[Folha de S.Paulo] Embora em
voga, o conceito de sustentabilidade ainda é pouco compreendido tanto por quem
fala sobre ele quanto por quem o ouve. Nos últimos anos, intensificou-se a
discussão a respeito do aquecimento global e do esgotamento dos recursos
naturais. São preocupações legítimas e inquestionáveis, mas que geraram
distorção no significado de sustentabilidade, restringindo-o às questões
ambientais.
Não é só isso. A sustentabilidade está diretamente associada aos
processos que podem se manter e melhorar ao longo do tempo. A
insustentabilidade comanda processos que se esgotam. E isso depende não apenas
das questões ambientais. São igualmente fundamentais os aspectos sociais,
econômicos, políticos e culturais.
A sustentabilidade e a insustentabilidade se tornam claras quando
traduzidas em situações práticas. Esgotar recursos naturais não é sustentável.
Reciclar e evitar desperdícios é sustentável.
Corrupção é insustentável. Ética é sustentável. Violência é
insustentável. Paz é sustentável. Desigualdade é insustentável. Justiça social
é sustentável. Baixos indicadores educacionais são insustentáveis. Educação de
qualidade para todos é sustentável.
Ditadura e autoritarismo são insustentáveis. Democracia é sustentável.
Trabalho escravo e desemprego são insustentáveis. Trabalho decente para todos é
sustentável. Poluição é insustentável. Ar e águas limpos são sustentáveis.
Encher as cidades de carros é insustentável. Transporte coletivo e de
bicicletas é sustentável.
Solidariedade é sustentável. Individualismo é insustentável. Cidade
comandada pela especulação imobiliária é insustentável. Cidade planejada para
que cada habitante tenha moradia digna, trabalho, serviços e equipamentos
públicos por perto é sustentável.
Sociedade que maltrata crianças, idosos e deficientes não é sustentável.
Sociedade que cuida de todos é sustentável. Dados científicos mostram que o
atual modelo de desenvolvimento é insustentável e ameaça a sobrevivência
inclusive da espécie humana.
Provas não faltam. Destruímos quase a metade das grandes florestas do
planeta, que são os pulmões do mundo. Liberamos imensa quantidade de dióxido de
carbono e outros gases causadores de efeito estufa, num ciclo de aquecimento
global e instabilidades climáticas.
Temos solapado a fertilidade do solo e sua capacidade de sustentar a
vida: 65% da terra cultivada foram perdidos e 15% estão em processo de
desertificação.
Cerca de 50 mil espécies de plantas e animais desaparecem todos os anos
e, em sua maior parte, em decorrência de atividades humanas. Produzimos uma
sociedade planetária escandalosa e crescentemente desigual: 1.195 bilionários
valem, juntos, US$ 4,4 trilhões –ou seja, quase o dobro da renda anual dos 50%
mais pobres. O 1% de mais ricos da humanidade recebe o mesmo que os 57% mais
pobres.
Os gastos militares anuais passam de US$ 1,5 trilhão, o equivalente a
66% da renda anual dos 50% mais pobres. Esse cenário pouco animador mostra a
necessidade de um modelo de desenvolvimento sustentável. Cabe a nós torná-lo
possível e viável.
Autoria: Oded Grajew
Oded Grajew é empresário, coordenador
da secretaria executiva da Rede Nossa São Paulo e presidente emérito do
Instituto Ethos. É idealizador do Fórum Social Mundial
Artigo de Oded Grajew publicado na Folha
de São Paulo e socializado pelo Jornal da
Ciência / SBPC, JC e-mail 4720.
EcoDebate, 09/05/2013
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