Aos 22 de março
deste ano realizou-se uma reunião, a portas fechadas, na Prefeitura de
Paracatu, para discutir um erro grosseiro do CETEM no levantamento sobre a
contaminação da população pelo arsênio. Ao contrário do alarde
feito na época da divulgação do relatório do CETEM, durante a audiência pública
realizada na Câmara Municipal, em 18 de março de 2014, agora o público ficou de
fora. As vítimas da intoxicação crônica pelo arsênio liberado pela mineradora Kinross
sequer foram informadas desta reunião. Diante disso, sentimo-nos na obrigação
de corrigir mais esse erro e denunciar essa postura anti-ética, que reforça
a impressão de um conluio generalizado para defender os interesses da
mineradora, em detrimento da saúde da população.
Nessa nova reunião
a portas fechadas, os pesquisadores do CETEM, Instituto Evandro Chagas e
Unicamp informaram que a “reanálise” dos dados apresentados na audiência
pública de 2014 revelou que a média de contaminação por arsênio em Paracatu é
de 15 μg/L (microgramas por litro) de urina, ou seja, quase cinco vezes o que eles
mesmos haviam anunciado, e que na verdade existiriam, entre as cerca de 800
pessoas amostradas, 13 casos de contaminação por arsênio acima de 50 μg/L na
urina, inclusive três pessoas teriam apresentado arsênio acima de 100 μg/l na
urina: uma moradora do bairro Paracatuzinho e outros dois moradores do bairro
Amoreiras. As outras pessoas que teriam apresentado concentração de arsênio na
urina acima de 50 ug/l foram 2 moradores do bairro Paracatuzinho e 8 do bairro
Amoreiras.
Parece que de nada
adianta tudo o que afirmamos sobre os danos ambientais e os riscos à saúde provenientes
da contaminação de Paracatu pelo arsênio liberado pela Kinross, nem mesmo
adianta que esses danos estejam sendo verificados até pelas equipes de pesquisa
ligadas à mineradora. Pior ainda, parece que não há interesse em resolver o problema por parte das pessoas do governo, seja da
Prefeitura, do Ministério Público e da Justiça, o que lança sérias dúvidas
sobre a eficácia de propormos ações na esfera judicial.
Vejam o caso de
Mariana, em que o risco da catástrofe de ruptura das barragens foi denunciado
pelos cientistas e engenheiros independentes, mas as autoridades não tomaram
providência e preferiram prestigiar os relatórios da mineradora, até que o desastre
aconteceu. O que estamos assistindo em Paracatu é uma situação semelhante.
Desde 2007, estamos alertando a população e as autoridades com informação de
boa qualidade. Como as autoridades ficaram inertes ou agiram a favor da
mineradora e contra os interesses da população, tomamos medidas administrativas
e judiciais, a partir de 2008. Infelizmente, até hoje, essas medidas não
surtiram o efeito esperado, seja porque as autoridades não agem na tutela do
objeto, seja porque não há interesse de agir.
Na reunião
ocorrida em 22 de março próximo passado, a portas fechadas, os pesquisadores do
CETEM, Instituto Evando Chagas e Unicamp confirmaram o que havíamos denunciado
em seguida à divulgação do primeiro relatório do CETEM: que essa equipe de
pesquisadores está alinhada com os interesses da mineradora. Essa equipe está
andando em círculos, enrolando e enganando, e a mineradora vai ganhando tempo
para continuar sua atividade minerária lucrativa e danosa. Cada dia ganho na
enrolação e na mentira representa milhões de lucro para a mineradora e agravamento
da intoxicação das pessoas.
Quanto tempo ainda
teremos que aguardar, até que uma equipe competente e independente seja
contratada para fazer um estudo epidemiológico clínico-laboratorial sério em
Paracatu?
É escandaloso ter
que ouvir dos pesquisadores contratados que alguns habitantes de Paracatu
apresentaram de 50 a 100 microgramas de arsênio por litro de urina, uma
concentração cerca de 20 vezes maior que a média anunciada por eles próprios em
2014, e nenhuma providência eficaz tenha sido tomada para impedir que a
contaminação ambiental continue a avançar, e sem que seja dado o início
imediato da recuperação ambiental obrigatória e o tratamento das vítimas da
intoxicação crônica pelo arsênio. Em vez disso, eles se contentam em falar em
“reanálise” e “níveis de segurança para arsênio”, como que a negligenciar o seu
compromisso com a verdade científica e a sua obrigação de garantir a segurança,
a saúde e a vida das pessoas. Quantas vezes será necessário repetir que não
existe nível seguro para uma substância cancerígena como o arsênio?
As autoridades dos
órgãos de governo continuam tratando a saúde pública alheias ao seu dever
constitucional de proteger o meio ambiente e os seres humanos, sobrepondo os
interesses de uma empresa aos interesses do povo.
Paracatu, 28 de junho de 2016.
Assinam:
Dr. Sergio Ulhoa Dani, médico, e Márcio José dos Santos, geólogo.
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Postagem da matéria do Paracatu.net:
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