Blog do Professor Márcio

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sábado, 11 de julho de 2009

Leitura de uma escola à luz da metáfora mecanicista

Focalizar a Escola “X” (1) à luz da metáfora mecanicista faz ressaltar a estrutura organizada em conjuntos, cada um deles realizando tarefas e atividades rigorosamente planejadas para cumprir metas e objetivos bem determinados. A imagem de escola “rígida”, como é vista pela comunidade, foi construída exatamente pela determinação na execução de seus programas e pela exigência do cumprimento do papel de cada um – alunos, professores e funcionários – na consecução dos objetivos e metas da instituição.

A estrutura organizacional pode ser dividida em dois conjuntos - administrativo e pedagógico -, os quais se constituem de subconjuntos, organizados em função das atividades e objetivos setoriais. A cadeia de comando é estabelecida a partir de duas direções – direção administrativa e direção pedagógica -, e desce ao nível de coordenadores de área e supervisores, responsáveis pelo planejamento, organização e controle das atividades, e vai até ao nível operacional, responsável pela execução do trabalho. A descentralização é realizada através do comando de cada área; por exemplo, coordenação da educação infantil, coordenação do ensino de 1ª a 4ª série etc.

Após a abertura dos portões, pela manhã, o toque do sinal para o início das aulas dita a cadência rigorosa das atividades do dia, e cada pessoa, seja aluno, professor ou funcionário administrativo tem que assumir o seu papel. Atrasos ou descumprimento das normas são desvios que se procura cercear com advertências ou aplicação de penalidades.

A prestação de serviços educacionais é a atividade básica da escola e em torno dela tudo se organiza. Programas, prazos, datas e horários são observados com grande rigor, exigindo controle intenso e constante. O próprio calendário escolar é um exemplo, quando determina, além dos dias de aula, várias atividades que devem ser realizadas ao longo do ano, como provas, reuniões, festas e outros eventos programados. A partir deste calendário, vários processos são organizados, como, por exemplo, as avaliações, que têm toda uma rotina precisamente determinada (elaboração da prova, revisão/aprovação, confecção, aplicação, correção/avaliação, entrega dos resultados, discussão dos resultados e entrega de boletim).

Todos devem ter clara noção do que é estabelecido como “certo”, o que leva a uma tendência à formalização dos processos.

Formalizar para depois rotinizar é uma diretriz da organização, seja nas áreas administrativa ou acadêmica. Isto possibilitou a implantação do gerenciamento escolar através de um software eletrônico, que opera em módulos (Secretaria, Acadêmico, Financeiro, Pessoal e Biblioteca), utilizando base de dados única.

O mecanicismo que estrutura a organização e permeia todos os seus processos é importante para o funcionamento harmônico das partes constituintes da escola, execução dos programas de ensino e cumprimentos das metas educacionais, sempre submetido a uma legislação e normas que ditam o que fazer e os prazos. Entretanto, se de um lado o mecanicismo estabelece ordem e disciplina, por outro lado é fonte viva de conflitos.

Um dos aspectos geradores de conflito é a questão da busca do consenso, necessário para que o todo funcione de maneira harmônica. Especialmente na área pedagógica, constituída em grande parte por professores com reduzida carga horária de trabalho, o consenso nem sempre nasce de acordos com a participação de todos e muitos não têm noção clara do que é estabelecido, provocando desalinhamento com a “equipe”.

A visão mecânica da escola está profundamente introjetada nas práticas e nos comportamentos. Na área administrativa, o modo de pensar mecanicista evidencia-se na busca de especialização de cada funcionário, que procura assumir tarefas limitadas dentro da rotina do estabelecimento, embora esta não seja a orientação vinda dos dirigentes. Quando se observa o funcionamento de um setor, como a Secretaria, por exemplo, vê-se que cada funcionário está sempre “no mesmo lugar”, e que há um acordo tácito sobre as tarefas a serem cumpridas. Entretanto, como a escola é um refazer a cada dia, situações novas e inusitadas surgem inevitavelmente.

Como nenhum funcionário tem a visão do todo e todos resistem a compartilhar e alternar tarefas, não se conquista a autonomia e a capacidade de decisão, havendo necessidade freqüente de intervenção dos dirigentes na solução de problemas.

Na área pedagógica, nota-se a ênfase no cumprimento de programas e conteúdos das disciplinas, muitas vezes desconhecendo as diferenças individuais e coletivas.

Embora exista um esforço da parte da direção e de muitos docentes para buscar abordagens não mecanicistas, boa parte ainda adota o pressuposto básico de que havendo ensino, consequentemente, haverá aprendizagem; se não ocorreu a aprendizagem a causa está no aluno, que não estudou o suficiente para aprender.

Regra e transgressão estão sempre presentes em tudo o que se faz na escola, mesmo porque os educandos fazem aí suas aprendizagens de limite e autonomia, testando os seus espaços e suas relações. O pressuposto do ordenamento mecânico é que as regras sejam feitas para serem obedecidas, e é comum os coordenadores e professores, responsáveis por sua implementação, não as explicarem ou discutirem, colocando-se numa linha de autoridade de quem tem direito de dar ordem e exigir obediência. Eis aí o principal foco de conflitos no ambiente escolar, em que o modo mecânico de impor ordem gera desobediência.

Este paradoxo da organização - ordem gerando conflito -, reflete o paradoxo da própria escola como instituição conservadora de valores, reprodutora do modelo social dominante e ao mesmo tempo instituição renovadora inserida em uma sociedade em permanente mudança.

Nota: Trabalho acadêmico apresentado na disciplina Teoria das Organizações, ministrada pelo Dr. Domingos A. Giroletti, no Mestrado em Administração das Faculdades Pedro Leopoldo.

Paracatu, 27/11/06

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