O principal jornal londrino - The Guardian - apresentou matéria produzida pelos jornalistas Heriberto Araújo e Anna Veciana, sobre os impactos socioambientais em Paracatu pela exploração da mina de ouro.
Como uma grande parte de nossos leitores não tem conhecimento suficiente para a leitura do texto em inglês, resolvemos apresentar aqui uma tradução livre, que, se não é excelente, pelo menos é inteligível e confiável. Veja a nossa tradução.
Companhia canadense de mineração espionou
opositores e ativistas no Brasil
Ambição da
Kinross Mining Company de criar mina de maior produção de ouro no Brasil maculada
por riscos à saúde e ameaças a ativistas e opositores.
A exploração de ouro em Paracatu começou ainda em
1722. Mas os dias dos garimpeiros, ou caçadores de ouro, estão muito longe.
Desde os anos 1990 a exploração passou das margens do rio para depósitos
subterrâneos. Dinamite, escavadeiras e produtos químicos substituíram os
garimpeiros, que foram empurrados para fora de um negócio que tinha sustentado centenas
de famílias.
Preços crescentes
do ouro
Em 2005, a empresa canadense Kinross - que é listada
na New York Stock Exchange e possui minas de ouro no Chile, Estados Unidos,
Rússia e Gana, entre outros países - assumiu a concessão mineira em Paracatu.
Durante um período em que os preços do ouro subiram para novos patamares
históricos em mercados globais, a Kinross investiu US $ 1,86 bilhão no negócio,
triplicando a produção anual para as atuais 15 toneladas e tornando a mina de
ouro de Paracatu a mais produtiva no Brasil. Como o ouro em Paracatu não assume
a forma de grão ou pepita, mas de pó, a empresa teve que intensificar
enormemente as atividades de mineração para manter a produção. Hoje, cerca de 160
buracos de dinamite são detonados diariamente para escavar o Morro do Ouro, o Golden Hill, como os moradores
referem-se à área onde os principais depósitos são encontrados.
Em consequência, a geografia local foi profundamente
transformada. Quando nos aproximamos da área de lavra constatamos uma imensa
cratera que abrange 615 hectares, a metade do tamanho do Aeroporto de Heathrow,
e se assemelha a uma paisagem lunar. Os únicos sinais de vida são os bulldozers imponentes e os veículos “fora
de estrada” que transportam as pedras para a planta de beneficiamento. Lá,
produtos químicos tóxicos, incluindo cianeto, são empregados para separar o pó
de ouro, que é mais tarde fundido em lingotes e transportado de helicóptero para
São Paulo para exportação para o mundo inteiro.
Riscos do Arsênio
para a Saúde
Embora seja difícil negar o impacto visual -, além da área de mineração, duas grandes
barragens do tamanho de mais um Aeroporto Heathrow são utilizados para
eliminação de resíduos tóxicos - muitos argumentam que a mina representa uma
ameaça para o ambiente local e para a saúde dos 90 mil moradores de Paracatu.
Não bastasse o fato de se usar dinamite para retirar as reservas de ouro de
lugares próximos de 200 metros da área urbana, o metal precioso é misturado na
rocha com arsênio, um cancerígeno.
O arsênio é comumente encontrado em minas de ouro, mas
em Paracatu é uma preocupação especial. De acordo com Márcio José dos Santos,
um geólogo e ativista local, para cada tonelada de rocha removida apenas 0,4
grama de ouro é recuperada e 1kg de arsênio é liberado para o ar e as águas
subterrâneas. "Ninguém sabe quanto
arsênio está indo para a cidade. Aqui, o vento sopra de nordeste, significa que
o arsênio viaja no ar desde a mina até a área urbana. As pessoas estão inalando
a poeira tóxica e, consequentemente, estão inalando arsênio ", explica
José. Sergio Ulhoa Dani, um médico local e, também, oponente da mina,
argumentou em um artigo científico recente que "o dano potencial de arsênio em uma mina de ouro como a de Paracatu
poderia impactar sete trilhões de pessoas".
Muitos na cidade questionam se sua vida está em risco,
enquanto a palavra "câncer" tornou-se um tabu. Os dados da Prefeitura
Municipal de Paracatu mostram que a taxa de mortalidade por câncer na cidade é
semelhante ao resto do país. Os críticos argumentam que as estatísticas do
governo local não são confiáveis. Como Paracatu carece de instituições médicas,
os pacientes se deslocam para hospitais localizados a centenas de quilômetros
de distância para receber tratamento e, portanto, não são contados em dados
oficiais da cidade.
Os
opositores enfrentam assédio e ameaças
A posição da empresa também está sendo questionada. De
acordo com documentos vistos pelo The
Guardian e entrevistas com ex-funcionários, vários funcionários da Kinross
trabalharam em uma unidade de inteligência para rastrear qualquer atividade potencial
contra a mina ou a reputação da empresa.
Em entrevista ao The
Guardian, Gilberto Azevedo, gerente geral da mina, negou qualquer risco
para a saúde ou o ambiente. "Nós
monitoramos tudo. As pessoas nada têm a temer, porque nós temos tudo sob
controle. Nós fazemos testes ambientais e biológicos regularmente, e
contratamos fontes externas para realizar estudos. Todos eles mostram que não
há risco." Ele também enfatizou a importância econômica da atividade
da empresa para a região. Em 2014, a Kinross pagou cerca de US $ 10 milhões em
impostos e atualmente emprega 3.300 pessoas na mina, cerca de 8% da população ativa
na cidade.
No entanto, a tensão é perceptível. Enquanto
dirigíamos através das vias públicas que fazem divisa com a mina, um guarda
armado, que vinha seguindo o carro por uma hora, nos fez parar e nos fez
perguntas.
Dezenas de documentos e e-mails internos vistos pelo The
Guardian mostram que em 2012 e 2013 a Kinross tinha uma política de
monitorar regularmente os potenciais adversários em Paracatu, incluindo o ex-prefeito Almir
Paraca - conhecido por contestar abertamente a mina - e vários líderes
sindicais.
"Eles
monitoram os movimentos sociais, políticos, associações de moradores e seus
representantes, ativistas ambientais, líderes sindicais ... Eles até mesmo
monitoram o que alguns dos funcionários da Kinross fazem no seu tempo livre. O
principal objetivo é abafar ou reprimir qualquer ação, manifestação ou
referência contra a empresa de mineração ou seus interesses", disse
uma das fontes, conhecedora das políticas da Kinross, por causa de sua/seu antigo posto na empresa.
Pelo menos duas ativistas locais - Rafaela Luiz Xavier
e Evane Lopes - tiveram que abandonar a cidade nos últimos meses, depois que elas
receberam ameaças de morte, as quais elas afirmam estarem relacionadas a sua
oposição à mina.
"Não temos
nada a ver com isso. A Kinross é uma empresa que dialoga com a comunidade",
diz Azevedo, quando perguntado se a empresa de alguma forma está envolvida nas
ameaças a ativistas. A Kinross também negou estar monitorando ativistas ou
oponentes.
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