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Blog do Professor Márcio
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domingo, 16 de dezembro de 2018
MSF não pode mais realizar buscas e salvamentos no mar
terça-feira, 25 de setembro de 2018
DESREGULARORES HORMONAIS EM CRIANÇAS BRASILEIRAS
Os desreguladores hormonais presentes em
plásticos e cosméticos e que foram encontrados em crianças brasileiras
Revista IHU-On Line. http://www.ihu.unisinos.br/583063-os-desreguladores-hormonais-presentes-em-plasticos-e-cosmeticos-e-que-foram-encontrados-em-criancas-brasileiras. 25 Setembro 2018.
Diariamente, absorvemos diferentes contaminantes presentes não só no ar,
na água e em alimentos, mas também em diferentes produtos – de garrafas plásticas,
detergentes, papéis emitidos pela máquina de cartão de crédito a esmaltes,
sabonetes e plástico filme.
A reportagem é de Alessandra Goes Alves, publicada por BBC
Brasil, 23-09-2018.
Conhecidas como "desreguladores endócrinos",
algumas destas substâncias podem interferir na síntese e ação de hormônios,
responsáveis por funções como metabolismo, crescimento, desenvolvimento,
reprodução, sono e estado de ânimo.
A fim de verificar o nível de exposição de crianças brasileiras a essas
substâncias, um grupo de pesquisadores analisou a concentração de 65 desreguladores
endócrinos em urinas de 300 crianças das cinco regiões do país, com idades
entre 6 e 14 anos.
Segundo a pesquisa, os compostos químicos associados ao uso de
cosméticos, produtos de cuidado pessoal e plásticos foram encontrados em
concentrações elevadas, principalmente nas regiões Norte e Nordeste do
país.
"Os dados da pesquisa mostram que crianças brasileiras estão
expostas a alguns desreguladores hormonais em concentrações
maiores do que aquelas encontradas em países como EUA, Canadá e China,
que realizam esse estudo mais rotineiramente", diz Bruno Alves Rocha,
pesquisador da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo
de Ribeirão Preto e autor do estudo, publicado na revista
científica Environmental International.
Iniciada em 2016 e realizada em parceria com pesquisadores do Departamento
de Saúde do Estado de Nova York, a pesquisa apontou que a maioria dos desreguladores relacionados
ao uso de cosméticos e produtos de cuidado pessoal foram encontrados em maior
concentração nas meninas.
Esta diferença chegou ao dobro em algumas substâncias - como o triclosan (presente
em desodorantes e sabonetes antibacterianos), alguns parabenos (conservantes) e
alguns benzofenonas (utilizados principalmente na formulação de esmaltes e
presentes em protetores solares, produtos de maquiagem e produtos de cabelo).
"Isso mostra que esses produtos são uma fonte importante de
exposição a estas substâncias", avalia o pesquisador. De acordo com a
consultoria Euromonitor International, o mercado de cosméticos e
produtos de cuidado pessoal voltados ao público infantil no Brasil foi
o terceiro maior do mundo em 2017.
Outro destaque da pesquisa, segundo artigo publicado na revista
Science of the Total Environment, se refere à presença de ftalatos em pelo
menos 90% das amostras de urinas analisadas. A partir do cálculo do nível de
ingestão diária, os pesquisadores apontaram que um terço das crianças
apresentaram níveis tóxicos dessa substância.
Além de compor fragrâncias em produtos como sprays de cabelo, loções
pós-barba, sabões, xampus e perfumes, os ftalatos também são usados como
solventes e na fabricação de plásticos mais flexíveis ou resistentes - estando
presentes em produtos de limpeza, resinas e principalmente em plásticos (como o
policarbonato, plástico filme, embalagens e brinquedos).
Procurada pela BBC News Brasil, a Associação
Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC)
disse que "não está claro o efeito dos ftalatos na saúde humana". E
a Associação Brasileira da Indústria Química (ABIQUIM)
disse que ainda são necessários estudos científicos para entender "quando,
onde e como usar seguramente cada substância".
Consequências ainda desconhecidas
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS),
existem cerca de 800 compostos químicos suspeitos de interferir no sistema
hormonal e "apenas uma pequena fração" dessas substâncias foi
investigada. A organização diz que a falta de dados traz "incertezas sobre
a extensão dos riscos".
"Muitas (dessas substâncias) propiciaram melhorias e progressos ao
longo do século 20, mas ainda precisamos investigar os impactos sobre a saúde
humana, principalmente quando elas estão associadas", diz Denise
Pires de Carvalho, médica da Sociedade Brasileira de Endocrinologia
Médica (SBEM) e professora de biofísica da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
Apesar das divergências na literatura científica sobre quais
concentrações dessas substâncias são consideradas aceitáveis, em 2016, a Comissão
Europeia divulgou uma lista com 66 compostos químicos avaliados de
terem "clara evidência de perturbação da atividade endócrina".
Em 2016, os EUA proibiram a comercialização de
sabonetes antibacterianos que contenham 19 ingredientes químicos, incluindo
o triclosan (agente bactericida), sob a justificativa de não
haver garantias de que essas substâncias sejam seguras. A determinação se
baseou em pesquisas que indicaram que a exposição prolongada às substâncias
analisadas pode provocar alterações hormonais e aumentar a resistência
bacteriana.
Estudos recentes investigam impactos de desreguladores
endócrinos sobre o sistema reprodutor humano. Uma pesquisa
desenvolvida pela Universidade de Rochester, em Nova York,
apontou que alguns ftalatos bloqueiam a ação do hormônio masculino testosterona
em bebês, interferindo no desenvolvimento genital e cerebral de meninos.
Cientistas também investigam se a queda da qualidade do sêmen no mundo,
verificada pela OMS, está relacionada à ação de desreguladores
endócrinos.
Em 2011, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
proibiu a presença do bisfenol A (usado
na produção de plástico policarbonato) em mamadeiras destinadas a crianças de
até 12 meses.
"Hoje sabemos que essa substância está associada à diabete mellitus
e obesidade infantil, além de poder causar puberdade precoce e alterações na
tireoide", afirma Carvalho, da UFRJ.
No estudo do pesquisador da USP, a mineração dos dados –
metodologia que verifica padrões em uma grande quantidade de informações –
apontou que urinas com altas concentrações de diferentes desreguladores também
apresentaram maiores concentrações de 8OHDG, molécula que, em
grande quantidades, indica a ocorrência de lesão nas células.
"Este processo danifica o DNA e favorece a
ocorrência de obesidade, infertilidade, doenças cardiovasculares e alguns tipos
de câncer, principalmente aqueles relacionados ao sistema reprodutor",
explica Rocha.
Um terço dos 65 compostos químicos analisados na pesquisa apareceu
simultaneamente em pelo menos metade das amostras e apresentaram altas
concentrações de 8OHDG, o que indicou a associação entre diferentes
compostos e a ocorrência de estresse oxidativo.
"Analisar a coexposição é importante porque as pessoas não estão em
contato com um só contaminante, mas com vários ao mesmo tempo. Eles atuam
juntos", diz o pesquisador.
Necessidade de investigação
Por e-mail, a Associação Brasileira da Indústria de Higiene
Pessoal Perfumaria e Cosméticos disse que "o estudo é muito
recente e existem variáveis importantes que precisam ser conhecidas/controladas
para poder analisar os resultados identificados."
Já a Associação Brasileira da Indústria Química enfatizou
que, sob a coordenação do Ministério do Meio Ambiente, a Comissão
Nacional de Segurança Química(CONASQ) está formulando um regulatório
nacional que dispõe sobre o cadastro, a avaliação e o controle de substâncias
químicas industriais.
Contatada pela BBC News Brasil, a Anvisa disse
adotar os limites apontados em avaliações conduzidas por autoridades
internacionais e que as listas de substâncias permitidas são resultado de uma
"harmonização entre os Estados do Mercosul e estão de
acordo com o que está sendo praticado em outros países ou blocos, como Estados
Unidos e Europa."
A agência disse que parabenos são conservantes "bem difundidos nas
indústrias e em alguns casos, de difícil substituição por questões de
estabilidade do produto, custos, etc.".
A Anvisa também disse já estar avaliando a redução da
quantidade permitida de alguns parabenos e afirmou ter solicitado ao Mercosul a
redução do limite de ftalatos permitidos em "materiais destinados ao
contato com alimentos para crianças de até três anos."
Questionada se a exposição simultânea é utilizada para definir os
limites aceitáveis dos compostos químicos destacados na pesquisa, a Anvisa disse
que "na maioria dos casos, os limites dizem respeito a análises
individuais."
Princípio da precaução
A diversidade de fontes, a dosagem e a análise dessas substâncias em
conjunto no organismo estão entre os principais desafios para os estudiosos do
tema hoje.
"Falta metodologia para dosar as concentrações desses compostos.
Pequenas contaminações ocorrem diariamente, já que eles estão presentes em
várias coisas. É importante analisar a intensidade das concentrações e o tempo
de exposição a elas. Se uma pessoa está exposta a grandes quantidades de forma
sistemática, haverá efeitos sobre a saúde", pondera Angela Maria
Spinola, endocrinologista pediátrica e professora da Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp).
Ela enfatiza a necessidade de mapear e acompanhar as concentrações
destas substâncias com regularidade, o que não é feito em países como o Brasil.
"A meu ver, ainda não é possível fazer um prognóstico a partir dos dados
da pesquisa da USP. É preciso um acompanhamento em longo prazo para
verificar se as crianças brasileiras desenvolvem doenças a partir das altas
concentrações de alguns contaminantes", avalia Angela.
Alguns estudos indicam que a contaminação por parabenos e benzofenonas
também podem estar relacionados à puberdade precoce e ao aumento de câncer de
mama em indivíduos suscetíveis.
"Testes in vitro e em animais de laboratório mostraram que essas
substâncias têm ações estrogênicas (agindo como os esteroides sexuais
femininos) e antiandrogênicos (inibindo a ação de hormônios sexuais
masculinos). Os efeitos em humanos estão sendo estudados, por isso o princípio
da precaução é necessário", diz Denise.
Aplicado pela Anvisa na proibição do Bisfenol A, este
princípio prevê a adoção de medidas de proteção "sem ter que aguardar que
a seriedade dos riscos se torne aparente" sempre que haja "incerteza
sobre a existência ou amplitude dos riscos para a saúde humana".
"Devemos evitar contaminações, porque ainda não conseguimos definir
qual a dose mínima de desreguladores endócrinos que
não causam efeitos ruins no nosso organismo", avalia a professora da UFRJ.
Como se prevenir?
De acordo com especialistas ouvidas pela BBC News Brasil,
ações cotidianas podem contribuir para diminuir a exposição a desreguladores
endócrinos.
"É fundamental ler os rótulos dos produtos e procurar evitar
aqueles que tenham desreguladores em sua composição.
Principalmente mulheres grávidas, já que elas podem armazenar essas substâncias
no tecido adiposo e liberar para o feto através da placenta", diz Denise.
Outra recomendação se refere ao cuidado com o manuseio de embalagens de
alimentos.
"A contaminação dos alimentos pode ocorrer a partir de fissuras
causadas nas embalagens", explica Angela. Por isso, é
recomendado não esquentar ou congelar alimentos em recipientes ou embalagens
plásticas, priorizar vidro em vez de plásticos e evitar o consumo de alimentos
enlatados (cuja embalagem é revestida de bisfenol A).
quarta-feira, 4 de julho de 2018
O CUSTO HUMANO DOS AGROTÓXICOS
Terça-feira, 3 de julho de 2018.
Atrofia muscular, câncer, mutações genéticas, hidrocefalia e retardo mental são algumas das condições que afetam crianças e adultos nas províncias de Misiones, Entre Ríos e Chaco, no nordeste rural da Argentina, onde o glifosato, herbicida comercializado pela Monsanto sob o nome comercial de Roundup, é utilizado em grande escala. Em O custo Humano, o fotógrafo argentino Pablo Piovano retrata o efeito devastador do uso indiscriminado de agrotóxicos por aqueles que trabalham no plantio ou vivem nos arredores. O artista também é responsável por documentário do mesmo nome.
As fotos já tem mais de dois anos, mas o assunto continua extremamente atual, especialmente no Brasil, em que a chamada PL do Veneno, foi aprovada na Câmara dos Deputados na última semana. Entre outros, o projeto de lei quer mudar o nome dos agrotóxicos para “defensivos agrícolas” e “produtos fitossanitários”, conceder licenças temporárias e proibir apenas substâncias que apresentem “risco inaceitável”.
Confirma a seguir algumas das fotografias.
1º ENCONTRO MINEIRO SOBRE DÍVIDA ECOLÓGICA
1º ENCONTRO MINEIRO SOBRE DÍVIDA ECOLÓGICA
PROGRAMAÇÃO
MANHÃ
08:00 - Chegada e recepção dos participantes
08:30 - Abertura
08:45 - 1º Painel – Adriano Peixoto (Moderador)
Palestra: Dívida Ecológica: somos credores.
Maria Lúcia Fattorelli
Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida
Palestra: Governança ambiental, a questão territorial e a divida ecológica
Klemens Laschefski
Profª do IGC/UFMG
Pesquisador do GESTA- Grupo de Estudos em Temáticas Ambientais/UFMG
09:45 - Perguntas e comentários
10:15 - Coffe Break (caseiro e agroecológico) - Traga sua caneca ou garrafinha.
10:30 - 2º Painel – Maria Lúcia Fattorelli (Moderadora)
Palestra: Produção e qualidade das águas na natureza: como mensurar o seu valor?
Marcus Vinícius Polignano
Médico, Professor e Coordenador do Projeto Manuelzão/UFMG
Palestra: Amputação da vida e da esperança: como mensurar?
Patrícia Generoso Thomaz Guerra
Integrante da REAJA -Rede de Articulação e Justiça Ambiental dos Atingidos pelo Projeto Minas-Rio
Conselheira do CBH Santo Antônio (FONASC)
Palestra: Um direito para a ecologia da restauração
Luciano J. Alvarenga
Mestre e doutorando em Ciências Naturais pela UFOP
Bacharel em Direito pela UFMG
Assessor no Ministério Público de Minas Gerais
12:00 - Perguntas e comentários
12:30 - Intervalo para almoço
TARDE
14:00 - Reflexão “Povos indígenas, Rio Watu e Pachamama”
14:30 - Grupos de Trabalho
15:45 - Apresentação da síntese dos grupos de trabalho
16:30 - Propostas, encaminhamentos e avaliação
17:00 - Encerramento
terça-feira, 12 de junho de 2018
SOBERANIA NACIONAL???
Governo vai ceder uso da Base de Alcântara sem transferência tecnológica
Redação do Site Inovação Tecnológica - 05/06/2018
O primeiro foguete brasileiro com propulsor a etanol foi lançado em Alcântara.[Imagem: Ministério da Aeronáutica/Divulgação]
O governo dos Estados Unidos anunciou que irá iniciar negociações com o Brasil para selar um acordo de salvaguardas tecnológicas para utilização da Base de Lançamento de Alcântara.
O acordo de salvaguardas significa que os EUA terão controle total das operações, impedindo que o Brasil possa ter acesso às tecnologias. Ainda não está definido se outros países também poderão utilizar as plataformas de lançamento sem autorização norte-americana.
Vários países já haviam manifestado interesse em utilizar a base de Alcântara, devido à sua posição favorável, perto do Equador. Essa posição economiza combustível para lançamento de satélites.
Terreno de aluguel
Durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, o Brasil tentou fechar um acordo com os Estados Unidos para poder viabilizar o uso comercial da base para outros países.
O Congresso brasileiro, entretanto, barrou a entrada em vigor do acordo, por acreditar que ele feria a soberania brasileira ao garantir segredos tecnológicos norte-americanos.
A sanha privatizante do governo Michel Temer parece ser ainda maior, e o presidente parece acreditar que o atual Congresso autorizará o acordo. Mas há poucas chances de que o acordo seja concluído antes do fim deste governo.
"Se você não tiver um acordo que garanta a propriedade intelectual dos foguetes e dos satélites que serão lançados, nenhum satélite e nenhum foguete poderá ser lançado, pois a grande maioria dos lançamentos carregam tecnologia [norte-]americana", defendeu o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Aloysio Nunes.
O ministro também argumentou que o acordo não viola a soberania brasileira e que o governo norte-americano quer "a defesa dos seus segredos comerciais, o que é legítimo".
Mas o ministro nada falou sobre o legítimo interesse do Brasil em desenvolver sua indústria aeroespacial e utilizar sua base de lançamento como algo mais do que um terreno de aluguel.
quarta-feira, 25 de abril de 2018
RETIRADA DO SÍMBOLO DE IDENTIFICAÇÃO TRANSGÊNICO
Da temeridade ambiental à afronta aos direitos constitucionais.
Entrevista especial com Leonardo Melgarejo
IHU
A decisão da Comissão de Meio Ambiente do Senado, de aprovar a retirada do símbolo de identificação de transgênico em rótulos de produtos alimentícios, atende aos interesses do mercado e é “uma temeridade sob o ponto de vista ambiental” e “um crime contra direitos constitucionais, uma afronta à legislação, no que tange a direitos dos consumidores”, diz o engenheiro agrônomo Leonardo Melgarejo à IHU On-Line. Para ele, a argumentação da Comissão de Meio Ambiente do Senado se baseia em uma “mitologia criada pelas indústrias beneficiadas pela ocultação de danos e riscos associados aos transgênicos. Afirmam que ‘inexistem evidências de danos’, quando há farta bibliografia apontando problemas. Afirmam que há farta bibliografia apontando inexistência de riscos, quando a maior parte destes estudos são elaborados, patrocinados ou associados às empresas beneficiadas. Afirmam que tais estudos são robustos, quando existem evidências de fragilidade no prazo de análise, no tamanho e na representatividade das amostras”.
Segundo ele, se a medida for aprovada definitivamente, “facilitará alocação de recursos públicos para as lavouras transgênicas, bem como a rolagem e o perdão de dívidas do agronegócio a elas associado”. A decisão, frisa, também “beneficiará o mercado de agrotóxicos, especialmente de herbicidas, com as implicações conhecidas”.
A tendência de aprovação é enorme. A única possibilidade de reversão neste processo de degradação das normas e contratos sociais reside na reação da população, o que depende de acesso a informações que não circulam na grande mídia. Iniciativas como esta, do IHU, contribuem de forma expressiva, mas são insuficientes para dar conta do problema. Precisamos de uma Voz do Brasil, umacadeia de mídia verdadeira preocupada e comprometida com os interesses nacionais.
Leonardo Melgarejo é engenheiro agrônomo e doutor em Engenharia de Produção. É vice-presidente regional Sul da Associação Brasileira de Agroecologia.
quarta-feira, 28 de março de 2018
FÓRUM ALTERNATIVO MUNDIAL DA ÁGUA
Declaração final do Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA 2018) reafirma: ‘água não é mercadoria, a água é do povo’
Nesta quinta-feira (22), Dia Mundial da Água, encerrou-se o Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA), que reuniu cerca de 7 mil pessoas por cinco dias em Brasília (DF), como contraponto ao fórum das corporações – Fórum Mundial da Água.
Foto: Matheus Alves
Compreendendo o FAMA como algo maior que um evento, as organizações que convergiram na construção da luta pela água divulgam esta declaração final. O compromisso fundamental é de se manter em luta, enraizar os processos de construção até aqui realizados e manter a mobilização viva.
O documento reafirma a luta contra qualquer privatização e o estabelecimento de propriedade privada da água. O FAMA defende a água como um bem comum, ou seja, que deve ser controlado e estar a serviço do povo, reforçando o lema do encontro: “Água é direito, não mercadoria”.
Assinam o documento 36 organizações. As demais entidades do Brasil e do mundo que quiserem subscrever o documento, devem enviar solicitação, até o dia 12 de abril, à Secretaria Operativa do FAMA, pelos e-mails: operativafama@gmail.com/metodologiafama2018@gmail.com.
Confira abaixo a íntegra da declaração:
DECLARAÇÃO FINAL DO FÓRUM ALTERNATIVO MUNDIAL DAS ÁGUAS
Quem somos
Nós, construtores e construtoras do Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA), reunidos de 17 a 22 de março de 2018, em Brasília, declaramos para toda a sociedade o que acumulamos após muitos debates, intercâmbios, sessões culturais e depoimentos ao longo de vários meses de preparação e nestes últimos dias aqui reunidos. Somos mais de 7 mil trabalhadores e trabalhadoras da cidade e do campo, das águas e das florestas, representantes de povos originários e comunidades tradicionais, articulados em 450 organizações nacionais e internacionais de todos os continentes. Somos movimentos populares, tradições religiosas e espiritualidades, organizações não governamentais, universidades, pesquisadores, ambientalistas, organizados em grupos, coletivos, redes, frentes, comitês, fóruns, institutos, articulações, sindicatos e conselhos.
Na grandeza dos povos, trocamos experiências de conhecimento, resistência e de luta. E estamos conscientes que a nossa produção é para garantir a vida e sua diversidade. Estamos aqui criando unidade e força popular para refletir e lutar juntos e juntas pela água e pela vida nas suas variadas dimensões. O que nos faz comum na relação com a natureza é garantir a vida. A nossa luta é a garantia da vida. É isso que nos diferencia dos projetos e das relações do capital expressos no Fórum das Corporações – Fórum Mundial da Água.
Também estamos aqui para denunciar a 8º edição do Fórum Mundial da Água (FMA), o Fórum das Corporações, evento organizado pelo chamado Conselho Mundial da Água, como um espaço de captura e roubo das nossas águas. O Fórum e o Conselho são vinculados às grandes corporações transnacionais e buscam atender exclusivamente a seus interesses, em detrimento dos povos e da natureza.
Nossas constatações sobre o momento histórico
O modo de produção capitalista, historicamente, concentra e centraliza riqueza e poder, a partir da ampliação de suas formas de acumulação, intensificação de seus mecanismos de exploração do trabalho e aprofundamento de seu domínio sobre a natureza, gerando a destruição dos modos de vida. Vivemos em um período de crise do capitalismo e de seu modelo político representado pela ideologia neoliberal, na qual se busca intensificar a transformação dos bens comuns em mercadoria, através de processos de privatização, precificação e financerização.
A persistência desse modelo tem aprofundado as desigualdades e a destruição da natureza, através dos planos de salvamento do capital nos momentos de aprofundamento da crise. Nesse cenário, as ações do capital são orientadas pela manutenção a qualquer custo das suas taxas de juros, lucro e renda.
Esse modelo impõe à América Latina e ao Caribe o papel de produtores de artigos primários e fornecedores de matéria prima, atividades econômicas intensivas em bens naturais e força de trabalho. Subordina a economia desses países a um papel dependente na economia mundial, sendo alvos prioritários dessa estratégia de ampliação da exploração a qualquer custo.
O Brasil, que sedia esta edição do FAMA, é exemplar nesse sentido. O golpe aplicado recentemente expõe a ação coordenada de corporações com setores do parlamento, da mídia e do judiciário para romper a ordem democrática e submeter o governo nacional a uma agenda que atenda seus interesses rapidamente. A mais dura medida orçamentária do mundo foi implantada em nosso país, onde o orçamento público está congelado por 20 anos, garantindo a drenagem de recursos públicos para o sistema financeiro e criando as bases para uma onda privatizante, incluindo aí a infraestrutura de armazenamento, distribuição e saneamento da água.
Quais são as estratégias das corporações para a água?
Identificamos que o objetivo das corporações é exercer o controle privado da água através da privatização, mercantilização e de sua titularização, tornando-a fonte de acumulação em escala mundial, gerando lucros para as transnacionais e ao sistema financeiro. Para isso, estão em curso diversas estratégias que vão desde o uso da violência direta até formas de captura corporativa de governos, parlamentos, judiciários, agências reguladoras e demais estruturas jurídico-institucionais para atuação em favor dos interesses do capital. Há também uma ofensiva ideológica articulada junto aos meios de comunicação, educação e propaganda que buscam criar hegemonia na sociedade contrária aos bens comuns e a favor de sua transformação em mercadoria.
O resultado desejado pelas corporações é a invasão, apropriação e o controle político e econômico dos territórios, das nascentes, rios e reservatórios, para atender os interesses do agronegócio, hidronegócio, indústria extrativa, mineração, especulação imobiliária e geração de energia hidroelétrica. O mercado de bebida e outros setores querem o controle dos aquíferos. As corporações querem também o controle de toda a indústria de abastecimento de água e esgotamento sanitário para impor seu modelo de mercado e gerar lucros ao sistema financeiro, transformando direito historicamente conquistado pelo povo em mercadoria. Querem ainda se apropriar de todos os mananciais do Brasil, América Latina e dos demais continentes para gerar valor e transferir riquezas de nossos territórios ao sistema financeiro, viabilizando o mercado mundial da água
Denunciamos as transnacionais Nestlé, Coca-Cola, Ambev, Suez, Veolia, Brookfield (BRK Ambiental), Dow AgroSciences, Monsanto, Bayer, Yara, os organismos financeiros multilaterais, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional, e ONGs ambientalistas de mercado, como The Nature Conservancy e Conservation International, entre outras que expressam o caráter do “Fórum das Corporações”. Denunciamos o crime cometido pela Samarco, Vale e BHP Billiton, que contaminou com sua lama tóxica o Rio Doce, assassinando uma bacia hidrográfica inteira, matando inúmeras pessoas, e até hoje seu crime segue impune. Denunciamos o recente crime praticado pela norueguesa Hydro Alunorte que despejou milhares de toneladas de resíduos da mineração através de canais clandestinos no coração da Amazônia e o assassinato do líder comunitário Sergio Almeida Nascimento que denunciava seus crimes. Exemplos como esses têm se reproduzido por todo o mundo.
Os povos têm sido as vítimas desse avanço do projeto das corporações. As mulheres, povos originários, povos e comunidades tradicionais, populações negras, migrantes e refugiados, agricultores familiares e camponeses e as comunidades periféricas urbanas têm sofrido diretamente os ataques do capital e as consequências sociais, ambientais e culturais de sua ação.
Nos territórios e locais onde houve e/ou existem planos de privatização, aprofundam-se as desigualdades, o racismo, a violência sexual e sobrecarga de trabalho para as mulheres, a criminalização, assassinatos, ameaças e perseguição a lideranças, demissões em massa, precarização do trabalho, retirada e violação de direitos, redução salarial, aumento da exploração, brutal restrição do acesso à água e serviços públicos, redução na qualidade dos serviços prestados à população, ausência de controle social, aumentos abusivos nas tarifas, corrupção, desmatamento, contaminação e envenenamento das águas, destruição das nascentes e rios e ataques violentos aos povos e seus territórios, em especial às populações que resistem às regras impostas pelo capital.
A dinâmica de acumulação capitalista se entrelaça com o sistema hetero-patriarcal, racista e colonial, controlando o trabalho das mulheres e ocultando intencionalmente seu papel nas esferas de reprodução e produção. Nesse momento de ofensiva conservadora, há o aprofundamento da divisão sexual do trabalho e do racismo, causando o aumento da pobreza e da precarização da vida das mulheres.
A violência contra as mulheres é uma ferramenta de controle sobre nossos corpos, nosso trabalho e nossa autonomia. Essa violência se intensifica com o avanço do capital, refletindo-se no aumento de assassinato de mulheres, da prostituição e da violência sexual. Tudo isso impossibilita as mulheres de viver com dignidade e prazer.
Para as diversas religiões e espiritualidades, todas essas injustiças em relação às águas e seus territórios, caracterizam uma dessacralização da água recebida como um dom vital, e dificultam as relações com o Transcendente como horizonte maior das nossas existências.
Destacamos que para os Povos Originários e Comunidades Tradicionais há uma relação interdependente com as águas, e tudo que as atinge, e que todos os ataques criminosos que sofre, repercutem diretamente na existência desses povos em seus corpos e mentes. Esses povos se afirmam como água, pois existe uma profunda unidade entre eles e os rios, os lagos, lagoas, nascentes, mananciais, aquíferos, poços, veredas, lençóis freáticos, igarapés, estuários, mares e oceanos como entidade única. Declaramos que as águas são seres sagrados. Todas as águas são uma só água em permanente movimento e transformação. A água é entidade viva, e merece ser respeitada.
Por fim, constatamos que a entrega de nossas riquezas e bens comuns conduz a destruição da soberania e a autodeterminação dos povos, assim como a perda dos seus territórios e modos de vida.
Mas nós afirmamos: resistimos e venceremos!
Nossa resistência e luta é legítima. Somos os guardiões e guardiãs das águas e defensores da vida. Somos um povo que resiste e nossa luta vencerá todas as estruturas que dominam, oprimem e exploram nossos povos, corpos e territórios. Somos como água, alegres, transparentes e em movimento. Somos povos da água e a água dos povos.
Nestes dias de convívio coletivo, identificamos uma extraordinária diversidade de práticas sociais, com enorme riqueza de culturas, conhecimento e formas de resistência e de luta pela vida. Ninguém se renderá. Os povos das águas, das florestas e do campo resistem e não se renderão ao capital. Assim também tem sido a luta dos povos, dos operários e de todos os trabalhadores e trabalhadoras das cidades que demonstram cada vez maior força. Temos a convicção que só a luta conjunta dos povos poderá derrotar todas as estruturas injustas desta sociedade.
Identificamos que a resistência e a luta têm se realizado em todos os locais e territórios do Brasil e do mundo e estamos convencidos que nossa força deve caminhar e unir-se a grandes lutas nacionais e internacionais. A luta dos povos em defesa das águas é mundial.
Água é vida, é saúde, é alimento, é território, é direito humano, é um bem comum sagrado.
O que propomos
Reafirmamos que as diversas lutas em defesas das águas dizem em alto e bom som que água não é e nem pode ser mercadoria. Não é recurso a ser apropriado, explorado e destruído para bom rendimento dos negócios. Água é um bem comum e deve ser preservada e gerida pelos povos para as necessidades da vida, garantindo sua reprodução e perpetuação. Por isso, nosso projeto para as águas tem na democracia um pilar fundamental. É só por meio de processos verdadeiramente democráticos, que superem a manipulação da mídia e do dinheiro, que os povos podem construir o poder popular, o controle social e o cuidado sobre as águas, afirmando seus saberes, tradições e culturas em oposição ao projeto autoritário, egoísta e destrutivo do capital.
Somos radicalmente contrários às diversas estratégias presentes e futuras de apropriação privada sobre a água, e defendemos o caráter público, comunitário e popular dos sistemas urbanos de gestão e cuidado da água e do saneamento. Por isso saudamos e estimulamos os processos de reestatização de companhias de água e esgoto e outras formas de gestão. Seguiremos denunciando as tentativas de privatização e abertura de Capital, a exemplo do que ocorre no Brasil, onde 18 estados manifestaram interesse na privatização de suas companhias.
Defendemos o trabalho decente, assentado em relações de trabalho democráticas, protegidas e livre de toda forma de precarização. Também é fundamental a garantia do acesso democrático e sustentável à água junto à implementação da reforma agrária e defesa dos territórios, com garantia de produção de alimentos em bases agroecológicas, respeitando as práticas tradicionais e buscando atender a soberania alimentar dos trabalhadores e trabalhadoras urbanos e do campo, florestas e águas.
Estamos comprometidos com a superação do patriarcado e da divisão sexual do trabalho, pelo reconhecimento de que o trabalho doméstico e de cuidados está na base da sustentabilidade da vida. O combate ao racismo também nos une na luta pelo reconhecimento, titulação e demarcação dos territórios dos povos originários e comunidades tradicionais e na reparação ao povo negro e indígena que vive marginalizado nas periferias dos centros urbanos.
Nosso projeto é orientado pela justiça e pela solidariedade, não pelo lucro. Nele ninguém passará sede ou fome, e todos e todas terão acesso à água de qualidade, regular e suficiente bem como aos serviços públicos de saneamento.
Nosso plano de ações e lutas
A profundidade de nossas debates e elaborações coletivas, o sucesso da nossa mobilização, a diversidade do nosso povo e a amplitude dos desafios que precisam ser combatidos nos impulsionam a continuar o enfrentamento ao sistema capitalista, patriarcal, racista e colonial, tendo como referência a construção da aliança e da unidade entre toda a diversidade presente no FAMA 2018.
Trabalharemos, através de nossas formas de luta e organização para ampliar a força dos povos no combate à apropriação e destruição das águas. A intensificação e qualificação do trabalho de base junto ao povo, a ação e a formação política para construir uma concepção crítica da realidade serão nossos instrumentos. O povo deve assumir o comando da luta. Apostamos no protagonismo e na criação heroica dos povos.
Vamos praticar nosso apoio e solidariedade internacional a todos os processos de lutas dos povos em defesa da água denunciam a arquitetura da impunidade, que, por meio dos regimes de livre-comércio e investimentos, concede privilégios às corporações transnacionais e facilitam seus crimes corporativos.
Multiplicaremos as experiências compartilhadas no Tribunal Popular das Mulheres, para a promoção da justiça popular, visibilizando as denúncias dos crimes contra a nossa soberania, os corpos, os bens comuns e a vida das mulheres do campo, das florestas, águas e cidades.
A água é dom que a humanidade recebeu gratuitamente, é direito de todas as criaturas e bem comum. Por isso, nos comprometemos a unir mística e política, fé e profecia em suas práticas religiosas, lutando contra os projetos de privatização, mercantilização e contaminação das águas que ferem a sua dimensão sagrada.
O Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA) apoia, se solidariza e estimulará todos os processos de articulação e de lutas dos povos no Brasil e no mundo, tais como a construção do “Congresso do Povo”, do “Acampamento Terra Livre”, da “Assembleia Internacional dos Movimentos e Organizações dos Povos”, da “Jornada Continental pela Democracia e Contra o Neoliberalismo”; da campanha internacional para desmantelar o poder corporativo e pelo “tratado vinculante” como ferramenta para exigir justiça, verdade e reparação frente aos crimes das transnacionais.
Convocamos todos os povos a lutar juntos para defender a água. A água não é mercadoria. A água é do povo e pelos povos deve ser controlada.
É tempo de esperança e de luta. Só a luta nos fará vencer. Triunfaremos!
Assinam a declaração:
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil
Articulação Semiárido Brasileiro
Associação Brasileira de Saúde Coletiva
Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento
Cáritas Brasil
Central de Movimentos Populares
Conselho Nacional das Populações Extrativistas
Confederação Nacional dos Urbanitários
Confederação Nacional das Associações de Moradores
Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas
Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil
Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
Comissão Pastoral da Terra
Confederação Sindical de Trabalhadores/as das Américas
Central Única dos Trabalhadores
Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional
Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento
Federação Nacional das Associações do Pessoal da Caixa Econômica Federal
Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros
Frente Nacional pelo Saneamento Ambiental
Federação Nacional dos Urbanitários
Federação Única dos Petroleiros
Fórum de Mudanças Climáticas e Justiça Social
Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental
Internacional de Serviços Públicos
Marcha Mundial das Mulheres
Movimento dos Atingidos por Barragens
Movimento dos Pequenos Agricultores
Movimento de Pescadores e Pescadoras Artesanais do Brasil
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto
ONG Proscience
Rede Mulher e Mídia
Serviço Interfranciscano de Justiça Paz e Ecologia
Sociedade Internacional de Epidemiologia Ambiental
Vigência
Do FAMA 2018, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 23/03/2018
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