculares nos campos da Física, Astronáutica, Astronomia, Medicina, Computação e toda a ciência humana.

O conhecimento matemático desenvolveu-se, nos primórdios da civilização, como resposta às necessidades práticas da sociedade humana e, na medida em que essa sociedade foi se tornando complexa, o cálculo matemático também avançou, mas com passos muito mais rápidos do que para a simples resposta a problemas práticos. Acompanhar esses passos permite compreender a origem das ideias que deram forma à nossa cultura, analisar os aspectos humanos do desenvolvimento da Matemática e conhecer os gênios fantásticos que criaram essas idéias.

Outro aspecto importante é que, através da história, podem-se estabelecer relações entre a matemática, a filosofia, a astronomia, a geografia e outros ramos do saber, assim também com as variadas expressões da cultura.

A contribuição significativa de vários povos, desde o período de 3000 a.C. até o presente, como os egípcios, babilônicos, gregos, chineses, hindus e árabes, foram fundamentais ao aprimoramento e entendimento da Matemática. Ao longo do tempo, a matemática evoluiu, com os homens pensando sobre possibilidades, fazendo tentativas, encontrando soluções e procurando formas de representar seus pensamentos numa linguagem específica.

Por fim, é importante salientar a importância da História da Matemática como instrumento para o ensino e a aprendizagem desta ciência, pois os desafios matemáticos são desafios da própria humanidade, em sua luta de sobrevivência e ascensão intelectual.

Nos sentidos acima expostos, a origem da Fórmula de Bhaskara é um tema relevante da História, não apenas da Matemática, mas da Ciência e da sociedade humana. Através dela o autor deste trabalho tomou conhecimento de uma pequena parte da história de uma das culturas mais ricas da Terra, a cultura hindu.

2. A ÍNDIA

A Índia atual é um país que ocupa 2.4% do território do planeta e contém 16.8% da população mundial, cerca de 1 bilhão e 200 milhões de habitantes. É um país em acelerado processo de crescimento econômico e intensas mudanças sociais, mas sua história é tão antiga quanto a mais antiga das civilizações. De grande diversidade cultural, a Índia tem no seu povo o retrato de uma sociedade rica em costumes, mas também em confrontos étnicos e religiosos. A origem do povo indiano através das invasões de outros povos deixa claro que a grande diversidade cultural é resultado de conflitos, mas também originou uma riqueza cultural distinta e bela, inigualável.

Existem registros arqueológicos indicando que o vale do rio Indo foi habitado por povos camponeses conhecidos como harapas, de pele escura. Esses povos tinham uma escrita e suas manifestações literárias são tidas por alguns especialistas como as mais antigas do mundo, remontando a 2.500 a.C.

Aproximadamente em 1.500 a.C. os povos nativos foram atacados e escravizados por tribos arianas, de origem indo-européia, de pele mais clara. Daí originou-se o que hoje é conhecido como Civilização Hindu. Os arianos impuseram uma nova religião – o hinduísmo -, o sistema de castas e a escrita sânscrita, cujo texto mais conhecido são os Vedas (WIKIPEDIA, 2009).

A partir de 200 a.C. a região foi muito conturbada por invasões e conflitos internos, sofrendo divisões e unificações sucessivas, até que em 320 da Era Cristã a Índia foi reunificada, dando origem ao império Gupta, que se manteve por um século. Esse período é considerado a era clássica da Índia.

A invasão árabe conquistou partes da índia ocidental nos séculos VIII, IX e X. Em 1206 Kutb ud-Din-Aibak fundou o sultanato muçulmano de Dehli. O contato direto entre a Europa e a Civilização Hindu ocorreu na chegada dos portugueses ao território da atual Índia com a expedição capitaneada por Vasco da Gama, em 1498. Em 1526, Babur instala o império Mogul (muçulmano), que terminou em 1707.

O início da colonização inglesa da Índia se deu em 1612, com a instalação de entrepostos comerciais no território hindu, em especial nos litorais leste e oeste daquele país. De 1746 a 1763 ocorreu uma guerra entre forças militares inglesas e francesas pelo domínio da atual Índia. Pelo Tratado de Paris(1763) a Grã-Bretanha assegurou a posse da maior parte do território do subcontinente indiano, passando a exercer uma ferrenha tirania sobre o povo hindu. O apogeu do domínio inglês na Índia prolongou-se de 1850 a 1930.

Na luta contra o domínio inglês destacou-se Mahatma Ghandi (imagem ao lado), líder espiritual de enorme prestígio, defensor do princípio de não-agressão e da
desobediência civil como meio de luta política.
Em 15 de agosto de 1947, a Índia tornou-se independente, mas Gandhi não a celebrou, entristecido com a sua divisão de seu território em dois países: a parte de maioria hinduísta (Índia) e a parte de maioria muçulmana (Paquistão). Poucos meses depois, em 30 de janeiro de 1948, Gandhi foi assassinado por um hindu radical.

2.1. Sistema de castas.

O vale do rio Indo foi ocupado por povos conhecidos como harapas, que desenvolveram a agricultura e construíram várias cidades. Em 1500 a.C., o país foi ocupado pelos invasores arianos que impuseram o sistema de castas, o hinduísmo e a escrita sânscrita. Com o tempo, as castas se subdividiram, mas originalmente eram apenas quatro: os brâmanes (religiosos e nobres); os xátrias (guerreiros); os vaixás (comerciantes) e os sudras (camponeses, artesãos e operários). Segregados dessa estrutura social encontravam-se os párias, sem casta (categorizados abaixo dos escravos), considerados intocáveis, até pelos escravos, para não serem "amaldiçoados"; hoje chamados de haridchans, haryans ou "dalits" (WIKIPEDIA, 2009).

A Constituição Indiana, em vigor desde a independência da Índia em 1947, rejeita a discriminação com base na casta, mas eliminá-la é um processo lento. Barreiras de casta deixaram de existir nas grandes cidades, mas persistem principalmente na zona rural do país.

2.2. Religião

O hinduísmo, religião de mais de 80% da população indiana, foi imposto pelos invasores arianos. Ele se baseia na ajuda ao indivíduo a experimentar a divindade que está em todas as partes, afirma a existência de um ser supremo (Brahman) cujas várias facetas são representadas por uma trindade constituída pelos deuses: Brahma, Vishnu e Shiva. Os códigos sagrados da religião estão fundamentados nos Vedas (palavra em sânscrito que significa conhecimento) que são um conjunto de textos sagrados, consistindo em escrituras que incluem canções, hinos, ritos, dizeres e ensinamentos.

O Islamismo é uma religião monoteísta adotada por 13,4% da população indiana. Como sagradas escrituras, os muçulmanos têm o Corão, que crêem ser a palavra de Deus revelada ao profeta Maomé. São usados também o Torá, que inclui os Mandamentos de Moisés, os Salmos de Davi e o Evangelho cristão.

Por volta do século VIII iniciou-se a invasão muçulmana ao norte da Índia e após três séculos de batalha sua fixação foi irreversível. Deflagrou-se, nessa época, e perpetua até os dias de hoje, um conflito entre os muçulmanos e os hindus, que são maioria na Índia. O islamismo, por possuir um apelo igualitário ignorando o sistema de castas, atraiu partes da população indiana marginalizados pelas castas ou descontentes com o hinduismo. Outro ponto de discórdia entre essas religiões é o caráter monoteísta do islamismo que contrasta diretamente com o politeísmo hindu.

2.3. Arte

Apesar das semelhanças com a arte ocidental, a arte indiana se manifesta, em grande parte, a serviço da religião.
A arquitetura indiana é influenciada pelas várias culturas e religiões que convivem no seu território e reflete várias fases de desenvolvimento, tendo absorvido, em cada uma delas, elementos de suas influências. Em grandes traços, pode-se destacar a influencia do budismo, com as stupas (pequenos templos para guardar as relíquias dedicadas a Buda) e os chaityas (templos rupestres). A escultura foi marcada por obras em baixo relevo comuns nas colunas com formas de animais que adornavam os templos (ÍNDIA, 2009).

A partir do século V, a ascensão do hinduismo e do jainismo adicionou à arquitetura indiana as sanefas (tiras largas de tecidos que se estendem sobre a parte superior de uma cortina), cujos exemplos mais importantes estão em Bihar, em Abu Rajasthan e em Gujarat.

Com a chegada dos muçulmanos, no Séc. XIII, a arquitetura indiana teve adicionados elementos característicos da mesma, presentes em templos como o famoso mausoléu de Gol Gundadh (1660), em Bijapur. A influência muçulmana foi responsável por uma mudança da escultura indiana para as formas lineares, para o contorno pronunciado em vez do volume transformando-a num objeto de decoração. Essa influência trouxe também uma mudança da escultura budista, que passou a retratar figuras com muitos detalhes caracterizadas por múltiplos braços que se viam presentes em templos hindus e jain (INDIA, 2009).


A influência da dinastia mogul veio nos séculos XVI a XVIII e é caracterizada pelo uso de materiais luxuosos como o mármore, tendo como seu maior exemplo o famoso mausoléu Taj Mahal (imagem acima). Com a dominação inglesa, mais um estilo foi adicionado à já rica arquitetura indiana. Hoje seus prédios variam entre a arquitetura clássica indiana e a arquitetura européia.

Por estar no caminho entre o oriente e o ocidente a pintura indiana, diferentemente de outras pinturas orientais, traz elementos mais familiares à cultura ocidental.

2.4. Letras

A literarura da Índia antiga é rica e variada e, segundo alguns especialistas, a mais antiga do mundo (2.500 a.C). Foi na Índia que surgiram as primeiras manifestações literárias em sânscrito. As primeiras obras foram os Vedas, de cunho religioso-filosófico, que é a reunião dos textos sagrados do hinduísmo, que se agrupam em três blocos: as Samhita, os Brahmana e os Sutra. Após os Vedas foram escritos os famosos poemas épicos Mahabharata e Ramaiana, que relatam os feitos dos heróis e compreendem numerosas lendas antigas (INDIA, 2009).

As fábulas indianas – especialmente as coleções Panchatantra e Hitopadeza que retratam histórias de animais – foram disseminadas ao longo dos séculos por toda a Europa, tornando-se, segundo alguns historiadores, a base para uma série de fábulas conhecidas do mundo ocidental, como as Fábulas de Ésopo e As Mil e Uma Noites. Muitas obras características da rica literatura indiana continuaram influenciando a literatura medieval de diversos países da Europa (ÍNDIA, 2009).

3. A MATEMÁTICA NA ÍNDIA

A matemática hindu tem grande influência no mundo inteiro: os universalmente conhecidos algarismos arábicos são de origem hindu. Os hindus conheciam a extração da raiz quadrada e cúbica e tinham noções das leis fundamentais da trigonometria. Seus conhecimentos matemáticos, tão essenciais para várias ciências, foram divulgados na Europa pelos árabes (EVES, 2002).

São do 3º milénio a.C. os primeiros vestígios matemáticos da civilização que se desenvolveu no vale do rio Indo. Descobertas recentes parecem indicar que os harapas, povos que habitavam aquela região, adotaram um sistema decimal de pesos e medidas (BROWN.EDU, 2009).

Os hindus foram hábeis aritméticos e deram contribuições significativas à álgebra. Muitos dos problemas aritméticos eram resolvidos por falsa posição. Outro método de resolução preferido era o de inversão no qual se trabalha para trás, a partir dos dados.

EDUCACIONAL (2009) apresenta um exemplo de solução por inversão. O problema faz parte do texto Lilavati de Bhaskara: “Linda donzela de olhos resplandecentes, uma vez que entendeis o método de inversão correto, dizei-me qual é o número que multiplicado por 3, depois acrescido de ¾ do produto, depois dividido por 7, diminuído de 1/3 do quociente, multiplicado por si mesmo, diminuído de 52, pela extração da raiz quadrada, adição de 8 e divisão por 10 resulta no número 2?” Pelo método de inversão começamos com o número 2 e operamos para trás.

Assim,
[(2)(10) – 8]2 + 52 = 196 , √ 196 = 14, (14) (3/2)(7)(4/7) ÷ 3 = 28
é a resposta. Observe-se que onde a instrução do problema manda que se divida por 10, multiplica-se por 10; onde a instrução é somar 8, subtrai-se 8; onde manda que se extraia a raiz quadrada, eleva-se ao quadrado, e assim por diante. É a substituição de cada operação por sua inversa que responde pelo nome inversão.

Os hindus sincoparam sua álgebra, aceitavam os números negativos e irracionais, somavam progressões aritméticas e geométricas, resolviam problemas comerciais envolvendo juros simples e compostos e sabiam que uma equação quadrática tem duas raízes reais. Revelaram notáveis habilidades em análise indeterminada, sendo talvez os primeiros a descobrir métodos gerais neste ramo.

Outra contribuição importante dos hindus para a matemática é a função do seno na trigonometria. A trigonometria hindu era um instrumento útil e preciso para a astronomia (BROWN.EDU, 2009).

A idéia do infinito é encontrada nos próprios Vedas. Ele foi corretamente compreendido como aquilo que permanece inalterado se adicionarmos ou subtrairmos dele o próprio infinito (SANTOS, 2009).

Segundo a crença hindu, o universo é destruído no final de cada kalpa, que é a vida do deus criador Brahma. Entre a destruição do universo e sua recriação, no final de cada ciclo, o deus Vishnu repousa nos anéis de Ananta, a grande serpente do infinito, enquanto espera o universo se auto-recriar.

Os filósofos indianos sempre foram fascinados pela matemática. Foram os matemáticos indianos que inventaram o zero, uma absoluta necessidade para que pudesse ser desenvolvida uma aritmética tratável. A idéia dos hindus de introduzir uma notação para uma posição vazia – um ovo de ganso, redondo – ocorreu na Índia, no fim do século VI. Mas foram necessários muitos séculos para que esse símbolo chegasse à Europa (EVES, 2002).

De acordo com Educar (2009), estudando os livros de Matemática vindos da Índia e traduzidos para o persa, o célebre matemático al-Khwarizmi, a serviço do Califa de Bagdá, tomou contato com a notação do zero, representado pelos hindus como um ovo de ganso. Então, escreveu um livro chamado “Sobre a arte hindu de calcular”, explicando com detalhes como funcionavam os dez símbolos hindus. Com o livro de al-Khwarizmi, matemáticos do mundo todo tomaram conhecimento do sistema de numeração hindu. Os símbolos – 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 – ficaram conhecidos como a notação de al-Khwarizmi, de onde se originou o termo latino algorismus. Daí o nome algarismo.
Com a introdução do décimo sinal – o zero – o sistema de numeração tal qual o conhecemos hoje estava completo. Isto se refletiu diretamente no desenvolvimento da ciência quantitativa.

A nova numeração, geralmente chamada de hindu-arábica ou indo-arábica, é uma nova combinação dos três princípios básicos, todos de origem antiga: (1) base decimal; (2) notação posicional e (3) forma cifrada para cada um dos dez numerais (OLIVEIRA e MARTINS, 2009).

Até chegar aos números que hoje são utilizados universalmente, os símbolos criados pelos hindus mudaram bastante. A figura abaixo apresenta alguns passos da evolução dos algarismos, desde os usados pelos hindus da época de Brahmagupta, passando pelos algarismos usados pelos povos árabes e chegando aos algarismos usados no mundo ocidental.

Lendo de baixo para cima (SILVEIRA, 2009):
• algarismos Devanagari da época de Brahmagupta
• algarismos Devanagari primitivo, anterior a Brahmagupta
• algarismos árabes de c. 800 dC
• algarismos árabes atuais
• letras árabes eventualmente usadas como algarismos
• algarismos indo-arábicos medievais
• indo-arábico atual

Por volta do século III a.C., o matemático indiano Pingala inventou o sistema de numeração binario. Usado atualmente no processamento de todos os computadores, o sistema estabelece que seqüências de uns e zeros podem representar qualquer número. A palavra sünya (pronuncia-se shunia e significa vazio, em sânscrito) foi usada para indicar casa nula quando da escritura de numerais no livro Chandah-sutra (200 a.C) de Pingala. Mais tarde, as casas nulas passaram a ser indicadas por um ponto, o qual era chamado de pujyam (BRASIL. 2009).

O sistema de números binários foi descoberto no ocidente pelo matemático alemão Leibnitz em 1678, quase 2000 anos depois de Pingala. A estrutura deste sistema numérico pode ter ajudado na invenção da forma gráfica que distingue o zero, feita pelos indianos possivelmente entre os anos 50 a.C a 50 d.C. Sem o símbolo do zero a matemática teria tido grandes dificuldades no seu desenvolvimento (BERGO, 2008).

4. BHASKARA E A “FÓRMULA DE BHASKARA”

Uma das grandes influências da matemática indiana no ocidente é através do matemático Bhaskara de Acharya (ou Bhaskara II, ou Báscara, ou Bhascar), nascido em 1114, cujo nome evoca a solução de equações algébricas do segundo grau, e que foi também um importante astrônomo. Seu tratado de álgebra foi base para a álgebra da Europa alguns séculos depois.

Bhaskara nasceu em uma tradicional família de astrólogos indianos, seguiu a tradição profissional da família, porém com uma orientação científica, dedicando-se mais à parte matemática e astronômica (tais como o cálculo do dia e hora, da ocorrência de eclipses ou das posições e conjunções dos planetas) que dá sustentação à Astrologia.
Seus méritos foram logo reconhecidos e muito cedo atingiu o posto de diretor do Observatório de Ujjain, o maior centro de pesquisas matemáticas e astronômicas da India, na época.

Como matemático, Bhaskara preencheu as lacunas do trabalho de Brahmagupta. É dele a primeira resposta plausível para a divisão por zero. Em seu trabalho “Vija-Ganita” ele afirma que tal quociente é infinito (SOMATEMÁTICA. 2009).

Bhaskara escreveu o tratado Siddhanta Siromani, aos 36 anos, em 1150. O seu manuscrito está dividido em quarto partes – Lilavati (A Bela) sobre aritmética; Bijaganita sobre álgebra, Goladhyaya sobre a esfera, ou seja sobre o globo celeste, e Grahaganita sobre a matemática dos planetas.

Sua obra foi usada em toda a Índia, tendo substituído a maior parte dos textos que eram utilizados até então, como o do astrônomo indiano Lalla (720-790), mas só ultrapassou as fronteiras da Índia no século XVI, quando foi traduzido para o persa por Faizi (1587). Foi este tradutor que introduziu a história de que Lilavati era o nome da filha de Bhaskara. De acordo com uma dessas histórias, citada em Matematica-na-veia (2009), Bhaskara (que também era astrólogo) tinha previsto o dia e a hora propícia para o casamento da sua filha. Para saber a hora exata tinha construído um relógio, colocando um copo com um pequeno orifício, por onde entrava água, numa vasilha cheia de água. Quando chegasse a hora exata do casamento o copo iria se afundar. Entretanto, Lilavati, cheia de curiosidade, inclinou-se sobre a vasilha e uma pérola do seu vestido caiu no copo e bloqueou o orifício. A hora do casamento passou sem que o copo se afundasse. Lilavati nunca se casou. Para consolar a sua filha, Bhaskara prometeu escrever um livro de matemática e homenageá-la dando-lhe o seu nome.

Embora fantasiosa, a história tornou-se lenda contada de maneiras diferentes por vários autores, e serviu para tornar mais famoso o admirável matemático.
Lilavati, escrita em 278 versos, representa a culminação de contribuições hindus anteriores a ela. Apresenta tópicos sobre equações lineares e quadráticas, determinadas e indeterminadas, mensuração, progressões aritméticas e geométricas, radicais, tríadas pitagóricas, entre outras.

Mas, e a fórmula de Bhaskara?

A fórmula de Bhaskara é utilizada para determinar as raízes de uma equação quadrática (de 2º grau). Na literatura internacional não se dá o nome de Bhaskara para esta fórmula; aparentemente, isto se dá apenas no Brasil.

Como precedentes da fórmula de Bhaskara, as referências mais antigas sobre a resolução de problemas do 2º grau foram encontradas em textos babilônicos, escritos há cerca de 4000 anos, em tábuas cuneiformes. Nesses textos, o que se tinha era uma receita, escrita em prosa, sem uso de símbolos matemáticos, que ensinava como proceder para determinar as raízes em exemplos concretos, quase sempre ligados a relações geométricas.

Embora os babilônios tivessem conseguido resolver muitos problemas matemáticos envolvendo equações quadráticas, cada problema era resolvido para aquele caso particular e sua solução era uma espécie de receita prática, que não especificava nem a sua fórmula geral (se houvesse), nem o modo como a solução tinha sido obtida. Embora essas "receitas" , quando aplicadas a problemas do segundo grau, conduzissem de forma natural à dedução da fórmula de Bhaskara, os antigos babilônios não chegaram a generalizar tais "receitas".

Na Grécia, uma equação de segundo grau era resolvida por meio de construções geométricas - método geométrico utilizado por Euclides (Séc. III a.C.) - para achar a solução da equação x2 = s2 - sx.
No princípio do século IX, o matemático árabe Al-Kowarismi, influenciado pela álgebra geométrica dos gregos, resolveu, metodicamente, as equações do segundo grau, chegando à fórmula do modo descrito a seguir (MATEMATICA-NA-VEIA, 2009).

Al-Khwarismi interpretava, geometricamente, o lado esquerdo da equação x2 + px = q como sendo uma cruz constituída por um quadrado de lado x e por quatro retângulos de lados p/4 e x. Então, como mostra a figura acima, "completava" esta cruz com os quatros quadrados pontilhados de lado p/4, para obter um "quadrado perfeito" de lado x + p/2.


Usando este artifício geométrico, Al-Kowarismi demonstrou que adicionando-se 4 vezes p2/16 , soma das áreas dos quatro quadrados de lado p/4 , ao lado esquerdo da equação x2 + px = q, obtinha-se (x + p/2)2, que é a área do quadrado de lado x + p/2 , isto é, x2 + px + 4 p2/16 = (x + p/2)2 .
Portanto, a equação x2 + px = q poderia ser escrita como (x + p/2)2 = q + p2/4 implicando que x = -p/2 ± , que é a fórmula de Bhaskara.
Chama-se de regra uma descrição por extenso dos procedimentos para resolver um problema, por exemplo uma equação. Na época de Bhaskara essas regras, tipicamente, tinham a forma de poesias que iam descrevendo as operações a realizar para resolver o problema. A partir de Aryabhata 500 d.C., e possivelmente muito antes, os indianos já usavam várias regras para resolver equações do segundo grau.
Para resolver as equações quadráticas da forma ax2 + bx = c, os indianos usavam a seguinte regra:


Multiplique ambos os membros da equação pelo número que vale quatro vezes o coeficiente do quadrado e some a eles um número igual ao quadrado do coeficiente original da incógnita. A solução desejada é a raiz quadrada disso.”

Bhaskara conhecia a regra citada acima, porém, a regra não foi descoberta por ele. A regra já era do conhecimento, pelo menos, do matemático Sridara, que viveu mais de 100 anos antes de Bhaskara (EVES, 2002; BROWN.EDU, 2009; MALHATLANTICA, 2009; SOMATEMATICA, 2009).

A fórmula de Bhaskara, utilizada para determinar as raízes de uma equação quadrática (ou de segundo grau) tal como se conhece hoje, é:
.

É importante observar que a falta de uma notação algébrica, bem como o uso de métodos geométricos para deduzir as regras, faziam os matemáticos da Era das Regras terem de usar varias regras para resolver equações do segundo grau. Por exemplo, precisavam de regras diferentes para resolver x2 = px + q e x2 + px = q. Foi só na Era das Fórmulas que iniciaram as tentativas de dar um procedimento único para resolver todas as equações de um dado grau (MATEMATICA-NA-VEIA, 2009).

Até o fim do Séc. XVI não se usava uma fórmula para obter as raízes de uma equação do 2º grau, simplesmente porque não se representavam por letras os coeficientes de uma equação. Isso só começou a ser feito a partir da François Viéte, matemático francês que viveu de 1540 a 1603 (SOMATEMÁTICA, 2009). Logo, embora não se deva negar a importância e a riqueza da obra de Bhaskara, não é correto atribuir a ele a conhecida fórmula de resolução da equação de 2º grau.

5. CONCLUSÃO
Qualquer estudante sabe o que é a fórmula de Bhaskara, mas poucos sabem que esta fórmula para resolução das equações quadráticas nada tem a ver com o famoso matemático. Bhaskara, assim como todos os matemáticos até então, não sabia o que era uma fórmula matemática. Isto só passou a existir cerca 400 anos depois da morte dele. Até o final do século XVI não se representavam através de letras os coeficientes de uma equação. Na época de Bhaskara, as equações eram resolvidas com regras e não com fórmulas.
É evidente, e todos concordam, que Bhaskara conhecia as regras para resolver equações quadráticas, mas elas já eram conhecidas do matemático Sridara, mais de 100 anos antes.

REFERÊNCIAS

BERGO, Lívia. Sistema Brasileiro de Televisão Digital: o princípio e o fim. Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. XIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste – São Paulo – 07 a 10 de maio de 2008.
BRASIL. Ministério das Ciências e da Tecnologia. Observatório Nacional. A Cosmologia na Ásia. Obtido em: http://www.on.br/site_edu_dist_2008/site/conteudo/modulo1/1-cosmologia-antiga/4-cosmologia-india.html. Acesso em: 1/5/2009.
BROWN.EDU. História da Matemática na Índia. Obtido em: http://www.brown.edu/Departments/History_Mathematics/. Acesso em 4/5/2009.
EDUCACIONAL. Evolução histórica da álgebra. Obtido em: http://www.educacional.com.br/upload/blogSite/1960/1960143/5124/Evolucao%20historica%20da%20algebra%20%20%20sexta%20serie.doc. Acesso em: 27/4/2009.
EDUCAR. História da Matemática. Obtido em: http://educar.sc.usp.br/licenciatura/2003/hm/page01.htm. Acesso em: 27/4/2009.
EVES, H. Introdução à História da Matemática, 3ª Edição, Editora Unicamp, 2002.
http://ecalculo.if.usp.br/historia/originais/Bhaskara.doc
ÍNDIA. Consulado da Índia em Belo Horizonte. Índia. Obtido em: http://www.indiaconsulatemg.org/india_subpagina.php?id=6. Acesso em: 4/5/2009.
MATEMATICA-NA-VEIA. A verdadeira história da fórmula de Bhaskara. Obtido em: http://www.matematica-na-veia.blogspot.com. Acesso em: 27/4/2009.
MALHATLANTICA. Bhaskara I. Obtido em: http://www.malhatlantica.pt/mathis/India/BhaskaraI.htm. Acesso em: 27/4/2009.
OLIVEIRA, Juliana Gaiba e MARTINS, Ricardo Miranda. História da Matemática. Obtido em: http://www.csd.ime.unicamp.br/~ra041031/Trabalhos_files/histmat.pdf. Acesso em 29/4/2009.
SANTOS, Túlio Jorge. História da astronomia e ciências afins. Obtido em: http://www.observatorio.ufmg.br/. Acesso em: 1/5/2009.
SILVEIRA, J.F. Porto da. Três noções numéricas básicas: número, numeral e algarismo. Obtido em: http://www.mat.ufrgs.br/~portosil/passa7a.html. Acesso em: 1/5/2009.
SOMATEMÁTICA. História da Matemática. Obtido em: http://www.somatematica.com.br/historia/oriental4.php.
WIKIPEDIA. Sistema de castas. Obtido em: pt.wikipedia.org/wiki/Castas. Acesso em: 4/5/2009.

Palavras-chave: matemática; história da matemática; fórmula de Bhaskara; indiaHinduísmoSociedadeSociologia