Blog do Professor Márcio

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quinta-feira, 10 de julho de 2014

Território e Poder em Paracatu - Parte II

Estudando as relações entre a comunidade paracatuense e a mineradora RPM/Kinross
Márcio José dos Santos

No artigo anterior, vimos como o poder burocrático das grandes empresas transnacionais se impõe, especialmente em países mais fracos, e se torna quase indestrutível. Outra abordagem sobre dominação é a teoria de poder e resistência, em Foucault. Foi esse intelectual francês quem pela primeira vez dissecou as entranhas do poder, para nos revelar seu duplo aspecto.

Para Foucault, o poder não é somente repressão, barreira ou proibição, porque se assim fosse ele não seria obedecido, não se manteria; isto só é possível porque o poder permeia a sociedade, organiza-se em rede de apoio e de penetração, incita, seduz, forma saber e produz discurso. Seu elemento fundamental é a produção da verdade, isto é, tudo que emana do poder é acolhido como verdade, e esta verdade circula ligada ao sistema, produzindo efeitos de poder.

Foucault combate a ideia de que o poder é emanado de determinado ponto, que exista algo que seja um poder, porque isso não possibilita entender grande número de fenômenos. Para ele, ninguém é o seu único titular; no entanto, ele se exerce em determinada direção; não se sabe quem o detém, mas se sabe quem não o possui, pois onde há poder ele se exerce; vê-se quem explora, quem lucra, quem governa, mas o poder é algo ainda mais difuso, permeando as relações.

Por dominação, Foucault não entende apenas a dominação de um sobre os outros, mas sobretudo as variadas formas de dominação que são exercidas na sociedade, como o sistema do direito e o campo judiciário. Ao analisar o poder é preciso, então, evitar a questão da soberania e da obediência dos indivíduos e fazer aparecer em seu lugar o problema da dominação e da sujeição.

Para isto, o poder deve ser captado em suas extre­midades, nas suas formas e instituições mais regionais e locais, principalmente no ponto em que, ultrapassando as regras de direito que o organizam e delimitam, ele se prolonga, penetra em institui­ções, corporifica-se em técnicas e se mune de instrumentos de inter­venção eventualmente violenta. Ele é algo que circula, que só funciona em cadeia, nunca está localizado aqui ou ali, nas mãos de alguns, mas funciona e se exerce em rede. Nas suas malhas os indivíduos não só circulam, mas estão sempre em posição de exercer este poder e de sofrer sua ação, como centros de transmissão.

Ora, é então preciso fazer uma análise ascendente do poder a partir dos mecanismos infinitesi­mais e depois examinar como estes mecanismos de poder foram e ainda são investi­dos, utilizados, subjugados, desdobrados, etc., por mecanismos cada vez mais gerais e por formas de dominação global; investigar como o poder, para exercer-se nestes mecanismos sutis, forma e põe em circulação um saber, que produz o discurso da verdade.

Para investigar o poder é fundamental, então, investigar as resistências contra os dispositivos de poder, observar as estra­tégias antagônicas que se colocam, de uma ou outra forma, contra o mesmo. Sem resistência, não há relações de poder e tudo se resumiria a obediência.

Se o poder existe numa rede vasta e multiforme de rela­ções, os pontos de resistência também se apresentam como multiplicidade ou como “focos”, fragmentos que se distribuem no jogo das relações de poder. A resistência luta con­tra os saberes (do poder) que pretendem tomar para si todos os discursos que enunciam a verdade sobre o sujeito; faz oposição contra as formas de poder que separam os indivíduos entre si e daquilo que eles produzem e luta contra os dispositivos do poder que controlam as relações dos indivíduos.

Porém, constata-se que ainda hoje pouca atenção tem sido dada a um dos pontos centrais do pensamento de Foucault, qual seja investigar os novíssimos dispositivos de poder contemporâneos, por exemplo, os poderes midiáticos e as multinacionais como mecanismos de dominação fundamen­tais do mundo global, e também investigar os movimentos de resistência.

Nossa proposta, então, é refletir sobre o exercício do poder em Paracatu, sob os olhares de Foucault, Weber e Morgan, presa na malha que a domina e constrange. Acompanhe-nos, caro leitor!

Este texto foi publicado no jornal O Movimento, ed. 443, de 1º a 15 de setembro de 2013, pág. 9.

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