Denúncia contra a supressão de
direitos e as tentativas de acabar com os povos indígenas do Brasil
Nós lideranças de povos e organizações indígenas de todas as regiões do
Brasil, reunidos em Brasília-DF, para manifestar o nosso repúdio ao
processo de supressão dos nossos direitos fundamentais, coletivos e
originários, operado ostensivamente, por distintas instituições do Estado
Brasileiro, notadamente pelo Congresso da República, sob olhar omisso e
conivente do Poder Executivo e setores do Poder Judiciário, viemos junto à
opinião pública nacional e internacional denunciar:
- A truculenta atuação das
forças policiais - Legislativa, Polícia Militar (PM) e Força Nacional -,
que além de impedir o nosso acesso ao Congresso Nacional considerado a
casa do povo, agem contra o estado de direito, o regime democrático, com
abuso de autoridade, reprimindo, intimidando, ameaçando e detendo
arbitrariamente parentes nossos, como aconteceu na última terça-feira, 16
de dezembro, quando a PM capturou no acesso principal do Ministério da
Justiça quatro lideranças e outras duas na BR-040 quando de noite
voltávamos ao espaço onde nos alojávamos.
- A bancada ruralista, na sua
maioria herdeiros dos invasores do território hoje chamado Brasil e dos
algozes dos nossos povos no período da ditadura, querem de todas as formas
suprimir os nossos direitos assegurados pela Constituição Federal de 1988,
legalizando a usurpação, o esbulho e espoliação que secularmente vem
praticando contra as poucas terras que nos restaram nesses 514 anos de
invasão.
- Os ruralistas, muitos deles
financiados pelas corporações do agronegócio, frigoríficos, indústria
armamentista e empreiteiras, entre outros, a partir de 2011, principalmente,
tem feito de tudo para modificar, conforme seus interesses, o texto
constitucional que garante os nossos direitos, por meio de iniciativas
legislativas como a Proposta de Emenda Constitucional - PEC 215 de 2000, o
PL sem número proposto pelo senador Romero Jucá que altera o Artigo 231,
parágrafo sexto, a PEC 237 que trata do arrendamento das terras indígenas
e o Projeto de Lei Complementar 227, que tem o mesmo propósito do PL do
dito senador.
- O governo da Presidente
Dilma, mesmo tendo se declarado contrário à PEC 215, pouco tem feito para
conter esta temerosa ofensiva, que no atual momento se configura como um
plano genocida, de extermínio dos nossos povos, pois com seu peculiar
silêncio mostra concordar que os nossos direitos territoriais sejam suprimidos,
apesar de que na “Carta aos Povos Indígenas do Brasil”, publicada pela
então candidata nas últimas eleições, tenha afirmado trabalhar visando
“novos avanços, particularmente na demarcação das terras indígenas, dentro
dos marcos da nossa Constituição”.
- Declarações dessa natureza
se tornam vazias quando o governo se omite de orientar a sua bancada de
sustentação para conter os ataques sistemáticos aos direitos indígenas no
Congresso Nacional e quando toma a determinação de suspender o processo de
demarcação das terras indígenas, pois assim parece concordar com os
objetivos dos ruralistas de invadir, explorar e mercantilizar os nossos
territórios e suas riquezas, para o qual querem interferir nos processos
de demarcação, reabrir processos concluídos e parar totalmente os
processos de demarcação.
Jamais a presidente Dilma diria para os povos indígenas o que falou para
a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), na posse de sua presidente
senadora Kátia Abreu: "Quero a CNA ao meu lado... Proponho mais que isso.
Quero o produtor rural tomando decisões junto comigo, participando do governo e
atuando diretamente na definição de novas políticas". Isso para uma
entidade que considera os povos indígenas e quilombolas empecilhos ao
“desenvolvimento”.
- Diante deste quadro de
ameaças e ataques, reafirmamos a nossa determinação de continuar em luta
para defender os nossos direitos, para o qual esperamos contar com o apoio
de outros movimentos e organizações sociais e da opinião pública nacional
e internacional, exigindo do Estado brasileiro a efetivação das seguintes
reivindicações:
·
Demarcação de terras indígenas, com
dotação orçamentária necessária. Há um passivo de mais de 60% de áreas não
demarcadas.
·
Proteção, fiscalização e desintrusão
das terras indígenas, assegurando condições de sustentabilidade aos nossos
povos.
·
Inviabilizar iniciativas legislativas
(PECs, PLs) que buscam suprimir os direitos indígenas assegurados pela
Constituição Federal, em favor de uma agenda positiva.
·
Aprovação do projeto de lei e
efetivação do Conselho Nacional de Política Indigenista, instância
deliberativa, normativa e articuladora de políticas e ações atualmente
dispersas nos distintos órgãos de governo.
·
Aplicação da Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países Independentes da Organização Internacional
do Trabalho (OIT), em todos os assuntos de nosso interesse.
·
Implementação efetiva do Subsistema
de Saúde Indígena, através do fortalecimento da Secretaria Especial de SaúdeIndígena (SESAI) para superar o atual quadro de caos e abandono.
·
Garantia de acesso à educação de
qualidade, específica e diferenciada, nas aldeias, na terra indígena ou próxima
a ela.
·
Garantir a participação de indígenas
no Conselho Nacional de Incentivo à Cultura e a criação de instância específica
para atender as demandas das nossas culturas.
·
Compromisso com o fim da
criminalização, o assassinato e a prisão arbitrária de lideranças indígenas que
lutam pela defesa dos direitos territoriais de seus povos. Nesse sentido
exigimos a imediata soltura das nossas lideranças que foram presas, no dia de
ontem, apenas por se manifestarem contra a inconstitucional PEC 215.
Mobilização Indígena Nacional
Brasília – DF, 17 de dezembro de 2014.
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