Blog do Professor Márcio

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quarta-feira, 29 de maio de 2013

Lançamento do Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração

Mais de 30 organizações e movimentos sociais que atuam com o tema mineração, como Ibase, Inesc, MST e Justiça nos Trilhos lançam hoje, quarta-feira (29/5), o Comitê Nacional em Defesa dos Territórios frente à Mineração, a partir das 9h30, na sede da OAB, em Brasília.

Durante o evento, elas irão apresentar sete desafios mínimos que devem ancorar o debate público sobre o Novo Código Mineral Brasileiro.

O principal objetivo da iniciativa é enfrentar o debate do novo Código da Mineração do Brasil, construído até o momento às portas fechadas pelo governo brasileiro. Por esse motivo, as entidades se uniram desde o ano passado com o objetivo de trocar e acumular conhecimento sobre o cenário da mineração no Brasil – atividade que compreende uma expansão acelerada e movimenta mais de 1,5 bilhões de toneladas de minérios por ano, acarretando fortes impactos sociais e ambientais.

Depois de várias reuniões, seminários e debates, as organizações chegaram a um consenso mínimo e elencaram os principais itens que devem constar no novo marco regulatório do setor.


A preocupação é a abertura do debate do novo Código de Mineração para a população. É fundamental que o setor mineral seja regulado para que a atividade seja desenvolvida em benefício da sociedade e respeitando direitos das populações atingidas, do meio ambiente e dos trabalhadores, caso contrário, o novo Código só atenderá aos interesses de grande empresários e não da população.

Confira abaixo os sete desafios defendidos pelas organizações para a construção do novo Código da Mineração:

– Garantir democracia e transparência na formulação e aplicação da política mineral brasileira;
2 – Garantir o direito de consulta, consentimento e veto das comunidades locais afetadas pelas atividades mineradoras;
–  Respeitar taxas e ritmos de extração;
4 – Delimitar e respeitar áreas livres de mineração ;
5 – Controlar os danos ambientais e garantir Planos de Fechamento de Minas com contingenciamento de recursos;
6 – Respeitar e proteger os Direitos dos Trabalhadores;
7 – Garantir que a Mineração em Terras Indígenas respeite a Convenção 169 da OIT e esteja subordinada à aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas.

quinta-feira, 9 de maio de 2013

O que é (e o que não é) sustentabilidade

[Folha de S.Paulo] Embora em voga, o conceito de sustentabilidade ainda é pouco compreendido tanto por quem fala sobre ele quanto por quem o ouve. Nos últimos anos, intensificou-se a discussão a respeito do aquecimento global e do esgotamento dos recursos naturais. São preocupações legítimas e inquestionáveis, mas que geraram distorção no significado de sustentabilidade, restringindo-o às questões ambientais.
Não é só isso. A sustentabilidade está diretamente associada aos processos que podem se manter e melhorar ao longo do tempo. A insustentabilidade comanda processos que se esgotam. E isso depende não apenas das questões ambientais. São igualmente fundamentais os aspectos sociais, econômicos, políticos e culturais.
A sustentabilidade e a insustentabilidade se tornam claras quando traduzidas em situações práticas. Esgotar recursos naturais não é sustentável. Reciclar e evitar desperdícios é sustentável.
Corrupção é insustentável. Ética é sustentável. Violência é insustentável. Paz é sustentável. Desigualdade é insustentável. Justiça social é sustentável. Baixos indicadores educacionais são insustentáveis. Educação de qualidade para todos é sustentável.
Ditadura e autoritarismo são insustentáveis. Democracia é sustentável. Trabalho escravo e desemprego são insustentáveis. Trabalho decente para todos é sustentável. Poluição é insustentável. Ar e águas limpos são sustentáveis. Encher as cidades de carros é insustentável. Transporte coletivo e de bicicletas é sustentável.
Solidariedade é sustentável. Individualismo é insustentável. Cidade comandada pela especulação imobiliária é insustentável. Cidade planejada para que cada habitante tenha moradia digna, trabalho, serviços e equipamentos públicos por perto é sustentável.
Sociedade que maltrata crianças, idosos e deficientes não é sustentável. Sociedade que cuida de todos é sustentável. Dados científicos mostram que o atual modelo de desenvolvimento é insustentável e ameaça a sobrevivência inclusive da espécie humana.
Provas não faltam. Destruímos quase a metade das grandes florestas do planeta, que são os pulmões do mundo. Liberamos imensa quantidade de dióxido de carbono e outros gases causadores de efeito estufa, num ciclo de aquecimento global e instabilidades climáticas.
Temos solapado a fertilidade do solo e sua capacidade de sustentar a vida: 65% da terra cultivada foram perdidos e 15% estão em processo de desertificação.
Cerca de 50 mil espécies de plantas e animais desaparecem todos os anos e, em sua maior parte, em decorrência de atividades humanas. Produzimos uma sociedade planetária escandalosa e crescentemente desigual: 1.195 bilionários valem, juntos, US$ 4,4 trilhões –ou seja, quase o dobro da renda anual dos 50% mais pobres. O 1% de mais ricos da humanidade recebe o mesmo que os 57% mais pobres.
Os gastos militares anuais passam de US$ 1,5 trilhão, o equivalente a 66% da renda anual dos 50% mais pobres. Esse cenário pouco animador mostra a necessidade de um modelo de desenvolvimento sustentável. Cabe a nós torná-lo possível e viável.
Autoria: Oded Grajew
Oded Grajew é empresário, coordenador da secretaria executiva da Rede Nossa São Paulo e presidente emérito do Instituto Ethos. É idealizador do Fórum Social Mundial
Artigo de Oded Grajew publicado na Folha de São Paulo e socializado pelo Jornal da Ciência / SBPC, JC e-mail 4720.

EcoDebate, 09/05/2013

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Aquecimento global e suas implicações para o futuro humano

Entrevista com Ernesto Lavina
“As pessoas duvidam que exista uma evidência física de que o mundo está mudando. Ela existe sim, e são as geleiras”, afirma o geólogo.
“Estamos em um momento realmente crucial. Todas as vezes, nos últimos 800 mil anos, em que a temperatura média da Terra atingiu patamares como os atuais, entramos em um novo período frio, que culmina com período glacial. Como não há nada de novo acontecendo em termos tectônicos na Terra, poderíamos dizer que dentro de um período de 10 a 15 mil anos entraremos em uma nova era glacial. É um palpite, em função de que a memória da Terra tende a prevalecer”, afirma Ernesto Lavina, professor da Unisinos, em entrevista concedida, por telefone, à IHU On-Line.
Segundo ele, “o vulcanismo é a chave de tudo o que acontece na Terra. Só que, paralelamente a isso, temos a interferência humana”.
O geólogo explica que “se não existisse o efeito estufa, a temperatura média da Terra seria algo como 18ºC abaixo de zero. Na verdade, o efeito estufa não é o vilão por si só. É o acúmulo, principalmente do vapor d’água, do CO2 e um pouquinho de metano e ozônio, que fazem com que a temperatura seja algo hoje entre 13 e 14ºC acima de zero”.
O tema desta entrevista será o tema da conferência que o geólogo e professor proferirá na próxima terça-feira, dia 07-05-2013, na Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros, no IHU, das 19h30 às 22h, na programação do I Seminário que prepara o XIV Simpósio Internacional IHU – Revoluções Tecnocientíficas, Culturas, Indivíduos e Sociedades. A modelagem da vida, da produção do conhecimento e dos produtos tecnológicos para a tecnociência contemporânea que ocorrerá de 21 a 24 de outubro de 2014.
Ernesto Lavina é geólogo e doutor em Geociências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. É professor na Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos. Tem experiência na área de Geociências, atuando na área de geologia sedimentar.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O senhor pode falar sobre as principais mudanças climáticas ao longo da história da Terra?
Ernesto Lavina – A Terra, ao longo do tempo, alterna períodos quentes com períodos frios. A nossa época (atual) é considerada um período frio, em que existem calotas polares. A observação e o estudo do registro geológico, pelo menos nesse último bilhão de anos (ou nesses últimos mil milhões de anos) mostra que ele pode ser dividido em duas partes. A primeira, de 1 bilhão de anos até 550 milhões de anos atrás, é de quando o planeta foi muito frio, mais frio até do que hoje. Havia muitas geleiras espalhadas pelas latitudes médias e altas. Houve um momento, em torno de 640 milhões de anos atrás, em que toda a Terra se congelou, inclusive o Equador. É a teoria da Bola de Neve.
Outra coisa que é preciso entender: a Terra é um planeta vulcânico. Todo o sistema e a atmosfera da Terra – e seu ecossistema – se mantêm por causa do vulcanismo. Se não existisse o vulcanismo, nós não estaríamos aqui. Estamos a aproximadamente 150 milhões de quilômetros do sol. Isso é uma distância imensa. Se não existisse o efeito estufa, a temperatura média da Terra seria algo como 18ºC abaixo de zero. Na verdade, o efeito estufa não é o vilão por si só. É o acúmulo, principalmente do vapor d’água, do CO2 e um pouquinho de metano e ozônio, que fazem com que a temperatura seja algo hoje entre 13 e 14ºC acima de zero. Toda essa diferença é devida à acumulação de vapor d’água e de CO2, principalmente. O nitrogênio e o oxigênio, que são os gases que compõem 99% da atmosfera da Terra, são absolutamente transparentes à radiação infravermelha. Isso significa que eles não absorvem nem emitem calor.
Tudo o que acontece na Terra tem a ver com esse pequeno percentual de vapor d’água e CO2 na atmosfera. Então, as principais mudanças ao longo do tempo geológico se resumem à alternância de momentos de frio e calor. Como essa que eu citei, de um bilhão de anos até 550 milhões de anos, quando a Terra foi muito fria, sendo que culminou num momento em que a temperatura caiu abaixo de zero e se pensa que deve ter havido um manto de gelo com até dois quilômetros de espessura cobrindo todo o planeta. E depois, em uma fase de um vulcanismo gigantesco, o planeta aqueceu. E daí entramos nesses últimos 500 milhões de anos em que o planeta foi, na maior parte do tempo, bem mais quente do que hoje, o que significa que não havia gelo, inclusive nos polos.
Quando olhamos a história da Terra, os momentos em que existe gelo dos polos nesses últimos 550 milhões de anos são muito raros. Um momento é o atual. Houve um outro, há 300 milhões de anos, e outro, pequeno, há 444 milhões de anos. Fora isso, a Terra era bem mais quente do que hoje e o nível do mar era muito mais alto.
IHU On-Line – O que mais contribui para o aumento do aquecimento global: as mudanças cíclicas da Terra ou a ação danosa do ser humano ao meio ambiente?
Ernesto Lavina – Na história da Terra, da qual o homem não faz parte, são as mudanças naturais, e aqui cito o vulcanismo, que joga em dois times. Um tipo de vulcanismo libera uma quantidade muito grande de CO2 na atmosfera, mas libera pouca cinza vulcânica. Esse vulcanismo, ao longo do tempo, vai produzindo o efeito estufa. O CO2 vai absorvendo a radiação infravermelha, o calor, e o planeta vai esquentando. Só que existe um outro tipo de vulcanismo, que joga uma quantidade gigantesca de cinzas para a atmosfera superior. É uma explosão. A câmara magmática vira literalmente pó. Se esse pó estiver em volume suficiente para bloquear ou diminuir a radiação solar que chega à Terra, ocorre o que se chama de inverno vulcânico: o planeta congela instantaneamente. Isso aconteceu há 74 mil anos. O mundo passou por uma era glacial que quase extinguiu a humanidade. Ao longo do tempo geológico, o vulcanismo é a chave de tudo o que acontece na Terra. Só que, paralelamente a isso, temos a interferência humana.
Informações da internet
Ao fazer uma pesquisa na internet fiquei impressionado com o grau de desinformação das pessoas. Existe muita falácia nessa questão do aquecimento global. As pessoas se perguntam na internet como se pode falar em aquecimento global antes de existir o aparelho que media o CO2. Ora, se pode sim. Aquela neve que cai nas geleiras vai aprisionando bolhas de ar. De modo que o gelo tem uma quantidade grande de bolhas de ar aprisionada. Então se pode, tirando o testemunho das grandes geleiras do planeta, medir diretamente o teor das bolhas de ar. Podemos estudar hoje os últimos 800 mil anos da história da Terra a partir das bolhas de ar. O que se mostra é que nos últimos 800 mil anos o teor de CO2 na atmosfera mal chegou a 300 ppms.
A partir da revolução industrial, o CO2 começa a subir e desde 1983 ele literalmente dá um salto, com a curva de subida ficando quase vertical. Isso é dado objetivo. As pessoas duvidam que exista uma evidência física de que o mundo está mudando. Ela existe sim e são as geleiras. É impressionante a comparação das fotos do início do século com imagens atuais das maiores geleiras do planeta. Eu, que estou acostumado a ver com isso, fiquei assombrado. Isso não é subjetivo. As geleiras estão derretendo, o nível do mar está subindo, o CO2 está aumentando exponencialmente (hoje deve estar cruzando a linha dos 400 ppms).
O homem hoje está produzindo cerca de 10 bilhões de toneladas métricas por ano de CO2. Isso não é um número pequeno. Todo ano, a respiração de todos os seres, os fogos naturais, as fumarolas vulcânicas no fundo do mar e os vulcões de modo geral produzem algo em torno de 150 e 200 bilhões de toneladas métricas de CO2. Daí alguém pode dizer: ah, mas a indústria só produz 10 bilhões, o que é menos de 5%. Então o homem só contribui com 5% do CO2.
Só que aqui temos um outro dado: hoje se sabe que o principal gás do efeito estufa na Terra é o vapor d’água. Se ele é o principal, o CO2 é menos eficiente e o homem só contribui com 5%, então a sociedade industrial não seria a responsável pelo aquecimento global. Só que aqui é preciso ter em conta que existe uma série de ciclos de realimentações.
O gelo, as calotas polares e geleiras são absolutamente sensíveis a qualquer variação na temperatura da terra. Onde o gelo recua, a região onde agora é solo e água, tem capacidade de reter muito mais calor, porque o gelo é reflexivo, ele devolve para o espaço a maior parte da radiação solar que bate sobre ele. Com esse aquecimento da água e do solo, a atividade bacteriana aumenta e o solo chega a ter três vezes mais CO2 do que a atmosfera. Daí chegamos ao limiar do metano.
A Terra possui estoques gigantescos de metano: no fundo dos oceanos, nos solos congelados, nas florestas. O metano é 23 vezes mais eficiente que CO2 para aprisionar calor. Estamos em um momento realmente crucial. Todas as vezes, nos últimos 800 mil anos, em que a temperatura média da Terra atingiu patamares como os atuais, entramos em um novo período frio, que culmina com período glacial. Como não há nada de novo acontecendo em termos tectônicos na Terra, poderíamos dizer que dentro de um período de 10 a 15 mil anos entraremos em uma nova era glacial. É um palpite, em função de que a memória da Terra tende a prevalecer.
IHU On-Line – Como a extração de carvão mineral para uso em usinas termelétricas contribui para o aumento da emissão de CO2 e, consequentemente, para o aumento do aquecimento global?
Ernesto Lavina – Todos nós gostamos de viver com os recursos da tecnologia, mas devemos lembrar que ela necessita de energia, que por sua vez produz CO2. Precisamos esclarecer que CO2 não é poluição. É um dos gases que nos permitem estar aqui. Só que a Terra está em constantes mudanças. Se o CO2 continuar se elevando, o nível do mar e a temperatura média do planeta vão subir. No futuro próximo não vejo maneiras de contornar isso. Porque sem energia as coisas não acontecem. E ela sai justamente da queima do petróleo, do carvão, do gás natural. Toda a queima produz CO2. Tudo o que a nossa sociedade faz, de uma forma ou de outra, libera CO2.
A tendência é de que vamos aumentar cada vez mais as taxas de emissão de CO2. No entanto, aos trancos e barrancos, o mundo está melhorando. Aquela miséria absoluta na Terra está cada vez menor. Por mais que a renda ainda seja mal distribuída, que os ricos sejam muito ricos e os pobres sejam muito pobres, nós estamos evoluindo nesses últimos séculos. Porém, em tudo que se evolui, em cada ponto que avançamos na vida social, há por trás um consumo energia extra, que libera CO2.
IHU On-Line – Este ano será divulgado o quinto relatório do IPCC . O que esperar dele e o que foi feito, na prática, a partir do que foi divulgado nos quatro relatórios anteriores?
Ernesto Lavina – Tudo o que foi feito é muito pouco. Pode-se atacar o problema de várias formas, mas uma maneira essencial é a diminuição da produção de energia. E isso nos tiraria do momento atual, da sociedade tecnológica.
IHU On-Line – E investir em fontes de energia alternativa, renovável?
Ernesto Lavina – Esse é o caminho para o futuro, não tem jeito. No entanto, custa muito dinheiro e ainda não são muito eficientes essas outras formas. A forma mais eficiente, barata e limpa de energia que temos é a mais perigosa, que é a energia nuclear. Se fosse para resolver imediatamente esse problema, teria que se trocar a matriz de produção de energia elétrica do carvão para usinas nucleares. No mundo são raríssimos os países que possuem recursos hídricos para produzir grandes represas, como é o caso do Brasil e mais alguns poucos.
Nota: A primeira imagem que ilustra a entrevista é de http://bit.ly/12GCMxd e a segunda é de http://bit.ly/12GGPtf
(Por Graziela Wolfart)
(Ecodebate, 08/05/2013) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
Publicado em maio 8, 2013 por 
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sexta-feira, 3 de maio de 2013

Manifesto dos pesquisadores e analistas do Serviço Geológico do Brasil sobre o novo marco regulatório da mineração


mineração

O Brasil aguarda a iminente divulgação pelo Governo Federal da proposta do novo Marco Regulatório da Mineração, elaborada pelo Ministério de Minas e Energia. Esta revisão teve início durante o segundo mandato do presidente Lula e hoje, às vésperas do seu lançamento, a ausência de informações claras, evidencia a total falta de diálogo com a Sociedade sobre sua construção.
A proposta de novo Marco deverá ser apresentada ao grande público através de Medida Provisória, Decreto ou por Projetos de Lei enviados ao Congresso Nacional, possivelmente em regime de urgência. Na primeira alternativa, mais provável, passa a vigorar assim que publicado. Em todos os casos, é quase certo que, no Parlamento, qualquer discussão de modificação da proposta seja restrita e controlada pelos aliados da coalizão governista.
Se, por um lado representantes da Indústria Mineral, que foram convidados a contribuir com a elaboração da proposta, reclamam insistentemente da falta de participação do setor na sua criação, por outro fica clara a baixíssima disposição do Governo em realizar qualquer tipo de debate com outros setores da Sociedade ao redor deste tema, em especial com as diversas entidades civis direta ou indiretamente relacionadas à questão mineral, como sindicatos, associações profissionais de empresas públicas e privadas, entidades de classe, sociedades acadêmicas e/ou técnico-científicas, organizações não governamentais, movimentos ativistas de causas sociais e ambientais, associações de atingidos pela mineração, dentre tantos outros.
É emblemática a simples não realização de audiências públicas, em todos esses anos, nem mesmo para debater as linhas mestras do novo Marco. O cenário que vemos hoje é de total desconhecimento, inclusive sobre qual será o papel das instituições públicas relacionadas à questão mineral, como a CPRM (Serviço Geológico do Brasil), até mesmo pelos seus próprios servidores, que tampouco foram convidados para qualquer debate. Também fica a percepção de que estas instituições não estarão aptas para qualquer tipo de mudança, pois já têm hoje problemas estruturais graves, como um quadro de funcionários, especialmente pesquisadores, em número muito insuficiente, sobrecarregado e com tabelas salariais defasadas em relação a outras empresas de governo.
Diante destes fatos, cabem alguns questionamentos. Por que tanta falta de transparência? Por que não expandir o debate para todos os setores da Sociedade? Há algum receio com a diversidade de opinião? Por que apenas um pequeno grupo de servidores, assessores e políticos possui o poder de decidir unilateralmente a melhor proposta de Marco? A quem serve este caráter impositivo? Certamente, não à maioria da população brasileira, que somente perde com a falta de debate aberto e com o vício paternalista das nossas instituições públicas, pensando sozinhas e caladas sobre o que é “melhor” para o país.
Hoje, a indústria de extração e transformação mineral é um dos setores mais importantes da economia. Existe a expectativa de crescimento consistente do setor pelos próximos anos ou décadas, seja pelo esgotamento de reservas no exterior e redução global de oferta de algumas substâncias que o Brasil detém reservas importantes, pelo crescimento da demanda por exportação ou pelo consumo crescente de commodities no mercado doméstico.
Há diversos problemas conhecidos no setor, que passam inicialmente pelo investimento insuficiente (ou, pela má gestão dos recursos) em pesquisa, tecnologia mineral, infraestrutura, inovação, capacitação de recursos humanos, desenvolvimento e fiscalização. Da mesma maneira, nosso atual código mineral é arcaico, ineficiente e privatista, permitindo ou fomentando práticas de mercado que passam pelo capital concentrado nas grandes empresas, pela especulação financeira sobre direitos minerários, pela falta de compartilhamento de informações entre a indústria e o Estado, pela delegação de boa parte do planejamento estratégico do setor à iniciativa privada e pelo baixo comprometimento dos agentes privados com a prevenção, redução e mitigação de impactos sociais e ambientais gerados pelas atividades do setor. A participação do Estado nos lucros da indústria mineral é pequena, seja pelas diversas isenções fiscais já fornecidas ao setor, seja pelo reduzido valor dos royalties da mineração. Ainda é incipiente a cultura da redução de danos pelos executores das atividades mineiras no Brasil. As políticas de fechamento de minas e de construção de cenários pós-mineração são fracas. E sequer existe uma política nacional de gestão e preservação do patrimônio geológico e da geodiversidade, muito menos uma discussão franca e aberta sobre onde não deve haver nenhuma mineração, por fatores sociais, culturais, ambientais ou estratégicos.
O Brasil necessita de um novo Marco Regulatório da Mineração e o setor mineral brasileiro precisa de uma reestruturação. Mas são igualmente necessárias ações de Estado transformadoras, muito além da nova Legislação. É a partir desses termos que a AGEN se coloca neste debate.
Em primeiro lugar, a AGEN apoia a criação de um novo modelo de concessão de áreas, que privilegie, antes de tudo, o interesse público, o planejamento estratégico de longo prazo do Estado e os direitos individuais e coletivos das populações afetadas pela mineração. O novo sistema deve ainda:
  • Fortalecer e ampliar significativamente o quadro técnico, a estrutura e o financiamento das instituições públicas de pesquisa, desenvolvimento tecnológico e fiscalização do setor mineral;
  • Tornar obrigatório o compartilhamento de todos os dados de pesquisa e exploração mineral das empresas com o Estado;
  • Fomentar o desenvolvimento da pequena e média mineração;
  • Estimular a diversificação, descentralização e pulverização dos recursos para investimentos no setor;
  • Impedir a especulação financeira sobre direitos minerários;
  • Priorizar a preservação da biodiversidade e da geodiversidade nas áreas de atividade do setor mineral, através de uma política participativa, realista e eficiente de redução de danos;
  • Determinar a internalização de custos sociais e ambientais no plano de negócios das minas e nos projetos de pesquisa mineral que causarem impactos significativos;
  • Implementar mecanismos que garantam a participação das comunidades locais no planejamento, licenciamento, desenvolvimento, fiscalização e fechamento de todos os empreendimentos mineiros.
Da mesma maneira, a AGEN apoia o aumento dos royalties da mineração, desde que haja vinculação da destinação destes recursos, principalmente, para o desenvolvimento de alternativas pós-mineração, mas também para o desenvolvimento técnico-científico nacional, para realização de melhorias nas áreas de Educação e Saúde públicas, para programas sociais específicos voltados para os atingidos pelas atividades do setor, e para viabilizar instrumentos públicos de fiscalização e auditoria das empresas de mineração.
Por fim, é fundamental a criação de um Conselho Nacional da Mineração, que seja autônomo e independente. Devem lhe estar garantidos o planejamento, gestão e normatização das políticas minerais, bem como a participação na sua composição das entidades públicas e privadas representativas do setor e de membros da sociedade civil organizada.
Os pesquisadores e analistas do Serviço Geológico do Brasil, representados pela AGEN, apelam ao Poder Executivo para que permita um debate amplo, plural e aberto em torno da proposta de Marco Regulatório da Mineração. Colocamo-nos à inteira disposição para debater, e buscar a implementação de um Marco Regulatório da Mineração que abarque tanto as questões estratégicas da política mineral do país, quanto o fortalecimento e estruturação do setor mineral nacional, desde a pesquisa mineral básica até o encerramento de uma mina.

Atenciosamente
Hugo Jose de Oliveira Polo, Presidente da AGEN

EcoDebate, 03/05/2013
Publicado em maio 3, 2013 por 
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